ONU: mundo à beira de “suicídio coletivo” devido ao clima

Diretor-geral da ONU, António Guterres, afirma que está cada vez mais difícil cumprir as metas do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais.

Veneza, no norte da Itália: cientistas afirmam que o calor extremo que atinge grande parte do Hemisfério Norte s pode se tornar a nova normalidade do verãoFoto: Manuel Silvestri/REUTER

Enquanto Europa enfrenta uma forte onda de calor, com mais de mil mortes em poucos dias, e incêndios florestais se alastram pelos continentes europeu e americano, o secretário-geral da ONU, António Guterres, alertou nesta segunda-feira (18/07) que a humanidade está à beira de um “suicídio coletivo”.

“Metade da humanidade está na zona de perigo, de inundações, secas, tempestades extremas e incêndios florestais. Nenhuma nação está imune. No entanto continuamos alimentando nosso vício de combustíveis fósseis”, afirmou a autoridades de 40 países, reunidas em Berlim para o Diálogo Climático de Petersberg.

“Nós temos uma escolha: ação coletiva ou suicídio coletivo. Está em nossas mãos”, acrescentou, afirmando que os países continuam “jogando o jogo da culpa em vez de assumir a responsabilidade por nosso futuro coletivo”.

No evento em Berlim, autoridades de todo o mundo vão discutir durante dois dias o clima extremo, bem como o aumento do uso de combustíveis fósseis, o alto preço dos alimentos e os impactos da crise climática.

A reunião, convocada anualmente há 13 anos pelo governo alemão, é vista como uma das últimas oportunidades para chegar a um acordo entre os principais países antes da COP27, em novembro no Egito, depois que negociações técnicas em junho tiveram pouco progresso em questões-chave, como ajuda climática para países em desenvolvimento.

Segundo Guterres, o limite de aquecimento global de 1,5°C estabelecido no acordo climático de Paris, em 2015, está ficando cada vez mais fora de alcance, mesmo com mais seres humanos sendo atingidos por enchentes extremas, secas, tempestades e incêndios florestais.

Em sua fala, feita por videoconferência, Guterres também criticou duramente os “bancos multilaterais de desenvolvimento”, instituições como o Banco Mundial, que são financiados pelos contribuintes do mundo rico para prestar assistência aos países pobres.

“Como acionistas de bancos multilaterais de desenvolvimento, os países desenvolvidos devem exigir a entrega imediata dos investimentos e assistência necessários para expandir as energias renováveis ??e criar resiliência climática nos países em desenvolvimento.”

Os países em desenvolvimento esperam que as nações ricas forneçam 100 bilhões de dólares em ajuda climática anual, uma meta que deveria ter sido atingida até 2020.

Homem trabalha para conter um enorme incêndio florestal
França, Espanha e Portugal enfrentam graves incêndios florestaisFoto: Sarah Meyssonnier/REUTERS

Alemanha lamenta aumento de uso de combustíveis fósseis

Anfitrião do evento, o chanceler federal da Alemanha, Olaf Scholz, expressou preocupação com um “renascimento global da energia fóssil” resultante da escassez de gás causada pela invasão da Ucrânia pela Rússia.

“Ninguém pode ficar feliz com o fato de que a geração de energia a carvão esteja aumentando”, lamentou.

O governo alemão aprovou recentemente o uso de mais centrais elétricas a carvão, para tentar contornar a redução drástica do gás vindo da Rússia.

“Isso torna ainda mais importante deixarmos completamente claro: esta é uma medida de emergência temporária estritamente limitada que não prejudicará nossas metas climáticas”, disse Scholz.

O governo alemão apresentou na conferência seu conceito de “guarda-chuva de proteção global” contra os riscos climáticos. O objetivo é fortalecer e desenvolver a arquitetura global de financiamento e seguro de riscos climáticos para indivíduos e países mais vulneráveis.

“Não é mais uma questão de se os danos climáticos ocorrerão, mas, sim, de com que frequência, quão severos e quão caros serão. E, acima de tudo, quem será particularmente afetado”, disse Jochen Flasbarth, alto funcionário do Ministério do Desenvolvimento da Alemanha.

“Devemos reconhecer que há danos climáticos e que os países mais vulneráveis, em particular, precisam de nossa solidariedade para lidar com isso”, acrescentou.

Duas mulheres de roupas veranis caminham. Um termômetro de rua marca 42 °C
Onda de calor já matou pelo menos mil na EuropaFoto: Angel Garcia/Zuma/picture alliance
Catástrofes cada vez mais frequentes

Incêndios florestais assolam a Europa e a América do Norte. Na América do Sul, o sítio arqueológico de Machu Picchu foi ameaçado pelo fogo.

O calor extremo também atingiu recordes em várias partes do mundo nos últimos meses, quando ondas de calor abalaram a Índia e o sul da Ásia. Secas devastaram partes da África.

O drama, porém, é ainda maior em alguns países, que podem até deixar de existir. No evento em Berlim, o ministro do Meio Ambiente de Antigua, Molwyn Joseph, sublinhou a urgência da questão: “O que é descrito como crise, para nós é catástrofe. Existem pequenas ilhas que estão desaparecendo”.

Cientistas afirmam que o calor extremo que atinge grande parte do Hemisfério Norte nas últimas semanas pode se tornar a nova normalidade do verão, se o aquecimento global se mantiver.

“Enquanto esta reunião está acontecendo, partes da Europa estão assando, na verdade estão queimando. E, infelizmente, é uma experiência muito familiar para muitos milhões em todo o mundo”, disse Alok Sharma, autoridade britânica que liderou as negociações climáticas na COP26, em Glasgow, 2021.

Seu sucessor para as próximas negociações sobre o clima, o ministro das Relações Exteriores egípcio, Sameh Shoukry, disse ser essencial garantir que “o atual estado de coisas não seja tomado como pretexto para retroceder ou renegar compromissos anteriores, especialmente os relacionados ao apoio aos países em desenvolvimento”.

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