Por Marcela Cornelli.
Falar em Assédio Moral já não é tão novo, mas abordar o tema no meio sindical ainda é um desafio. Desafio este que a Fites (Federação Nacional dos Trabalhadores em Entidades Sindicais e órgãos de Classe), com o apoio do Sindes (Sindicato dos Trabalhadores em entidades sindicais da Grande Florianópolis e Região Sul), encarou ao lançar, no dia 30 de outubro, a cartilha “O Assédio Moral no Meio Sindical”. O lançamento foi realizado no auditório da Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina, em Florianópolis, com o apoio da Frente Parlamentar Estadual em Defesa da Saúde do Trabalhador.
“O Assédio Moral fere os direitos e retira a identidade dos trabalhadores. A Frente surgiu com o objetivo de debater e combater esta prática. Para acabarmos com o assédio moral precisamos construir várias ações, mas, principalmente, conscientizar os trabalhadores e as trabalhadoras. A Frente parlamentar tem buscado avançar nesta luta”, disse o deputado Neodi Saretta (PT), presidente da Frente, que abriu a mesa do debate.
“A atual gestão da Fites priorizou esta luta. A cartilha traz alguns diferenciais de outras cartilhas sobre o assunto. A cartilha da Fites fala do assédio cometido pelo sindicalista, traz um depoimento de uma trabalhadora em sindicato e um questionário a ser respondido pelos trabalhadores e encaminhado à Federação”, disse Janilde Franco de Araújo, Diretora de Política Social da Fites, trabalhadora do Sindsprev/RJ e uma das elaboradoras da cartilha.
Na opinião de Janilde, “alguns sindicatos começaram a se transformar em grandes escritórios. É como se o sindicalista passasse a ter uma grande empresa para administrar. Ele não vai mais para a base fazer política e começa a disputar espaço com o funcionário dentro da entidade. Toda relação de trabalho tem conflitos. Isto é inerente à sociedade capitalista na qual vivemos onde há hierarquia, relação de poder e luta de classes. Mas o que deve imperar é o respeito.”
Emocionada, a diretora da Fites e do Sindes, Sivandra Krauspenhar, trabalhadora de sindicato e vítima de Assédio Moral, fez um relato do assédio que sofreu. Ela falou a dificuldade de denunciar o assédio e buscar a Justiça.“Fiquei três meses para poder escrever sobre o que aconteceu comigo. Escrever era relembrar o assédio”, conta. “Sempre trabalhei com amor e carinho. Foram 13 anos e não três dias. Não foram todos os diretores que me assediaram, mas os que não se manifestaram foram coniventes. Tive sintomas como depressão profunda, paralisia da cintura para cima, dores nos braços, entre outros. Quando retornei de uma licença médica eles tiraram minhas funções. Apesar de vítima, você se sente culpada pelo assédio. O apoio doa amigos da família é fundamental. É preciso também que o trabalhador que sofre assédio procure o seu sindicato para ser orientado. O Sindes me apoiou muito.”
“Assédio moral dói. Mas, quando vem de pessoas, sindicalistas, que dizem combater esta prática, dói mais ainda”, disse Schirlei Azevedo, Representante da Rede de Combate ao Assédio Moral no Trabalho. “Em uma empresa privada, a gestão visa o lucro e para isso oprime os trabalhadores. Dentro das entidades sindicais é ainda mais sofrido. Quando o trabalhador é também um militante, ele sonha com uma mudança na sociedade e quando o assédio acontece dentro do espaço que deveria ser de transformação e luta, ele perde sua identidade, desanima. Viver estas contradições é muito difícil. A solidariedade de classe precisa ser resgatada”. Para Schirlei, as relações de trabalho estão desumanizadas. Isso é resultado da sociedade capitalista que oprime os trabalhadores. “Não existe capitalismo humanizado. O capitalismo oprime e até mesmo ceifa vidas”.
“O trabalho continua sendo central nas nossas vidas e quando acontece alguma coisa negativa no trabalho, isso nos abala muito. Os trabalhadores em sindicatos se questionam o porquê sofreram algum tipo de violência se não estão em uma empresa privada. Em uma empresa, se o trabalhador se submete ao assédio, é um processo rápido até a sua demissão. No sindicato leva o tempo que a pessoa aguentar”, argumentou a palestrante Margarida Barreto, médica do trabalho, professora da Universidade de São Paulo (USP) e vice- coordenadora do NEXIN (Núcleo de Estudos Psicossociais da Dialética Exclusão/Inclusão Social).
“Em uma empresa privada os trabalhadores compram a ideia de que se a empresa crescer eles crescerão juntos. Em uma entidade sindical os trabalhadores compraram a ideia de que podem transformar o mundo”, ponderou a palestrante. “Não é possível aceitar que a solidão e o sofrimento do trabalhador sejam uma coisa normal. Que a injustiça impere no local de trabalho”.
O presidente da Fites e do Sindes/SC, Edilson Severino, que coordenou a mesa, disse que o desafio da Fites está só começando. “É um primeiro passo. Há muito o que fazer. A cartilha será lançada em outros estados no intuito de iniciarmos um combate a esta prática nefasta aos trabalhadores”.
Texto e fotos: Marcela Cornelli, jornalista e Diretora do Sindes
Fonte: Sindes.