Na Grécia, o combate das forças governamentais à crescente influência do partido ultranacionalista Aurora Dourada parece adotar um calculismo perigoso, pelo qual se combate o extremismo por via da integração de algumas das suas reivindicações e práticas. Perante tal, importa perguntar: quem está a seguir na lista?
Por Passa Palavra.
As autoridades gregas têm, ao longo dos últimos dois anos, desenvolvido uma autêntica campanha de limpeza social, a qual tem visado imigrantes, transgéneros, toxicodependentes e trabalhadores do sexo.
A campanha, batizada de Operação Zeus, teve início em Agosto de 2012 na capital Atenas, tendo posteriormente se alargado a outras cidades. Milhares de pessoas de nacionalidade não europeia foram então sujeitas a inquirições, identificações e detenções. Em Outubro do ano passado, 487 imigrantes foram detidos num só fim-de-semana. Segundo os dados recolhidos pela ONG Human Rights Watch, de Agosto de 2012 a Fevereiro de 2013, 85 000 cidadãos não nacionais foram conduzidos a esquadras da polícia grega.
A lotação de esquadras e dos estabelecimentos prisionais levou o governo grego a iniciar um plano de construção de 50 campos de detenção, cobrindo uma vasta área do território. A par destes empreendimentos, o investimento em segurança e obras públicas contempla igualmente a construção de uma barreira de separação de 3 metros de altura ao longo do rio Evros, de forma a evitar a entrada de pessoas através da Turquia. Neste processo de repressão da mobilidade e demais direitos humanos, a Grécia tem contado com o apoio da Frontex, programa de controlo fronteiriço financiado pela União Europeia. O fecho das entradas por terra, por um lado, e o aumento do número de refugiados da guerra civil na Síria, por outro, tem levado ao aumento do número de pessoas que arriscam a travessia por via marítima e, por consequência, ao aumento do número de mortos em naufrágios.
Esta campanha foi intensificada após a formação do governo de coligação liderado pelo partido de direita Nova Democracia. Durante a campanha eleitoral, o seu líder Antonis Samaras terá mesmo classificado os imigrantes como “tiranos da sociedade grega”, tendo prometido lidar com o “problema”. Foi justamente durante este período que foi aberto o primeiro campo de detenção em Atenas, um conjunto de contentores para os quais 56 imigrantes – entre pessoas a aguardar repatriação, em processo de obtenção do estatuto do refugiado e não retornáveis – foram deslocados, permanecendo em «detenção administrativa». De acordo com os dados recolhidos por deputados do Parlamento Europeu, as condições de alimentação são pobres e a mobilidade, mesmo dentro do campo, é limitada.
Nos últimos meses, o tipo de «indesejáveis» a perseguir sofreu uma diversificação. Além dos imigrantes, o ónus da culpa da recessão e da crise passou a incluir transgéneros, toxicodependentes e trabalhadores do sexo. Os primeiros sinais do alargamento das purgas policiais e judiciais remontam a Maio de 2012, altura em que a detenção de transgéneros, sob a suspeita de prostituição, começou a acontecer numa base diária. Nalgumas situações, conforme denunciado por várias organizações LGBT, as pessoas detidas foram obrigadas a submeter-se a testes de despistagem do vírus HIV. Num dos casos, a própria representante legal chegou a ser detida.
O aumento quantitativo e qualitativo das perseguições a população tipificadas como «problema» parece não constituir apenas uma marca da extrema-direita. Na Grécia, o combate das forças governamentais à crescente influência eleitoral e social do partido ultranacionalista Aurora Dourada parece adotar um calculismo perigoso, pelo qual se combate o extremismo por via da integração de algumas das suas reivindicações e práticas. Perante tal, importa perguntar: quem está a seguir na lista?