Observadores brasileiros: “Não há como garantir eleição limpa no Paraguai”
Por Vitor Sion.
Para acabar com a suspensão no Mercosul e na Unasul (União das Nações Sul-Americanas), o Paraguai precisa provar que as eleições deste domingo (21/04) são limpas e democráticas. Com o objetivo de convencer os mais de 500 observadores internacionais da transparência do processo, o TSJE (Tribunal Superior de Justiça Eleitoral) tem dado longas palestras e explicações detalhadas sobre o sistema de votação.
Vitor Sion/Opera Mundi
Apesar de os primeiros relatórios oficiais serem divulgados apenas na próxima semana, observadores brasileiros já apontam problemas na organização e no processo de apuração paraguaios. As principais deficiências relatadas a Opera Mundi dizem respeito à transmissão digital dos resultados, à falta das mesmas oportunidades entre os partidos políticos e ao excesso de cargos que os paraguaios escolherão. Cada eleitor votará para presidente, governador, senador, deputado, representantes do Parlasul e membros para a Junta Departamental, uma espécie de assembleia estadual.
[Cédulas para eleição presidencial na sede do TSJE, em Assunção]
“Eles precisam se aperfeiçoar. Há um problema sério de compra de votos e de cédulas antes do dia da eleição. No domingo, o problema maior será a interferência humana na transmissão digital dos resultados. Não há como garantir a transparência da eleição”, afirma um dos observadores brasileiros que prefere não ser identificado.
A votação no Paraguai é feita por meio de cédulas, que são contadas por fiscais que transferem o resultado para um sistema denominado TREP (Transmissão de Resultados Eleitorais Preliminares). O Paraguai é o primeiro país a adotar esse modelo, que deve permitir o anúncio do novo presidente às 20h locais (21h de Brasília), quatro horas após o fechamento das urnas.
“O sistema é demorado. No Brasil, por exemplo, cada eleitor costuma levar um minuto para votar. Aqui esse tempo deve chegar a três minutos. Além disso, o eleitor recebe muitas cédulas, depois tem que colocar cada uma delas na urna certa. É muito fácil de haver alguma confusão”, argumentou a Opera Mundi Alexandre Francisco de Azevedo, especialista em direito eleitoral, professor da PUC-GO e observador do pleito paraguaio.
Outros observadores brasileiros também ratificaram as críticas ao sistema eleitoral, sob a condição de anonimato. A voz dissonante foi a do ex-prefeito do Rio de Janeiro Cesar Maia (DEM). “As explicações do TSJE foram extremamente claras e temos confiança nesse processo democrático.”
Além dos brasileiros, outros observadores internacionais também veem falhas no processo eleitoral paraguaio. Questionado se o Paraguai evoluiu em relação ao sistema de votação das eleições de 2008, o uruguaio Daniel Peña, da missão do Parlasul, diz que “tudo é muito parecido”. “Perguntamos ao TSJE sobre as denúncias de fraude e eles disseram que são problemas normais que existiram historicamente. O mais importante é que o Paraguai volte aos blocos internacionais”, afirmou Peña.
Partidos também desconfiam de resultado
O histórico paraguaio reafirma a dificuldade de um pleito acima de qualquer suspeita neste domingo. Na eleição que levou Fernando Lugo ao poder, há cinco anos, os Estados Unidos suspeitaram de fraude, segundo documentos vazados pelo Wikileaks. Nesta semana, os dois principais partidos do país, o Colorado e o PLRA (Partido Liberal Radical Autêntico), que disputam a Presidência, acusaram-se de crimes eleitorais.
- Aliança polêmica e denúncias contra Cartes marcam fim de campanha no Paraguai
- Em meio a denúncias de corrupção, justiça eleitoral paraguaia rompe com órgão do governo
- Jornalista, candidato do PT do Paraguai vê Revolução Russa como único modelo a ser seguido
- Dividida, esquerda paraguaia denuncia crimes eleitorais e prevê aproximação no segundo semestre
O senador colorado Silvio Ovelar foi afastado por dois meses depois da divulgação de um vídeo em que aparece oferecendo dinheiro para eleitores. O PLRA, por sua vez, foi acusado de usar dinheiro do governo para comprar terras superfaturadas, negócio que teria sido fundamental para a formalização de uma aliança com a Unace (do ex-general Lino Oviedo, morto em fevereiro deste ano), anunciada há duas semanas. Após a denúncia, o presidente do Congresso, Jorge Oviedo Matto, deixou o cargo.
Os dois partidos também anunciaram que farão hoje pesquisas para saber se o resultado a ser divulgado pelo TSJE é confiável.
Esquerda tem certeza de fraude
Os cinco candidatos da esquerda paraguaia às eleições de hoje não têm dúvidas de que haverá fraudes, principalmente fora da capital, Assunção, onde há menos controle por organismos internacionais. Os partidos reclamam da lei eleitoral, que prevê que os três fiscais de cada mesa de votação sejam representantes das maiores bancadas no Congresso. Assim, diversas urnas só terão controle de colorados, liberais e oviedistas. As coalizões Avança País, Frente Guasu e Kuña Pyrenda se uniram para fiscalizar um número maior de colégios eleitorais.
“Fraude com certeza vai haver. Com nossos fiscais e os observadores internacionais, esperamos que isso seja minimizado. Mas a compra de votos e de cédulas é uma postura comum dos grandes partidos”, explica a Opera Mundi o ex-chefe de gabinete de Fernando Lugo, Miguel López Perito, candidato ao Senado pela coalizão Avança País.
Vitor Sion/Opera Mundi
Presença dos observadores internacionais inibe fraudes apenas em Assunção
A candidata do Kuña Pyrenda à Presidência, Lilian Soto, também lembra que, em pleitos anteriores, o que ocorreu foi a compra, por parte dos grandes partidos, de agentes da coalizão adversária. “Os colorados vão tentar comprar liberais e vice-versa. E, fatalmente, conseguirão fazer isso em vários locais do país.”
Apesar de todas as denúncias, é possível que Mercosul e Unasul legitimem o pleito para que o Paraguai volte a fazer parte desses blocos internacionais. Uma demonstração disso é a declaração do chefe da missão diplomática da Unasul, o peruano Salomón Lerner, sobre as denúncias de fraude. “São queixas normais de partidos menores. Quanto mais longe se está de chegar ao poder, maiores são as reclamações feitas para tentar ganhar votos.”
Fonte: Ópera Mundi.