Por Lorenzo Santiago.
O registro para candidatos presidenciais na Venezuela ficou marcado pela impossibilidade da candidatura de Corina Yoris. Sua agremiação, Vente Venezuela, não conseguiu inscrever o nome da professora de filosofia que ficou de fora da disputa. Yoris havia sido indicada pela ex-deputada María Corina Machado, que está inabilitada por 15 anos e era, até então, o principal nome da oposição para essa disputa.
O fato de Yoris não ter conseguido o registro gerou críticas. O Itamaraty emitiu nota expressando “preocupação” e, dias depois, Lula declarou ter ficado surpreso com a decisão. “Primeiro, a decisão boa de a candidata proibida pela Justiça indicar uma sucessora. Achei um passo importante. Agora, é grave que a candidata [sucessora] não possa ter sido registrada. Ela não foi proibida pela Justiça. Me parece que ela se dirigiu até o lugar, tentou usar o computador e não conseguiu entrar”, disse o presidente.
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Mas, o que impediu a candidatura de Yoris?
A indicada do Vente Venezuela era desconhecida na política venezuelana. Nunca ocupou cargo público e, pela primeira vez, iria disputar uma eleição. Por não ter cargo de responsabilidade no seu partido, ela própria não poderia usar a plataforma do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) para formalizar sua candidatura. Isso é de responsabilidade do representante de cada partido no CNE.
Mas nem o próprio grupo de Corina Yoris estava habilitado para fazer registros eleitorais. O Vente Venezuela não está registrado como partido político no país, mas sim como um movimento político, que pode participar de atos, organizar eventos, mas não disputar eleições.
O coletivo liderado por Maria Corina Machado não esteve nas urnas nas últimas eleições e, portanto, não elegeu nenhum deputado, prefeito ou governador. Em resumo, não é partido político reconhecido no país e, portanto, não poderia registrar uma candidatura.
Segundo a advogada constitucionalista venezuelana Olga Álvarez, essa é uma questão que parte apenas do partido e não de um bloqueio da justiça.
“O Vente Venezuela não tem um responsável que tenha um código de acesso ao CNE, porque não está constituído como partido político. A lei dos partidos políticos define que, para estar registrado, o partido precisa participar de eleições e ter ao menos 1% de votos para qualquer candidato. Os partidos que cancelaram sua participação ou que não alcançaram 1% da votação não poderão renovar seu registro”, disse ao Brasil de Fato.
Outra alternativa era buscar alianças e conseguir a indicação por meio de coalizão. María Corina recorreu ao grupo do qual o seu partido faz parte, a Plataforma Unitária que, no entanto, escolheu outro candidato, o ex-embaixador Edmundo González Urrutia. Ela tentou depois o apoio do governador de Zulia e histórico opositor do chavismo, Manuel Rosales, para tentar fechar acordo, mas não recebeu seu apoio.
Rosales não só negou apoio a Corina, como entrou na disputa pela presidência, expondo um racha na oposição. Para Olga Álvarez, essa é uma questão que extrapola aspectos técnicos eleitorais. Segundo a advogada, o que cabia nesse caso era um recurso no CNE, que não foi feito.
“Os grupos escolheram Manuel Rosales, isso não tem relação com uma questão técnica. É uma questão politica. O que eles fizeram foi uma reclamação de microfone, não tentaram recorrer ao CNE ou fazer uma reclamação formal aos órgãos eleitorais. Corina Yoris não tem nada que impede a candidatura”, afirmou.
Corina Yoris ainda poderia recorrer a uma última opção, prevista no artigo 52 da lei eleitoral: o registro por iniciativa própria. Para isso, o candidato precisaria reunir a assinatura de ao menos 5% do número total de eleitores registrados no país. Nas eleições regionais de 2021, cerca de 21 milhões de venezuelanos estavam habilitados para participar, portanto ela precisaria de 1,5 milhão de assinaturas para sair candidata.
Ela poderia ter conseguido esse número, mas não buscou essa alternativa. Segundo o Vente Venezuela, nas primárias da oposição em outubro de 2023, cerca de 3 milhões de pessoas participaram. María Corina recebeu 93,13% dos votos, o que equivaleria a 2,8 milhões de votos, número que teria sido mais do que suficiente para inscrever Corina Yoris no pleito.
Outra possibilidade ventilada no grupo de María Corina seria a substituição de candidatos antes do pleito. Segundo a regra eleitoral, um partido só pode trocar o nome de um concorrente em caso de morte, renúncia, incapacidade física ou mental comprovada ou por motivos constitucionais e legais. De acordo com o calendário eleitoral divulgado pelo CNE, as trocas podem ser feitas até 20 de abril.
No entanto, os outros partidos escolheram candidatos diferentes e não optaram por Corina Yoris no período da inscrição, o que pode dificultar o uso dessa ferramenta.
“A lei eleitoral estabelece esse período de troca e a possibilidade para ela é fazer com base em uma renúncia. No caso da Corina Yoris, mesmo que não haja impedimento pessoal, ela não teve respaldo de um partido e não usou as outras vias dos eleitores para poder se candidatar”, afirmou Álvarez.
Ao todo, 13 candidatos estão inscritos para disputar o pleito desse ano. A maioria deles, é de oposição. O candidato do governo, Nicolás Maduro, recebeu o apoio de 11 partidos que integram o grupo Grande Polo Patriótico Simón Bolívar.
Regras eleitorais
As eleições na Venezuela são realizadas em turno único, portanto quem receber mais votos é eleito. O mandato presidencial dura seis anos.
Os eleitores votam em urnas eletrônicas que imprimem os comprovantes de votações em cédulas. O eleitor confere se o voto foi registrado de forma correta e deposita o comprovante em uma urna para eventual recontagem dos votos. O Conselho Nacional Eleitoral afirma que a Venezuela “é o primeiro país do mundo a adotar esse tipo de mecanismo”. Desde 2004, o pleito é realizado dessa forma.
As eleições de 2024 estão marcadas para 28 de julho. Os eleitores terão de 6h às 18h para votar. A campanha eleitoral será realizada de 4 a 25 de julho.
Edição: Rodrigo Durão Coelho