Por Cristiano Lange dos Santos e Marcelo Sgarbossa.
Na Rio + 20, Conferência Mundial das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, realizada em julho, a presidente Dilma Roussef, enfatizou a necessidade de rediscutir o Produto Interno Bruto (PIB), que é a soma de toda a riqueza acumulada por uma nação, como indicador dos níveis de desenvolvimento econômico.
De fato, trata-se de uma concepção imediatista de desenvolvimento “econômico” adotado pela maioria dos países que continua a encarar o meio ambiente como um inimigo dos humanos, desrespeitando os limites e os ciclos de regeneração dos recursos naturais.
Tal entendimento produziu, ao longo dos anos, a concepção errônea de que cuidar da natureza é ser contrário ao desenvolvimento, mas pior do que isso é acreditar que para maximizar os lucros é preciso absorvê-la ao máximo, a ponto de quase esgotá-la.
Quem sabe, não nos baseamos na cultura indígena, tão criticada e explorada, mas que preserva os recursos naturais, se harmonizando e se relacionando intimamente com a natureza e consumidora daquilo que realmente necessita para viver.
Ou na experiência do Butão, país na Ásia, que instituiu o Índice de Felicidade Bruta (FIB), fundando a centralidade das políticas públicas com a finalidade de que seus habitantes encontrem a felicidade e o bem-estar, baseando-se em pilares sociais e ambientais deixando o econômico em segundo plano.
Vale dizer que há uma Proposta de Emenda à Constituição 19/10, de autoria do Senador Cristovam Buarque que insere a felicidade como um direito social, junto com o direito ao trabalho, à moradia adequada, à educação, à saúde, à segurança, ao lazer, de modo que tais direitos sejam meio à realização da felicidade individual e coletiva.
É o caso dos Estados Unidos que, embora passe por uma grave crise econômica, tem visto o seu Produto Interno Bruto (PIB) subir e se manter entre os maiores do mundo enquanto a sua população está piorando seu nível de qualidade de vida.
Na realidade é o lucro das corporações transnacionais que criam essa falsa ilusão de economia aquecida.
Basta estar que a Constituição Americana, promulgada em 1776 também a prevê expressamente como uma meta a ser alcançada pelo seu povo que, àquele momento, havia sido expulso dos países europeus por questões religiosas e econômicas e buscava melhores condições de vida em outro local.
A Declaração de Independência buscou limitar os poderes do Estado e permitir que eles pudessem ao menos sonhar com tais possibilidades de melhorar de vida, e maneira a concretizar o direito à felicidade.
Lembre-se que os Estados Unidos é um país de cunho liberal e que apesar desse direito ser previsto na Constituição não é fundamento para suas políticas públicas estatais.
É interessante essa proposta, mas é preciso mais do que apenas desejos. Como bem destacou Carlos Drummond de Andrade que “das leis não nascem lírios” (poema Nosso Tempo).
Enfim, as leis não são a solução para tudo, nem a panacéia dos problemas sociais. Apenas a título exemplificativo, quem dera o Município de Porto Alegre cumprisse o Plano Diretor Cicloviário Integrado (PDCI), votada e promulgada em 2009, mas que agora está sendo taxada de inconstitucional pelos mesmo que a aprovaram.
Para termos uma idéia da importância que o tema tem gerado o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) chegou a organizar uma série de conferências, nos diversos países desenvolvidos, emergentes e em desenvolvimento, com o intuito de difundir e desconstruir a teoria do crescimento econômico a qualquer custo, ditado pelo apelo ao consumo e ao capital sem os devidos cuidados com a preservação do meio ambiente e da democracia.
O Brasil, ainda que seja a 6ª maior economia do mundo em relação ao PIB, segundo relatório de felicidade global, é tão somente o 25º no ranking geral, ficando atrás de países latino-americanos não tão ricos como México (24º), Venezuela (19º), Costa Rica (12º) e de países desenvolvidos como Dinamarca (1º), Finlândia (2º), Noruega (3º); Holanda (4º).
Percebe-se, diante disso, como não há uma relação direta e imediata entre a riqueza (fator econômico) e a felicidade (fator de bem-estar) das pessoas de um país.
Precisamos imediatamente rever os valores da sociedade de consumo, que prega a liberdade e a felicidade, mas nos aprisiona, tal como se fossemos mercadorias.
O sociólogo Zygmunt Bauman (Vida Para Consumo: A Transformação das Pessoas em Mercadoria, Editora Zahar) revela essa faceta, descrevendo o que as pessoas se submetem para se sentirem mais felizes e reconhecidas na sociedade pós-moderna.
Há outros valores importantes, que tem sido ignorado, mas que precisam ser reapresentados à nossa atual sociedade, tais como o bem-estar, a responsabilidade intergeracional, o cuidado com os recursos naturais, a autonomia e a liberdade.
Enfim, é um debate promissor, já que o modelo atual, eminentemente econômico, se baseia apenas em números, produção do capital e consumo desconsiderando os valores fundantes da vida humana: bem estar, felicidade e qualidade de vida.
E porque não adotar o índice da Felicidade Interna Bruta? afinal, debater esse modelo que prima pelo bem estar dos humanos em detrimento do capital pode ser um caminho para encontrarmos as respostas que tanto procuramos.
Cristiano Lange dos Santos. Advogado. Especialista e Mestre em Direito. Foi Professor de Direito Constitucional na Faculdade de Direito. É Procurador Jurídico do Laboratório de Políticas Públicas e Sociais – LAPPUS.
Marcelo Sgarbossa é advogado. Mestre em Análise de Políticas Públicas pela Universidade de Turim (Itália) e Doutorando em Direito pela UFRGS, professor da ESADE e Diretor do Laboratório de Políticas Públicas e Sociais – LAPPUS. Vereador eleito em Porto Alegre.
Fonte: http://sul21.com.br