No apagar das luzes de 2024, em 30 de dezembro, a justiça argentina emitiu condenação de um ativista popular por ele ter denunciado o genocídio continuado cometido por “israel” contra o povo palestino há quase 80 anos.
Alejandro Bodart, ex-legislador e dirigente do Movimento Socialista dos Trabalhadores (MST), foi condenado pela Justiça de Buenos Aires a seis meses de prisão em regime suspenso. A decisão, proferida pela Sala III da Câmara Penal, Penal Juvenil, Contravencional e de Faltas, reverteu absolvições anteriores e decorreu de publicações feitas por Bodart em 2022, nas quais ele qualificou “israel” como um “Estado racista e genocida” e defendeu a causa palestina com a expressão “do rio ao mar”.
A denúncia foi apresentada pela Delegação de Associações Israelitas Argentinas (DAIA), que acusou Bodart de violar a lei antidiscriminatória nº 23.592. Os juízes Jorge Franza e Ignacio Mahiques votaram pela condenação, argumentando que as declarações de Bodart deslegitimam a existência de “israel” e incitam à violência, enquanto a juíza Patricia Larroca votou pela absolvição. Em resposta, Bodart anunciou que recorrerá da decisão em todas as instâncias judiciais disponíveis, até chegar à Suprema Corte de Justiça da Nação.
Não se tem notícia de alguém condenado por supostamente deslegitimar a existência dos Estados Unidos, que, como “israel”, comete atrocidades há décadas mundo afora, incluindo limpezas étnicas — como a morte de mais de 300 mil japoneses pelas bombas atômicas em Hiroshima e Nagazaki. Ou a África do Sul do Apartheid, um regime racista que massacrava negros por serem considerados seres inferiores. Ou mesmo, tão em voga nos últimos anos, por se acusar a Venezuela de ser um regime “genocida” e todos os tipos de absurdos – neste caso, até mesmo as autoridades argentinas, com muito prazer, emitem declarações.
Mas “israel” matou mais de 45.000 palestinos em um ano e três meses, sendo quase 18.000 crianças e mais de 12.000 mulheres. Deixou mais de 11.000 desaparecidos, a maioria sob os escombros – que podem ser somados às mortes confirmadas, pela impossibilidade da maioria deles ser resgatada com vida. “israel” reduziu em 6% a população da Faixa de Gaza, obrigando ainda mais de 100.000 pessoas a fugirem da região para não serem exterminadas. Trata-se de um caso clássico e evidente de limpeza étnica, isto é, de genocídio. As palavras de Bodart não são nada mais do que uma constatação da realidade.
Percebe-se que o lobby sionista não tem grande força apenas no Brasil. A Argentina, atualmente, é governada por Javier Milei, um preposto do imperialismo estadunidense que, como tal, também é porta-voz do sionismo. Foi para a Argentina que teria fugido Yuval Vagdani, soldado “israelense” acusado de cometer crimes de guerra em Gaza que estava a turismo no Brasil e foi procurado pela justiça brasileira.
“Condenar Bodart por três tuítes solidários com a causa palestina viola o direito humano, democrático e constitucional à liberdade de expressão e, na prática, é funcional à impunidade desses crimes”, diz um abaixo-assinado iniciado pelos argentinos pela absolvição imediata do ativista. “Denunciar um genocídio não é crime”, completa. É possível aderir ao abaixo-assinado aqui.
Alejandro Bodart nasceu em 2 de dezembro de 1963, em Córdoba, Argentina. Iniciou sua militância socialista nos anos 1980 e, ao longo de sua carreira, ocupou diversos cargos políticos. Foi deputado da Cidade Autônoma de Buenos Aires entre 2011 e 2015, período em que apresentou 553 projetos, destacando-se por sua atuação em defesa da educação e saúde públicas, além de propostas econômicas voltadas à justiça social. Atualmente, é secretário-geral e dirigente nacional do MST na Frente de Izquierda y de los Trabajadores Unidad (FIT-U) e coordenador da Liga Internacional Socialista (LIS), organização internacional fundada em 2019 que reúne mais de 30 grupos de esquerda revolucionária em cinco continentes.
Entrevista com Alejandro Bodart antes do primeiro julgamento. Assista no vídeo abaixo