Parcerias garantem o triplo de participantes na 3ª edição do encontro
Por Camila Rodrigues da Silva.
Fotos de Maria Flor.
A terceira edição do Café AntiColonial foi inesquecível e marcou uma nova fase desse encontro, promovido desde 2011 pela Cooperativa de Produção em Comunicação e Cultura (CpCC). “Hoje ficou marcado que esse café anticolonial é dos trabalhadores!”, sintetizou o presidente da cooperativa, Raul Fitipaldi.
O resultado foi um sucesso: conforme Fitipaldi, cerca de 300 pessoas prestigiaram o encontro, quase o triplo da audiência do ano passado. No 2º Café, que aconteceu em 2012 na casa da advogada Rosângela de Souza (conhecida por todos como “Lelê”), participaram 88 pessoas. A primeira edição do Café aconteceu na Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), em 2011, quando se reuniram 55 companheiros.
O evento aconteceu nesta sexta-feira (03/05), a partir das 17h30, no histórico Palácio Cruz e Souza, em frente à Praça XV de Novembro e muito próximo à famosa figueira, no Centro da cidade de Florianópolis.
Teve bolos e tortas deliciosas. Teve contação de histórias, leitura de poesias música de muito boa qualidade, exposições de arte e de vídeos e venda de livros. Teve alegria e um clima de companheirismo entre pessoas que constroem diferentes partes da mesma luta: a dos trabalhadores.
De trabalhador para trabalhador
Diferentemente das duas primeiras edições, esta foi a primeira vez que o Café AntiColonial foi divulgado amplamente e construído objetivamente pelos trabalhadores e para eles, em conjunto com o SINDES – Sindicato de Empregados em Entidades Sindicais.
Sua concretização contou com o apoio do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE ), do gabinete do vereador Lino Peres (PT) e de 13 entidades sindicais: Sindicato dos Trabalhadores em Transporte Urbano, Rodoviário, Turismo, Fretamento e Escolar de Passageiros da Região Metropolitana de Florianópolis (Sintraturb); Sindicato dos Trabalhadores em Saúde e Previdência do Serviço Público Federal em Santa Catarina (Sindprevs/SC); Sindicato dos Bancários de Florianópolis e Região (SEEB SC); Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal de Florianópolis (Sintrasem); Sindicato dos Eletricitários de Florianópolis e Região (Sinergia); Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal do Estado de Santa Catarina (Sintrafesc); Sindicato dos Trabalhadores em Informática e Tecnologia da Informação (Sindpd); Sindicato dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Saúde Público Estadual e Privado de Florianópolis (SindSaúde/SC); Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica e Profissional (Sinasefe); Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina (Sinjusc); Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina (SJSC); Sindicato dos Servidores Públicos de Santa Catarina (Sintespe); e do Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário Federal no Estado de Santa Catarina (Sintrajusc) .
Segundo Vanessa Bortucan, diretora financeira da cooperativa e uma das idealizadoras desse projeto, o formato é o mesmo desde o primeiro encontro: contação de histórias, venda de materiais da cooperativa (camisetas, bottons, etc.), música ao vivo, café e guloseimas, e vídeos. “Só não teve a exposição de fotos na primeira edição”, lembra.
A programação
A contação de história e leitura de poesias ficou por conta da cooperada Bel Gomes e do estudante Rafael Enoch, de 18 anos, membro do grupo de teatro Boca de Siri e estudante do curso de Eletrotécnica do Instituto Federal (IF-SC). Os textos lidos tratavam das palavras como instrumentos que podem ser bem ou mal utilizados.
“Dentro de um colégio técnico, a relação entre cultura e educação é muito conturbada. O ensino é visto apenas para formar mão de obra e não para formar um cidadão, com pensamento crítico”, comentou Rafael, que estava entusiasmado. “O ambiente está muito gostoso! O café conseguiu reunir pessoas que têm divergências, mas que pensam de forma parecida. Está sendo uma confraternização muito intensa. Tudo está muito bonito”! Ele revela que foi a primeira vez que trabalhou com contação de histórias – e o fez muito bem.
No espaço, os visitantes podiam apreciar a exposição fotográfica “Microfauna da Ilha”, do médico veterinário Daniel Pohl e imagens de um concurso fotográfico promovido pelo Sindicato dos Eletricitários de Florianópolis e Região (Sinergia), em que trabalhadores fotografaram trabalhadores. Também houve fotos históricas para os trabalhadores do acervo do Sintrasem.
Aconteceu ainda a apresentação da segunda edição dos livros “Filhos de Olorum – contos e cantos de candomblé”, de Raul Longo, e “Sonhos Interrompidos”, de Carla De Souza e Mariana De Souza. A primeira obra trata de contos do candomblé e foi escrito enquanto o autor morou em Salvador, entre 1979 e 1981. A segunda conta a história de Carla e sua luta contra a anorexia –ela faleceu com 28 kg. Mariana, co-autora e irmã de Carla, estava presente.
Segundo Rosângela Bion de Assis, diretora de Relações Institucionais, a escolha da programação tem como critérios valorizar atividades que não se organizam mais, como contação de histórias e sebos, e prestigiar os colaboradores e apoiadores do Desacato e da cooperativa.
Ela estava radiante ao fim do encontro. “É incrível como as pessoas saíram felizes do nosso café! É um astral tão bom, de solidariedade e de companheirismo que a gente não está acostumado ver na nossa sociedade”, comemora.
O público
Longo observou a característica predominante dos participantes e como isso representa um avanço. “Aqui está reunida uma grande maioria de trabalhadores de classe média. Mas não importa: a classe média também tem que se reconhecer como trabalhadora. Ela também é explorada pelos patrões e está mais próxima do proletariado do que dos donos do capital, ao contrário do que pensa”.
E continuou: “É duro falar com a classe média. Quando a gente é proletário, não tem que discutir muito sobre a nossa situação, basta decidir que a ação a gente vai tomar contra o patrão. A classe média, não. Antes, precisa discutir e se identificar como classe trabalhadora para depois se organizar. E isso é muito difícil”.
Cultura libertadora vs alienação
Todos que apoiaram e ali estavam tinham consciência da importância cultural do Café AntiColonial. “A gente convidou toda a nossa base para participar, porque o objetivo de um evento como esse é trazer consciência de classe: todos somos trabalhadores independentemente da profissão de cada um”, definiu Simone Consuelo Regis Heinzelmann, diretora de formação do Sinergia.
Seu colega, Mario Jorge Maia, diretor de Saúde e Segurança do Trabalho, comentou como a cultura hoje é cara e alienante e, por isso, se colocou a disposição para apoiar iniciativas desse tipo. “E esperamos o 4º, o 5º e o 6º Café AntiColonial! No que precisar, espero que a gente esteja sempre junto”.
O vereador Lino Peres também elogiou o café. “O evento foi muito legal! Um formato livre, com várias linguagens”. E esclareceu porque ofereceu o apoio espontaneamente: “É uma forma de o mandato ajudar contra o monopólio da imprensa, a mentira e colonialismo cultural, que é mais complicado que o colonialismo territorial”.
O estudante Enoch reforçou a importância de eventos como esse, comentando sobre a escassez de espaços culturais na cidade. “Florianópolis tem apenas dois teatros grandes: o CIC [Centro Integrado de Cultura] e o Pedro Ivo e os grupos locais não conseguem se apresentar nesses lugares. Nunca tem agenda, segundo eles. O CIC só tem shows –parece que não tem mais espaço para teatro. E o Pedro Ivo parece ser usado apenas como auditório pelo Governo [do Estado]”.
A origem do nome
O nome “Café AntiColonial” surgiu de uma conversa entre o atual presidente da cooperativa, Raul Fitipaldi, e a diretora financeira, Vanessa Bortucan. Diferentemente do que indica sua função atual na cooperativa, Vanessa é profissional das artes e conversava com Raul sobre uma forma de a cooperativa promover eventos culturais que aglutinassem as pessoas e ajudassem a dar visibilidade à cooperativa, ainda nascente.
Discutindo sobre o formato, ela sugeriu que fosse um café. “É aconchegante, todo mundo gosta, e é melhor do que uma festa para aproximar as pessoas”, teria falado. “Podia ser um café colonial, com alguma comida”. Raul interferiu no nome. “E se fosse um Café AntiColonial”? Ele se refere, claramente, à posição política assumida pela cooperativa.
“O site não oculta que é anti-imperialista, anticapitalista e “nossamericano”, ou seja, nativo da América que existe entre o México e as ilhas Malvinas, que têm origem e história distinta dos Estados Unidos e do Canadá”, explica ele.
A próxima edição
O presidente da cooperativa anunciou que a edição do café do próximo 1º de maio será maior, ao ar livre, e homenageará a Ocupação Contestado, comunidade organizada no bairro da Serraria, no município de São José. Ele homenageou, durante o anúncio, a moradora Lúcia, que faleceu no dia 1º de maio após um acidente vascular cerebral.
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[…] Leia aqui o texto completo produzido por Camila Rodrigues da Silva para o Portal Desacato. […]