O café nosso de cada dia

Por Clóvis Campêlo.

Uma das coisas que mais me davam satisfação na vida era passar na casa de dona Carmelita, minha avó materna, para tomar com ela o café da tarde.
A hora do moca, como ela chamava, era imperdível. Sempre tinha na mesa um cuscuz quentinho e o insuperável bolo formigueiro.
Já faz dez anos que ela se foi e lembro com carinho e saudade daqueles momentos felizes de encontros familiares.
No seu CD de chorinhos nº 3, feito em homenagem a Francisco Soares, o Canhoto da Paraíba, o compositor pernambucano Inaldo Moreira conta que o conheceu em 1959, na casa de Mestre Sérgio, na Rua das Águas Verdes, no tradicional bairro de São José, no Recife.
Lá, todos os sábados, a partir das 19 horas, os chorões da cidade se reuniam, formando uma roda de choro onde o consumo de álcool era proibido. O que movia os chorões era o café, acompanhado de cuscuz e pão com manteiga. Pense numa coisa mais romântica!
Uma das maiores dificuldades que senti na minha vida, quando nos anos 70 me arrisquei pela alimentação macrobiótica, imitando Gilberto Gil e John Lennon, querendo alcançar o nirvana de qualquer jeito, foi deixar de tomar café.
De manhã cedinho, quando dona Tereza, a minha mãe, passava a água fervendo pelo coador repleto daquele pó negro e maravilhoso, incensando a casa com um cheirinho característico, todas as minhas convicções iam por água abaixo. Não resistia.
Originário da Etiópia, o café foi introduzido no Brasil em 1727. Foi plantado inicialmente na região norte do país. Mas, foi em São Paulo e Minas Gerais que o seu cultivo encontrou um solo com condições mais propícias, gerando uma nova fonte de riqueza para o país e para a região sudeste.
Satisfeito, vejo nos meus compêndios homeopáticos que o café nosso de cada dia, da maneira como é entre nós preparado, coado e sem que o pó seja fervido junto com a água, é mais salutar por diminuir o seu teor de cafeína.
Fico feliz e tranqüilo. Hoje, não saberia mais viver sem ele.

Recife, 2010

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