Por Francisco Fernandes Ladeira.
No sistema capitalista – modelo econômico e civilizacional predominante na maior parte do planeta – o proletariado é explorado das mais diversas formas. A principal, como nos explicou Marx, é a “mais-valia”, que consiste no fato de o trabalhador produzir, em um determinado período, muito mais do que recebe como salário. Dito de outro modo, esse excedente é o lucro do patrão.
Também há os diferentes tipos de assédios psicológicos aos quais as pessoas estão expostas em uma fábrica ou empresa. Esta temática é tratada em “Recursos nada humanos”, décimo quinto livro do escritor capixaba Maxwell dos Santos, que também é licenciado em Letras/Português pelo Instituto Federal do Espírito Santo (IFES) e graduado em História pela Uninter.
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Apesar de ser uma obra de ficção, o autor buscou exemplos reais para construir seu texto, que denuncia condutas abusivas de alguns profissionais de recursos humanos (RH), especialmente na área de recrutamento e seleção.
Assim, o leitor poderá refletir (ou mesmo se identificar) com os casos de preconceitos, discriminações e questionamentos sobre aspectos da vida privada alheia, feitos por analistas de RH, a partir das entrevistas de emprego de Mariana, Juliana, Rayane, João, Caio e Daniel.
Mariana, a despeito de seu ótimo currículo, foi considerada pela recrutadora de uma plataforma digital de delivery como não apta para trabalhar na empresa, simplesmente por ser mãe solo. Do mesmo modo, a atividade como vocalista e tecladista de uma banda de rock foi o motivo alegado para a não contratação de Juliana como redatora em um centro universitário.
Já Rayane foi julgada por não possuir as “qualificações necessárias” para trabalhar em uma loja de moda fitness, pois, segundo as palavras da analista de RH, a moça “está acima do peso”, fator que está ligado “a tendência a comorbidades, doenças, baixa autoestima e estresse”.
Em uma entrevista de emprego, para auxiliar administrativo em uma cooperativa de cirurgiões oncológicos, João foi humilhado ao questionar o fato de a empresa omitir dos candidatos as condições de trabalho adversas. “É assim que a empresa funciona, aceite ou procure outro lugar que atenda às suas exigências. Se não quiser se adaptar, é só dar o fora”, enfatizou a recrutadora.
O jovem Caio, após ouvir várias falas racistas, preconceituosas e classicistas, em uma dinâmica de grupo que forjou um debate sobre a temática “cotas raciais”, desistiu da vaga como copywriter em uma agência de lançamentos. Tal procedimento, como constatou o rapaz, consistia em uma espécie de filtro para dispensar candidatos a emprego com ideias progressistas.
Por fim, Daniel teve fortes desavenças com o recrutador de uma empresa de pagamentos, ao tomar conhecimento de que a faixa salarial só é decidida após a entrevista do candidato a emprego (baseando-se em suas qualificações e experiências).
Como não sou adepto a spoiler, posso adiantar que, por trás das entrevistas de emprego presentes no livro, também há certas frustrações, ressentimentos e traumas dos próprios recrutadores. Também há reviravoltas interessantes nas histórias das personagens principais.
Além de apresentar uma leitura agradável e fluida (algo frequente nas produções de Maxwell dos Santos), “Recursos nada humanos” também possui uma relevante função social: é importante para todos que buscam por um emprego, pois ajuda a preparar os candidatos para eventuais situações de abuso e a denunciar condutas inadequadas.
O livro está disponível para download gratuito (PDF) em http://bit.ly/recursosnadahumanospdf
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Francisco Fernandes Ladeira é doutorando em Geografia pela Unicamp