O texto-base da Medida Provisória (MP) 1.061/2021, que cria o Auxílio Brasil, foi aprovado ontem na Câmara (25) na forma de projeto de lei de conversão (PLV), relatado por Marcelo Aro (PP-MG), que modificou diversos pontos da proposta do Executivo a partir das 461 emendas apresentadas. O PLV segue para o Senado.
A discussão ocorreu de forma rápida na tarde de ontem. E a avaliação da diretora de Relações Internacionais e Institucionais da Rede Brasileira de Renda Básica, Paola Loureiro Carvalho, é que o Legislativo garantiu alguns avanços. O que permitiu inclusive que a proposta fosse aprovada por unanimidade, com 344 votos a favor. Em entrevista a Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual, ela destacou a elevação das linhas de pobreza e extrema pobreza e a retirada do empréstimo consignado e do voucher para creche como alguns dos encaminhamentos positivos. “Mesmo com todos os pesares sobre o fim do Bolsa Família e o formato que o governo de Jair Bolsonaro desenha para o Auxílio Brasil”, ponderou.
De acordo com o novo texto, as famílias em situação de pobreza, cuja renda familiar per capita mensal se situe entre R$ 105,01 e R$ 210, terão direito ao benefício social. Assim como as famílias em situação de extrema pobreza, com renda igual ou inferior a R$ 105, que antes chegou a ter o limite de R$ 89. Segundo Paola, o aumento na margem desses critérios permitirá a inclusão de mais pessoas como prioridade de atendimento.
Os avanços
Os deputados retiraram trecho da MP que permitia que até 30% do valor do Auxílio Brasil pudesse ser descontado na fonte para abater empréstimos consignados. Uma medida que poderia levar ao endividamento e à inadimplência das famílias, na análise de diversos especialistas. “Era, na verdade, colocar os mais pobres em uma situação de vulnerabilidade ainda maior, sem nenhuma segurança ou orientação”, observa.
O voucher creche, que utilizaria recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) também foi revisto após acordo da oposição. A medida, para Paola, era de fato “perigosa”, já que pela proposta do governo federal seria pago um valor inferior a R$ 200 às escolas de educação infantil que se habilitassem a receber as crianças mais vulneráveis do Cadastro Único (CadÚnico). Algo “irrisório” que a família “automaticamente teria que complementar”, ressalta a diretora.
“O governo apresenta uma proposta dessas como forma para ‘resolver a situação’ e ela é mentirosa. Na verdade, na vida das pessoas não tem efetividade. Temos que tomar cuidado porque o voucher, para quem não conhece essa política, acaba sendo algo mais fácil e que talvez ajude as pessoas. Mas na verdade não, o governo tem uma estratégia, uma linha política da economia que dialoga com a redução das políticas públicas. Ao justificar um voucher, ele está se autorizando a retirar recursos do nosso orçamento da educação. Voucher não é um direito constitucional nem uma política de garantia de dignidade e respeito e amplitude como precisamos defender a retomada no Brasil.”
29 milhões de excluídos
Diante da falta de explicações sobre o total de beneficiários do Auxílio Brasil, que o governo Bolsonaro trata apenas com a possiblidade de atender 17 milhões de famílias, o Legislativo avançou também sobre a proposta de “fila zero”. A medida visa atender todas as famílias em situação de pobreza ou extrema pobreza que não são atendidas pelo programa social. Ainda assim, Paola considera que essa iniciativa pode não corresponder à realidade devido ao desmonte do Cadastro Único.
A diretora lembra que, desde abril de 2020, quando o auxílio emergencial foi lançado, a Rede Brasileira cobrava da União que as informações do aplicativo migrassem para o banco de dados dos programas sociais. Uma forma de mostrar “quem são as pessoas pobres e extremamente pobres que precisavam de um atendimento de renda. No entanto, isso não foi feito. E nós tivemos só do aplicativo desligados agora em novembro, porque o auxílio emergencial acabou, 24 milhões de famílias”, contesta.
A exclusão desses beneficiários também preocupa a organização social, mas o tema não esteve nas alterações aprovadas no PLV. Levantamento da Rede mostra, porém, que pelo menos 29 milhões ficaram de fora do chamado Auxílio Brasil. “Deixamos de atender 39 milhões de famílias pelo auxílio emergencial. E somadas com as 4,5 milhões que já mantinham o Bolsa Família, isso dava em torno de 43 milhões de famílias atendidas por uma política de transferência de renda. Mas a gente migrou, de um mês para o outro, sem nenhum processo de transição e de releitura de quem são as famílias mais vulneráveis, para um atendimento de 14,5 milhões. Isso impactou financeiramente os municípios porque esse recurso circulava nas cidades. E, infelizmente, em novembro deixou de circular”, finaliza a diretora.