Por Raul Longo.
Não parece, mas a moça das duas fotos acima é uma só e a mesma pessoa que provocou rompimento de relações com um velho amigo que por acreditá-la guevarista achou de duvidar da minha integridade, embora tenha, inclusive, partilhado de minhas dificuldades no período em que juntos atuávamos pelo desmascaramento da política do regime ditatorial em seu estado.
Já fui de me impressionar com a mudança das pessoas, mas hoje sequer acredito que tenham realmente mudado.
Acredito mesmo que sempre foram o que são. O que muda é a moda.
Será que aquele hippie dos anos 70 realmente desprezava o consumismo ou como a raposa da fábula das uvas apenas mentia a si mesmo a impossibilidade de aquisição dos últimos lançamentos do mercado?
Ainda lembro a primeira vez em que um burguês complacente considerou-me normal e até reconheceu alguma inteligência em meus 18 anos, mas avisou ser uma burrice manter as mesmas ideias depois dos 40.
Aquilo me assustou! Pensei ser obrigatório tornar-me egoísta e desumano no futuro e preferi me manter burro pro resto da vida.
A moça da foto, por exemplo, mudou muito e rápido. De Guevara em punho brigou contra o cálculo do fator previdenciário proposto pelo FHC e, junto com o PT, conseguiu impedir aquela proposição formando uma base eleitoral.
Mas a necessidade da reforma previdenciária era uma realidade em todos os países e cada qual foi realizando a sua, sempre se baseando em cálculos que garantissem a manutenção do sistema em face ao crescimento populacional, o aumento da longevidade e os novos ingressos de aposentadorias. Em alguns países os fatores utilizados foram tão ou mais lesivos aos aposentados dos que os propostos por FHC, contribuindo significativamente para a explosão da atual crise financeira que se repercute menos onde, a exemplo do que ocorre no Brasil, se optou por porcentagens menores aos setores mais amplos.
No entanto, a inevitabilidade da Reforma da Previdência foi o que bastou para a moça largar o Guevara no Chaco boliviano e pular, literalmente, no colo da mais reacionária direita brasileira. Com a mesma efusividade cada um daqueles da foto comemorariam a morte do Che, mas Heloísa Helena precisava estar do lado de quem lhe garantisse o partido que criou para se opor ao governo do PT, prometendo-o como de esquerda!
Foi então que o Brasil se tornou o único país do mundo com o que havia de mais reacionário na direita apoiando um partido de esquerda. Até a TV Globo apoiou! Ao entrevistá-la Jô Soares chegou a afirmar que HH seria necessária para garantir a integridade do Senado, mas pouco depois, conforme se reporta aqui: A sonegação de Heloísa Helena – Istoé, se reafirmaram as verdadeiras origens dessa representante da esquerda brasileira.
E agora que tantos esquerdas me escrevem comemorando a prisão do Genoíno, Delúbio e Dirceu? Fico me perguntado; qual será a causa? Há causa? Ou é apenas um caso?
O pior é que como ninguém mais quer ser de direita fica difícil identificar à esquerda do quê estão essas esquerdas. Alguns se dizem à esquerda do PT, mas também há deles dentro do PT.
Talvez fique mais fácil a identificação se perguntar quem não é de esquerda, porque se o sujeito se assumir como um direita, já dá para ter alguma certeza. Do contrário fica a dúvida e acabo assumindo um método adotado pela ditadura militar quando todo mundo era suspeito até prova em contrário. O STF modernizou o processo abolindo a necessidade de provas, mas por aqui já tomei tanto rumo errado que prefiro não arriscar.
Meu último candidato, por exemplo, entrou no entusiasmo das manifestações de Junho e se pôs a acusar Lula pela mesma reforma da previdência que outrora incomodou a Heloísa Helena. Meio extemporâneo, é verdade, mas há que se entender que vivendo em uma Ilha por vezes os cérebros se tornam uma porção de massa encefálica cercada de vazios por todos os lados. De um lado um canal de desinformações e do outro um oceano de cogitações que levam a certezas tão instáveis quanto às ondas marinhas. Tudo contido pela RBS ao norte e o Diário Catarinense ao sul, numa onda monopolizadora de informações e raciocínios standartizados e formatados nas redações e estúdios de São Paulo e Rio de Janeiro..
Tentei furar essa onda lembrando que a proposta do governo FHC para a imprescindível reforma previdência seria muito pior, e o ex-candidato quis me convencer de que reformular os cálculos previdenciários foi uma providência desnecessária e que FHC não chegou a propor reforma alguma.
Fiquei em dúvida se o candidato seria mesmo tão desinformado ou cogitava a possibilidade de eu nunca ter ouvido falar da Proposta de Emenda Constitucional nº33 que entrou em debate na Câmera em 1995 e foi aprovada em 1998, consubstanciando uma Reforma Previdenciária aquém do necessário para atender as determinações da Constituição de 1988 que, pretendendo promover mais equânime distribuição social de renda através do Sistema, acabou tendo seu sentido invertido por aquilo que se aprovou como paliativo a bem pior proposta do FHC?
Como já passou a temporada das manifestações, provavelmente no desfile da coleção da próxima estação meu ex candidato volte às passarelas do partido já sem o modelito HH, mas desse jeito fica difícil votar.
Tem também os tradicionalistas! Aquelas da esquerda 68 mesmo que ainda nem nascidos em 1968. Desses tem uns que acusam o governo Lula e Dilma de apenas beneficiar banqueiros e por isso vão votar na Marina Silva, a candidata do Itaú.
Já outro arrumou uma informação bombástica: Lula é agente da CIA!
Uma amiga caiu na gargalhada e achou que eu estava fazendo piada, mas é verdade! O sujeito está convencido de que o Mensalão existiu, sim, mas o único beneficiado foi Lula 007 que esconde toda a grana na estante escamoteável do seu apartamento de São Bernardo do Campo.
Claro! Se não tem sentido estar na casinha geminada do Genoíno como acredita o Joaquim Barbosa, só pode mesmo estar no apartamento do Lula! Ou no tanque da motocicleta do José Dirceu que nunca dirigiu motocicleta, mas um gaiato da imprensa montou-o em uma Halley Davidson pelo Photoshop. Lula 007 e Dirceu Easy Rider!
E há outros que muito pelo contrário, têm feito circular reproduções de documento da CIA comprovando que o projeto de Lula é se perpetuar na presidência, implantando uma ditadura. Essa era uma das tantas mentirinhas da direita enquanto Lula era presidente, mas por falta de criatividade ou acometida de Alzheimer, esquecida de que há 4 anos Lula não é mais presidente, essa ala da dita esquerda resolveu reutilizar a anacrônica pegadinha.
E, por fim, há aqueles que babam e pedem sangue, jurando não perdoar corrupto algum de qual partido for. Justamente esses são os que me fazem perguntar onde se enfiou a esquerda que estava aqui? Cadê toda aquela sede de justiça e tamanha indignação que jamais se pronuncia sobre os desvios dos governos tucanos investigados na Suíça, França e Alemanha? Tampouco sobre a máfia do ISS da prefeitura do Gilberto Kassab?
Embora tão exigentes com a condenação de Genoíno, Dirceu e Delúbio, mesmo sem julgamento dos embargos aceitos pelo STF, por que se calam quanto a manutenção da livre impunidade do Roberto Jefferson que, sendo réu confesso, não tem embargo algum ao imediato cumprimento da pena a que também foi condenado?
O que torna essa esquerda tão seletiva? Tão acirrada e efusiva no coro na acusação os ex-companheiros e mais que tímida, silenciosa, muda, na vaia aos erros do que se imaginaria como seus naturais e eternos adversários!
Será mesmo uma exigência de integridade daqueles a quem alguma vez consideraram companheiros de ideal ou terão ficado inteligentes depois de completarem 40 anos? Alguma vez terão sido companheiros? Tiveram mesmo o mesmo ideal?
Ou serão como a moça da foto?
Conheci o Olavo de Carvalho quando, como estudante de filosofia, dizia-se marxista. Concunhado de amigo filho de operário resgatado ao exílio no Chile no último sequestro promovido durante a ditadura militar, já então o teórico marxismo acadêmico e o duvidoso companheirismo do Olavinho eram bastante destoantes de nossa realidade.
Há quem diga que os piores direitas são aqueles que já foram da esquerda, como o Olavo. Não concordo. Os que sempre foram direita já eram sinceros desde o começo. Os outros apenas deixaram de ser hipócritas e, como na velha brincadeira do “cadê o toicinho que tava aqui”, a direita comeu.
Parecem muito sérios, mas na verdade só estão esperando por alguém que lhes faça cócegas.
Nas fotos: Heloísa Helena.