Por Prensa “Por la Tierra”.
O documentário tem como objetivo visibilizar a contaminação, o desmatamento e as remoções que sofrem as comunidades camponesas e indígenas da região. Também aponta a cumplicidade dos Estados e sua conivência com o agronegócio em seus diferentes níveis. A série não se limita à denúncia do modelo, mas também mostra os processos de organização e resistência das comunidades camponesas e indígenas.”A agroecologia é uma disputa permanente com o agronegócio.” Uma disputa que precisa de reforma agrária, de políticas públicas e de que as pessoas mudem seu comportamento no sentido cultural”, afirma no documentário Darci Frigo, integrante de Terra de Direitos.
A denúncia levada adiante pelas organizações foi apresentada na Alemanha, onde a Bayer-Monsanto tem sua sede, encarregada de gerar as políticas e práticas de proteção dos direitos humanos e do meio ambiente em relação aos seus produtos. Nesse país, a Lei de Fornecimento obriga as empresas a identificar os riscos de abusos dos direitos humanos e no meio ambiente na atividade de seus fornecedores. «Temos que enfrentar um discurso forte, com o objetivo de identificar os responsáveis por toda a cadeia produtiva. Que a empresa se responsabilize pelo controle de toda essa cadeia produtiva», adverte Frigo.
Argentina, a saúde e o caso de Pergamino
O eixo do episódio sobre a Argentina é a afetação à saúde humana.Um dos testemunhos é o de Sabrina Ortíz, que impulsionou uma série de denúncias que resultaram em uma decisão histórica para afastar os agrotóxicos da zona urbana de Pergamino, na província de Buenos Aires.
Ela e sua família moravam no bairro Villa Alicia, adjacente a campos de soja. Em 2011, começaram a ter alergias e problemas respiratórios, toda vez que fumigavam nos campos próximos. Os exames revelaram que tanto ela quanto seus filhos tinham altos percentuais de glifosato e ampa (que é o metabolito do glifosato) na urina. Nesse ano, perdeu sua gravidez de cinco meses de gestação.Os médicos disseram-lhe que ela tinha se intoxicado, mas ninguém se atreveu a dar-lhe um diagnóstico formalmente.
“Fiquei sabendo de uma menina de 11 anos que morreu de câncer por causa da água contaminada.” Depois começaram a aparecer mais casos e depois me tocou”, conta outra vizinha de Pergamino, Gisell, na série.Vômitos, diarreia, febre, manchas na pele são algumas das afecções que sofrem aqueles que habitam essa cidade, na zona núcleo do agronegócio. Em Pergamino, foram encontradas entre 18 e 20 substâncias tóxicas nos poços de água da rede. Também detectaram 53 casos de câncer em um perímetro de oito quarteirões.
Ortiz decidiu denunciar. Como resultado desse processo judicial, chegou-se a um veredicto histórico pelo qual foram estabelecidas zonas de resguardo, de 1.095 metros para as fumigações terrestres e de 3.000 metros para as aéreas. Apesar da magnitude do denunciado, o diretor de litígios e defesa legal do CELS, Diego Morales, destaca que nos casos de contaminação ambiental por agrotóxicos «a carga de provar a afetação à saúde recai sobre as pessoas».
Paraguai, o despojo da terra e o caso da Colônia Yvype
Na Colônia Yvype, a 250 quilômetros de Assunção, já não há escolas. O Estado decidiu fechá-las “por falta de alunos”. “Fecharam a escola quando os habitantes venderam a maioria de suas terras e ficaram sem habitantes, porque estavam cultivando muitos campos de soja.” Por essa razão tivemos que levar nossos filhos (para a escola) a seis quilômetros, a outro a quatro quilômetros, a outro a dois quilômetros de nossa casa, o que tem um custo elevado para nós porque dependemos do que produzimos”, relata a produtora Dolly Grissel Ortíz.
Em 2001, foi aprovada a primeira semente transgênica de soja no Paraguai. Desde então, o avanço do monocultivo foi deslocando os habitantes da região e aqueles que decidiram ficar para lutar por suas terras foram criminalizados. Atualmente, 26 famílias camponesas em Colônia Yvyepe estão em uma disputa pela terra.
Essa colônia agrícola abrange uma superfície total de 3.889 hectares. São 190 lotes de 20 hectares que originalmente haviam sido atribuídos a agricultores camponeses como parte de uma reforma agrária, destinados a desenvolver a agricultura familiar camponesa.Mas o agronegócio avançou com diferentes modalidades de despejo que as famílias sofreram.
Marielle Palau, do Bases IS, explica: “Expulsaram-nos inicialmente oferecendo-lhes uma quantia que nunca teriam conseguido ganhar por suas terras.” Continuou-se a expulsá-los com a eliminação das condições de vida a partir da contaminação dos cursos de água, dos venenos que chegam às suas plantações de autoconsumo. E finalmente, através da criminalização.”
Na zona soja do Paraguai, a superfície ocupada por florestas reduziu mais de 65 por cento entre 1973 e 2000.Durante 2019, 75.000 hectares foram desmatadas na Mata Atlântica. Nesse ano, o Comitê de Direitos Humanos da ONU sancionou o Estado paraguaio por não tomar medidas em relação ao uso de pesticidas.
O caso ficou conhecido como Portillo Cáceres contra Paraguai, por Rubén Portillo Cáceres que morreu envenenado por agrotóxicos, além de comprovar a intoxicação de outras 22 pessoas, entre elas várias crianças.O pronunciamento contra o Estado paraguaio foi o primeiro caso a nível mundial por contaminação com agrotóxicos em que o organismo internacional intercedeu para exigir “adotar medidas positivas para proteger as pessoas”.
Bolívia, o desmatamento e o caso de Santa Cruz
Na Bolívia, o cultivo da soja geneticamente modificada ocupa 50 por cento das terras cultivadas do departamento de Santa Cruz, onde se concentram 70 por cento das hectares agrícolas do país. Lá vivem mais de 250 comunidades de famílias camponesas e indígenas.
Entre 2011 y 2022, se deforestaron cerca de 436 mil hectáreas de bosque directamente para cultivos de soja, lo que evidencia que el modelo se sostiene gracias a la incorporación permanente de nuevas de tierras a costa de los bosques tropicales y primarios.
“Eles vêm para explorar, nós cuidamos de nossas terras porque precisamos delas”, diz Zulma Taborga, camponesa chiquitana. A Bolívia desmata 800 hectares por dia. A contaminação por agrotóxicos afeta as pessoas e também a vegetação nativa.
“Hoje há mais desmatamento e seca do que quando começou o agronegócio.” É importante que se possam incorporar outras variáveis climáticas e ambientais, mas também de direitos humanos”, acrescenta Irene Mamani da Fundação Terra.
Brasil, a contaminação e o caso do Povo Avá-Guaraní
Paraná é o segundo estado produtor de soja do Brasil. Nos municípios de Guaíra e Terra Roxa, predomina o uso de agrotóxicos. Nestes dois municípios, onde se planta predominantemente soja e milho, há três aldeias avá-guaranis. Gilberto vive na aldeia Poha Renda, do Povo Avá-Guaraní. Lá, beber água pode significar ter dor de cabeça, vômitos, dor de barriga e erupções na pele.O avanço do agronegócio sobre suas terras mudou suas formas ancestrais de produzir e prejudicou o uso de plantas pela comunidade para exercer sua medicina tradicional. “É porque a terra está doente”, afirmam.
“Quando fumigam, as mães temos que correr para colocar as crianças dentro de casa”, contam no documentário as mulheres da aldeia, que por sua vez destacam o impacto dos pesticidas na saúde mental dos jovens.O Brasil é o país que mais usa agrotóxicos desde 2011.Lá, 97 por cento do desmatamento se explica pelo avanço da atividade agropecuária, por isso 8 milhões de hectares de vegetação nativa foram perdidos no Brasil entre 2019 e 2024.
No entanto, em meio ao despojo brota a esperança. Gabriel, da aldeia Y’Hovy, assegura: “Nossa vida não depende do dinheiro.” Não depende do que ganhamos. Nós só queremos viver. Nossa luta não vai parar aqui. Sempre vai continuar e não vamos desistir”.
Também olhando para o futuro, Jakeline Pivato, da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e Pela Vida, assegura: “Existe uma consciência cada vez maior sobre a presença dos agrotóxicos, e que não é um problema só dos camponeses.” É parte da nossa vida, está na nossa água, no nosso ar e temos que gerar o desejo de encontrar uma saída. Para nós, essa saída é a agroecologia.