São Paulo – A Defensoria Pública do Estado de São Paulo entrou na Justiça com uma ação civil pública que pede indenização de R$ 10 milhões por danos morais coletivos pela ação de reintegração de posse do terreno do Pinheirinho, em São José dos Campos (SP), em janeiro de 2012.
O reivindicado pelo órgão é que o valor seja pago pela massa falida da Selecta Comércio e Indústria S/A, pertencente ao empresário Naji Nahas e proprietário da área, ao Fundo de Direitos Difusos (FDD), vinculado ao Ministério da Justiça e gerido por um conselho integrado por representantes do poder público e de entidades civis. O fundo tem como objetivo a reparação de danos causados aos interesses coletivos.
Além disso, a defensoria pede que o tratamento psicológico das famílias, a reinserção em programas sociais para o acesso à moradia e à qualificação profissional, e a retirada de resíduos sólidos – que ainda se encontram na região – sejam custeados pela massa falida da Selecta. A coordenadora do Núcleo de Habitação e Urbanismo da Defensoria Pública estadual e uma das autoras da ação, Anaí Rodrigues, ressalta que, apesar destes pedidos serem importantes, são mais específicos.
O objetivo da ação, explica, é que o Estado e a empresa de Nahas se responsabilizem pelo episódio da desocupação violenta do terreno ocupado por cerca de 1.700 famílias em janeiro do ano passado. “O foco da ação é a responsabilização do Estado e da empresa pela forma como as coisas aconteceram, para que o Estado busque soluções para que este tipo de coisa não volte a acontecer”, disse.
O texto da ação também pede que o governo estadual padronize os procedimentos da Polícia Militar em caso de desocupações, com treinamentos específicos de abordagens que respeitem os direitos humanos. Os defensores também pedem que a prefeitura de São José dos campos apresente um plano de atuação para que o atendimento habitacional seja garantido às famílias desocupadas. “Pedimos também para que o estado de São Paulo e o município de São José se retratem publicamente reconhecendo que houve excessos e abusos”, explicou Anaí.
Como mostrou reportagem da RBA em janeiro, quando a desocupação completou um ano, cerca de 1.570 das 1.700 famílias que viviam no terreno estão recebendo um auxílio-aluguel de R$ 500, sendo que R$ 100 são pagos pela prefeitura e R$ 400 pelo governo do estado. Nenhuma das famílias recebeu atendimento habitacional definitivo. “As famílias estão espalhadas, em casas de parentes, em outras ocupações. Temos informações de que várias famílias estão ocupando áreas de risco.”
A defensora frisa a problemática que surge com as soluções imediatas para moradia social. “Imagina, 1.500 famílias recebendo bolsa-aluguel. O aluguel na cidade aumenta, não tem jeito. Esse é um problema que sempre enfrentamos com esses atendimentos provisórios, as pessoas não conseguem alugar, principalmente famílias numerosas, e acabam saindo para soluções ajeitadas, e muitas vezes saem da cidade.”
O processo tramita na 2ª Vara da Fazenda Pública de São José dos Campos. A ação foi feita com base em estudos técnicos e sociais feitos pela própria defensoria em São José dos Campos, e nas 1050 ações indenizatórias individuais que correm desde que as famílias, após serem removidas de suas casas, procuraram a órgão. “Muitas dessas ações individuais foram feitas com base num cadastro que essas famílias fizeram, com um questionário sobre a questão dos danos de bens materiais. Fizemos também entrevistas, relatórios, foi uma ação que deu trabalho, por isso foi ajuizada só agora”, explica Anaí.
Caricatura
O episódio do Pinheirinho é classificado por ela como um caso “emblemático”. “É uma caricatura de coisas que a gente vê no dia a dia. Só que ali as coisas aconteceram de forma mais caricata mesmo. Mas a defensoria vê isso em menor grau em diversas desocupações no estado”.
O pedido de R$ 10 milhões que serão destinados ao Fundo de Direitos Difusos do Ministério da Justiça tem suas bases nas violações de direitos fundamentais dos moradores do Pinheirinho, como explica a autora da ação. “Entendemos que houve violações, e muitas. Desde a forma como a coisa foi feita. A desocupação foi uma sequência de desrespeito à dignidade das pessoas e à forma de como deve ser feita uma desocupação.”
A data e hora da ação policial, no dia 22 de janeiro – um domingo de manhã – também foram criticadas pela defensora. “Vimos o poder público comemorando a vitória da desocupação, dizendo que o ‘elemento surpresa’ tinha sido um grande aliado. Para nós da defensoria, o elemento surpresa é um dos maiores violadores de direitos. Você precisa avisar com antecedência e dar a elas a possibilidade de sair voluntariamente.” Ela explica ainda que, legalmente, reintegrações de posse precisam ocorrer, necessariamente, em dias úteis.
Anaí ainda diz que os moradores do terreno foram tratados como verdadeiros inimigos do estado, quando não deveriam ser vistos desta maneira. “O poder público tem de arranjar outra maneira de lidar com isso, para que a reintegração seja feita com base no respeito, para que haja orientação da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, da Polícia Militar, de lidar com essa população como pessoas com direitos.”
Fonte: Rede Brasil Atual