Por Mariana Rosa e Brenda Thomé.
O projeto de Lei I Nº 478, de 2007, também conhecido como Estatuto do Nascituro, tem gerado muitas discussões desde que passou por aprovações em algumas comissões da Câmara dos Deputados. De autoria de Luiz Bassuma (PT – Bahia) e Miguel Martini (PHS – Minas Gerais), o projeto tem pontos polêmicos envolvendo os direitos do ser humano “concebido mas não nascido” e causou revolta.
Mesmo com as alterações no projeto original, o substitutivo que tramita nas Comissões ainda desperta reações fortes. Grupos como a “Marcha das Vadias” se reuniram para organizar atos contra o Estatuto do Nascituro, principalmente quando da aprovação do projeto de Lei na Comissão de Finanças e Tributação (CFT) no dia 05/06. Gleidiane de Sousa, uma das organizadoras do “Ato Contra o Estatuto do Nascituro em Floripa”, no último dia 19, garante que “A organização da marcha das vadias decidiu fazer esse Ato antes de o “gigante acordar”. Já tínhamos isso planejado 15 dias antes. Nós somos contra o estatuto todo, não só as partes polêmicas. Desde o seu primeiro artigo ele é absurdo. É absurdo e triste que tenhamos que discutir o fato de um embrião, que não é considerado por muitos especialistas como um ser vivo, ter mais direitos do que uma mulher adulta e cidadã.” O objetivo dessas manifestações era, segundo ela, “Promover o debate, conscientizar e conversar com as pessoas sobre o que está sendo proposto na Câmara. Nós tivemos um resultado muito positivo.”
As discussões mais fortes giram em torno do auxílio financeiro previsto para mulheres vítimas do estupro. Para Felipe Fernandes, membro do NIGS (Núcleo de Identidades de Gênero e Subjetividades) “o que o Estado quer dizer a partir da voz dos fundamentalistas religiosos é que não importa os direitos da família ou da mulher, ela tem que gerar seja o que for. E vai além, o estuprador, que é um violentador, vai ter status de pai. Ou seja, não é mais a mulher que escolhe as relações de parentesco que vai ter com o violentador dela.” Gleidiane enxerga um problema de violência psicológica muito grande “75% das mulheres que sofrem violência sexual são atacadas por alguém conhecido. Quando você impede essa mulher de fazer o aborto e ainda pede para que o estuprador seja reconhecido como pai, isso gera um desconforto enorme para essa mulher no meio em que ela vive e também para essa criança.”,
O projeto de lei não proíbe os tipos de aborto permitidos no Brasil, em caso de estupro ou risco para a vida da mãe. Mas alguns críticos alegam que o estatuto abre brecha para dificultar ou proibir estas interrupções.
Na avaliação do Padre Helio Luciano, a proposta do Estatuto não dá margem para este dilema. Padre Luciano, que é doutor em Bioética pela Universidade de Santa Croce, em Roma, adverte que nenhuma cláusula do Estatuto altera os atuais procedimentos de aborto legal. “O texto não altera esses direitos, a questão é reconhecer a vida da criança. Muitas pessoas que criticam o Estatuto não o leram”.
Segundo ele, o objetivo não é alterar os procedimentos atuais, mas blindar a possibilidade de uma futura legislação permissiva em relação ao aborto, como a que foi aprovada recentemente no Uruguai. “Trata-se simplesmente de dar direito à vida. Um direito fundamental que achamos que a pessoa tem desde a sua concepção”, argumenta.
No entanto, para o professor de Direito Constitucional na UFSC Reinaldo Pereira e Silva, o texto pode ser interpretado de formas variadas e conflitantes: “O projeto de lei do Estatuto do nascituro é muito mal redigido. O espírito do projeto até pode ser um, mas sua letra é outra”.
Outro ponto polêmico é a discussão em torno de quando um não-nascido torna-se cidadão. Felipe diz que “Na Antropologia, definimos uma criança, um bebê, como um ser desejado. Ele só se torna humano a partir do momento em que ele é desejado dentro do grupo ao qual ele vai pertencer. Não cabe a ninguém fora desse grupo desejar ou não a criança.”
Mariana Rosa: [email protected]
Brenda Thomé: [email protected]
Foto: Daniela Mayorca
Fuente: Cotidiano-UFSC