Carnavais da Pátria Grande. Por Raul Fitipaldi.

Por Raul Fitipaldi, para Desacato.info.

Depois da opinião insultante sobre o carnaval do nomeado presidente da Fundação Catarinense de Cultura, Rafael Nogueira, é preciso que falemos da mais importante festa popular e social do nossa região patriograndense, para que o mal educado entenda que não só aqui o carnaval é relevante e que está longe de ser uma festa de m… Mais ainda, é nossa história viva contada com infinitas formas, sons e cores. Carnaval é a espetacular festa do povo, esse povo do qual talvez não goste muito o funcionário. Como o carnaval do Brasil não precisa de apresentação, todos e todas o conhecemos e amamos profundamente, vamos falar de outros carnavais, alguns carnavais da Pátria Grande.

O carnaval do Uruguai

Comecemos aqui do lado, no histórico carnaval do Uruguai que marcou minha infância e minha primeira mocidade, já independente (digressão: torço pela Mocidade Independente de Padre Miguel, então…). O carnaval oriental é muito longo, muito popular e percorre os bairros de Montevidéu e das capitais departamentais. De onde ele vem culturalmente?

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Vamos lá. Há duas correntes culturais no carnaval vizinho, a ancestral africana, expressada nas famosas “llamadas”, chamadas que abrem o carnaval afrodescendente, e a de origem espanhola, das não menos famosas “murgas”, comparsas que já foram só de homens e há muitos anos, corrigido o defeito, têm mulheres, tanto na apresentação coral e instrumental como na construção do carnaval e das peças carnavalescas. As duas correntes têm grande apelo popular.

As chamadas nascem nos bairros Sul e Palermo de Montevidéu, à beira do Rio de la Plata, e são herança da cultura bantu, ou banto, e da Angola Banguela. As murgas nascem na esteira da imigração espanhola, com base nas tunas e os tabuados ibéricos, e foi adotada nos primórdios do século 20 pelos vendedores de jornais acostumados naquela época a vozear as manchetes dos jornais, tanto no centro das cidades como nos bairros no tempo em que o jornal se vendia a pé, casa a casa. Também pelos estudantes que protestavam por diversas reivindicações sociais. A murga sempre foi de protesto, irônica, usando o contraponto e o humor para expor os grandes problemas sociais. Isso acabou predominando nas últimas décadas do século passado e se consolidou no atual. Já as chamadas, com o ritmo belo, sensual e frenético do candombe, dá mais relevância à dança, a inclusão social e a harmonia dos instrumentos de percussão.

Cultural e politicamente, fora da geração de empregos em várias áreas, o carnaval uruguaio é um potente comunicador popular que ganhou, no decorrer dos anos, uma imensa representatividade nos palcos, no cinema e na produção musical e literária. É emocionante, mas, sobretudo, é uma foto da sociedade trabalhadora uruguaia, que em importância só tem comparação com o interesse do povo uruguaio pelo futebol.

Carnaval de Oruro na Bolívia

Foto: Rotcivrosas

Se trata de uma manifestação cultural maravilhosa, oriunda do festival Ito, da civilização dos Urus. No carnaval de Oruro temos na nossa frente um dos maiores exemplares da cultura dos nossos povos originários. 50 conjuntos representativos desfilam durante o carnaval que tem base nos costumes da cultura andina, muito presente em toda a região sul-americana.

A Pacha Mama, a Mãe Terra, está presente nestas festividades, a relação com a natureza e todas as espécies se vê simbolizada nos trajes e nos instrumentos do carnaval de Oruro. De fato, Oruro é a capital do carnaval boliviano. O nome da cidade vem de uma das minas de prata mais importantes da região, e a presença da dominação espanhola também se observa no enorme percurso do carnaval que ainda representa a briga celestial entre a Virgem Maria e o Diabo. Tão importante é essa influência que uma das fantasias tradicionais e obrigatórias é a do Diabo.

O carnaval de Oruro talvez seja o mais autêntico carnaval oriundo da América do Sul, apesar da intromissão cristã em parte da sua construção e representação. É lindo demais.

Semana próxima, já mais pertinho da data oficial do nosso carnaval brasileiro, vamos saber um pouco mais do carnal na Pátria Grande lembrando os carnavais da Argentina e do México. Amanhã voltamos com nosso tema das quintas, a Democratização da Comunicação. Até lá!

Edição e Publicação: Tali Feld Gleiser

Raul Fitipaldi é jornalista e cofundador do Portal Desacato e da Cooperativa Comunicacional Sul.

 

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