O apartheid de Israel na Palestina e a hipocrisia ocidental. Por Sayid Marcos Tenório

Por Sayid Marcos Tenório.

Os acontecimentos da guerra na Ucrânia, com os ataques russos para desnazificar o país e o regime ucraniano e impedir o completo domínio da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) nas fronteiras da Rússia, bem como os desdobramentos geopolíticos que isso tem acarretado, trouxeram à tona a enorme hipocrisia e o padrão duplo dos governos e das mídias ocidentais. O que é nenhuma surpresa para qualquer pessoa medianamente informada sobre os níveis de preconceito e racismo com africanos, latino-americanos e árabes por parte dessa gente.

O padrão duplo foi exposto de maneira escandalosa, tentando nos fazer crer que o direito à legítima defesa só pertence aos escolhidos do império e aos protegidos pela hipocrisia das mídias ocidentais. Esse é um padrão que tolera grupos neonazistas e organizações terroristas que estão transferindo mercenários para lutar ao lado das tropas ucranianas, enquanto condena forças da resistência que lutam pela soberania de seus países, como os palestinos que resistem há 74 anos à brutal ocupação e ao apartheid israelense.

Não é por menos que o apartheid israelense tirou, mais uma vez, da cartola a sua hipocrisia humanitária e se apressou em apelar aos judeus ucranianos para que migrassem para “Israel – sua casa”. O Ministério da Imigração israelense anunciou a disposição de receber cerca de cem mil judeus da Ucrânia, e que, para tanto, iria construir mais assentamentos nos territórios palestinos ocupados. Como se vê, o objetivo do apartheid israelense não tem nada de humanitário, mas é parte do seu projeto colonial em buscar uma maioria demográfica que justifique o autoproclamado “estado judeu”.

Várias personalidades denunciaram a hipocrisia dos governos e das mídias ocidentais, como o deputado sul-africano Nkosi Zwelivelile Mandela, neto do líder da luta antiapartheid na África do Sul e ex-presidente Nelson Mandela. Ele disse que a guerra vem sendo orquestrada pelos EUA, pela OTAN e pelas forças neonazistas ucranianas contra a Rússia há oito anos e que “o complexo militar global é quem bate os tambores da guerra na Ucrânia, alimentando uma agenda de conflitos bélicos da qual a indústria de armas é a única beneficiária”, numa escalada de lucros sobre as ruinas deixadas no Afeganistão, na Síria, no Iraque, na Líbia, no Iêmen e em outras nações soberanas destruídas pelo império.

Ninguém deseja a guerra, os conflitos bélicos, as mortes e as destruições por ela provocados. Queremos um mundo com segurança, paz, liberdade e dignidade. Porém, não há como não se elevar a indignação quando vemos líderes ocidentais e sua mídia falarem sobre o direito da Ucrânia de se defender e que sanções contra a Rússia são legítimas, enquanto praticam discriminação racial contra pessoas vítimas de conflito por não se enquadrarem no biótipo europeu branco e de olhos azuis.

Um dos capítulos que merece destaque é a postura da corporação Meta, que controla Facebook, Instagram e WhatsApp, as três maiores plataformas de mídia social, de propriedade do judeu sionista Mark Zuckerberg. Essas plataformas alteraram suas regras para permitir que seus usuários pudessem adotar discurso de ódio e violência contra militares e cidadãos russos em todo o mundo; ao mesmo tempo que censuram, bloqueiam e removem milhares de perfis que denunciam o neonazismo, que legitimam as ações da Rússia e que defendem a justa causa do povo palestino contra o apartheid de “Israel”.

Essas mídias descrevem a resistência dos não europeus como “terrorismo”, enquanto o apartheid e o racismo de “Israel” são considerados “legítimo direito de defesa”. Os acusados e perseguidos por essas mídias sociais são desde as organizações não governamentais (ONGs) que prestam serviços humanitários aos palestinos, vítimas das constantes agressões dos agentes do apartheid judaico, até as organizações da resistência palestina, que exercem o seu legítimo direito de confrontar, por todos os meios, a ocupação e o projeto colonial israelense.

“Israel” designou como “terroristas” várias ONGs palestinas respeitadas internacionalmente com reconhecido trabalho humanitário e de defesa dos direitos humanos, que cooperam com a Organização das Nações Unidas (ONU) e importantes cortes internacionais de justiça, como o Tribunal Penal Internacional (TIP) e a Corte Internacional de Justiça (ICJ), com quem mantêm parceria para o fornecimento de informações, pesquisas e estudos sobre as constantes violações de direitos por parte da ocupação sionista.

O “Estado judeu” age em desacordo com o Direito Internacional, ameaça e viola os direitos dos palestinos, conforme denunciado recentemente pela Human Rights Watch (HRW) e Anistia Internacional. Essas organizações, através de seus relatórios, trazem ao conhecimento público o apartheid, os crimes de guerra e a violação de direitos promovidos pelo “estado judeu, fatos documentados ao longo de décadas com a colaboração de várias instituições internacionais de direitos humanos.

Das forças da resistência palestina, o alvo preferencial é o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas), que não é um “movimento terrorista” como os apologistas do apartheid israelense acusam, mas um partido político com existência legal, reconhecido pelo povo palestino e internacionalmente. É um componente genuíno e integral do movimento de libertação nacional palestino, não sendo cabível a falsa designação dada, por exemplo, pela Secretária do Interior da Grã-Bretanha, Priti Patel, uma das defensoras mais fanáticas de Israel no governo britânico.

O lobby sionista pressiona os países ocidentais para que adotem a mesma postura da representante britânica, porque sabe que a resistência palestina, liderada pelo Hamas, tem registrado muitos progressos políticos e militares, e conquistado apoio internacional, ao mesmo tempo que a ocupação está em declínio perante o mundo, já não conseguindo mais esconder os crimes de genocídio e apartheid cometidos contra palestinos.

Já que essas potências e as mídias ocidentais se dizem justas com vítimas de guerras e injustiças, como fazem em relação ao que ocorre na Ucrânia e aos refugiados ucranianos, por que não se posicionam pela punição dos crimes de guerra e contra a humanidade praticados pelo apartheid de supremacia judaica exercido pelos sionistas contra o povo palestino ou as agressões da Arábia Saudita contra o Iêmen?

Sayid Marcos Tenório é historiador e especialista em Relações Internacionais. É vice-presidente do Instituto Brasil-Palestina (Ibraspal) e autor do livro Palestina: do mito da terra prometida à terra da resistência (Anita Garibaldi/Ibraspal, 2019. 412 p). Twitter: @HajjSayid.

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