Por Cecília Garcia.
O sonho de estudar em uma universidade pública sempre fez parte da minha vida, principalmente pela dificuldade que representava entrar em uma delas. A concorrência grande só poderia garantir uma espécie de ticket para o paraíso. Tendo entrado em Linguística, na Unicamp, este paraíso era o mesmo de Borges: uma biblioteca. Hoje, seis anos depois, já fazendo a segunda faculdade, me atrevo a reconhecer que não é uma questão de ser um buraco mais embaixo: é questão de ser invisível.
Os institutos de humanas são uma espécie de twist da Nova Roupa do Imperador: estão ali, mas quem quer ganhar dinheiro não vê nada além de um bando de profissionais que têm por destino cargos com salários questionáveis – querem indagar sobre a sociedade, estudar literatura, vencer barreiras de fascismo linguístico, refletir acerca do pensamento humano e isso dificilmente teria qualquer utilidade, por conseguinte, merecem mesmo ganhar pouco; pensar não dá trabalho.
Para nós, sobra a satisfação de viver fora da caverna e de não queimar os olhos com a claridade. Mas sobra, também, ver uma biblioteca com acervo incrível, como a do instituto em que estudo, pegar fogo por causa de um curto circuito resultante de falta de manutenção. Primário. Além disso, meses antes do incêndio que acometeu parte da biblioteca do IEL, na Unicamp, houve um alagamento, resultante de um problema no encanamento. Mas como ali ninguém morreria afogado, nada foi feito. Há ainda um incêndio de causas não confirmadas na biblioteca do IFCH, instituto vizinho ao IEL. São provas inegáveis de só mesmo gritando “Fogo!” alguém vem, porque greves e pedidos de “Socorro!” são inaudíveis para a iniciativa privada e os cursos também não são convenientes para o Estado.
Como uma coincidência tétrica do destino, no mesmo período em que houve o incêndio, ocorria o processo eleitoral para Reitor. A ironia provoca uma vontade histérica de rir: é claro que as propostas foram evasivas e que houve cobrança por parte dos alunos, votos nulos e tentativa de garantir comprometimento por parte de quem assumirá o cargo. Mas isso só deixa claro que existe, sim, conveniência no investimento e que sucatear e jogar o investimento na mão da iniciativa privada é muito fácil. Isso por que eu nem quero entrar no mérito dos professores em falta, os salários e tudo mais.
A gente gosta. O esforço de estudar lá vale a pena. Mas não dá pra entender e muito menos aceitar ter que enfrentar encanamento mal cuidado e fiação sem manutenção em um acervo histórico.
PS: O literatortura está pensando em uma forma de angariar os protesto e dar a eles uma maior dimensão na internet. Em breve devemos surgir com maiores informações.
Cecília Garcia é formada em Linguística pela Unicamp e pós-graduada em Jornalismo pela PUC-Campinas. Atualmente estuda Letras na Unicamp e tem convicção de que é através do debate que a cultura se expande e que a tolerância é a palavra-chave para repensar o mundo contemporâneo. Apaixonada por Literatura Inglesa, tem diálogos imaginários com Jane Austen – mas não é esquizofrênica, até que se prove o contrário.