O governo israelense divulgou nesta segunda-feira (28/10) a lista com os nomes de 26 presos palestinos que serão libertados na próxima quarta-feira (30). Trata-se do segundo grupo, de um total de 104 detentos, que o premiê israelense, Benjamin Netanyahu, se comprometeu em soltar, em julho deste ano, durante as negociações para a reabertura do processo de paz com a ANP (Autoridade Nacional Palestina). Uma associação de direitos humanos estima, no entanto, que 5 mil ainda estejam em cárcere.
Encarado como um “gesto de boa vontade” pela diplomacia norte-americana, responsável pela mediação dos diálogos de paz entre israelenses e palestinos, a medida é vista por movimentos sociais de presos políticos do local como uma estratégia de Tel Aviv para manipular os assuntos negociados e criar uma boa impressão na comunidade internacional.
Condenados a penas entre 19 e 28 anos, todos os presos palestinos próximos da libertação foram julgados por crimes cometidos antes dos Acordos de Oslo, em setembro de 1993, e muitos estão cumprindo o final das sentenças. As autoridades israelenses incluem esses palestinos na categoria de “prisioneiros securitários”, envolvidos em ataques contra israelenses, mas organizações de direitos humanos afirmam que não existem provas concretas que os liguem aos crimes.
Dentro deste segundo grupo de pessoas a serem libertadas, a grande parte é residente da Cisjordânia e apenas cinco são da Faixa de Gaza. Porém, não é certo que tenham autorização de Israel para voltar a suas casas. Assim como na primeira rodada, não existem detentos árabe-israelenses (palestinos que têm a cidadania israelense ou vivem em Jerusalém Oriental) na lista de soltura, apesar de no compromisso estar prevista a libertação de 24 pessoas nessas condições.
Issa Abed Rabbo é o prisioneiro com maior tempo atrás das grades que será solto na quarta. Detido em outubro de 1984, o palestino, nascido e criado em um dos campos de refugiados palestinos na Cisjordânia, foi condenado à prisão perpetua pela morte de dois israelenses, mas nega as acusações. Organizações de direitos humanos afirmam que, assim como outros presos palestinos, ele foi detido por participar da resistência nacional e do Fatah. Rabbo está entre os 126 detentos que passaram mais de 25 anos de suas vidas nas cadeias militares israelenses.
Compromisso com EUA
A lista foi aprovada por um comitê especial interministerial na noite deste domingo (27/10) e publicada nesta segunda pelo Serviço Penitenciário de Israel, que abriu 48 horas para apelações legais. Apesar do direito constitucional de recorrer, a Suprema Corte do país rejeita, normalmente, petições contrárias à decisão governamental de libertar presos.
O compromisso de soltar os 104 detidos pré-Oslo já havia sido aprovado, no dia 28 de julho, pelo Gabinete de Israel – com pressão de Netanyahu, que teve de convencer muitos dos ministros. O premiê havia acordado com o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, a libertação, estabelecida pelos palestinos como condição para a retomada dos processos de paz.
Inicialmente, Netanyahu não concordou com a proposta dos Estados Unidos, afirmando que poderia soltar apenas 82 detidos, mas depois, mudou de ideia. “A libertação de todos os prisioneiros pré-Oslo foi um acordo estabelecido entre os EUA e Israel, não entre Israel e os palestinos”, disse um oficial da ANP na época. “Baseado nesse acordo, os norte-americanos receberam nosso consenso para renovar as negociações”.
Condições
Os próximos presos serão soltos em mais duas rodadas de acordo com o “sucesso” do diálogo de paz com a ANP. As condições, os critérios, as datas e as fases da libertação serão determinadas pelo governo israelense, que controla todo o processo, e pode, inclusive, deportar os recém-liberados ou lhes condenar, novamente, ao cumprimento remanescente de suas sentenças.
Isso porque os prisioneiros soltos durante essas negociações não estão imunes a novas detenção e acusação com base em sua sentença anterior, como em processos de paz no qual há a prática da anistia. “O Estado de Israel se reserva o direito de tomar todas as medidas necessárias contra os detentos libertados se eles cometerem qualquer atividade hostil ou terrorista, bem como devolvê-los para servir o restante de sua sentença, como será decidida pelas autoridades competentes”, afirma a decisão do gabinete ministerial.
Ao menos 12 pessoas já foram detidas novamente depois da troca de prisioneiros em outubro de 2011, baseadas em “informações secretas” do serviço de inteligência israelense, segundo a Addameer (Associação de Direitos Humanos e Apoio a Prisioneiros). Todas elas podem ter de cumprir suas sentenças anteriores.
Novas prisões
“A libertação destes prisioneiros não garante o fim das políticas israelenses de detenção em massa e prisões arbitrárias, nem garante os direitos de mais de 5 mil palestinos presos atualmente, incluindo 136 mantidos sob detenção administrativa, sem acusação ou o direito a julgamento”, diz em comunicado a Addameer.
De acordo com a organização de direitos humanos, mais de 23 mil palestinos foram soltos por Israel desde os Acordos de Oslo de 1993 e pelo menos 86 mil detidos no mesmo período. Nos primeiros dois meses do acordo entre o governo israelense e o Hamas de soltar cerca de 500 presos palestinos, pelo menos 470 palestinos foram presos por Israel na Cisjordânia. Da mesma forma, Israel soltou 429 pessoas em 2007 e 770 em 2008 no processo de paz de Annapolis, mas deteve quase 5 mil palestinos no mesmo período.
Não existem indícios de que este padrão vai se alterar, desta vez. Apenas nesta segunda (28/10), em algumas cidades da Cisjordânia, 20 membros do Conselho Legislativo da Palestina foram presos por forças israelenses.
Onde está a mudança?
“A ANP, ao invés de se contentar com a promessa da libertação dos presos (o que foi renegado por Israel por mais de 20 anos), deve demandar uma mudança na política penitenciária de Israel – o fim imediato das prisões arbitrárias, da detenção de crianças e jovens, de maus tratamentos de detentos, incluindo tortura, negligencia medica e condições de vida inumanas”, pede a Addameer.
Analistas seguem o coro: “Ou por que não adotar essa ideia maluca? Ao invés de soltar alguns presos, que tal acabar com o sistema militar de acordo com o qual os palestinos podem ser detidos e presos sem julgamentos por anos a fio?”, questiona a jornalista israelense, também de nacionalidade norte-americana, Mairav Zonszein.
Fonte: Opera Mundi.
Foto: ActiveStills