MP denuncia homem por morte de menina kaingang: motivo torpe e desprezo aos indígenas

Por Marco Weissheimer.

O Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul denunciou, sexta-feira (1º), um homem branco de 33 anos pelo estupro e morte por asfixia da menina indígena kaingang Daiane Griá Sales, de 14 anos, no dia 1º de agosto, no interior do município de Redentora, nas imediações da Terra Indígena do Guarita. Morador de Redentora, Dieison Corrêa Zandavalli, que já está recolhido no Presídio Estadual de Três Passos, foi acusado pelo MP da prática dos crimes de estupro de vulnerável e homicídio com seis qualificadoras (meio cruel, motivo torpe, dissimulação, recurso que dificultou a defesa da vítima, para assegurar a ocultação de outro crime e feminicídio).

Moradora do Setor Bananeiras da Terra Indígena do Guarita, Daiane foi encontrada, no dia 4 de agosto, em uma lavoura próxima a um mato, nua, e com as partes do corpo da cintura para baixo arrancadas e dilaceradas. Os exames periciais indicaram que o dilaceramento foi provocado por animais silvestres, depois que ela já estava morta.

Segundo o promotor Miguel Germano Podanosche, o denunciado conduziu seu carro por uma localidade no interior de Redentora, ciente de que ali aconteciam alguns bailes naquela noite, e passou a oferecer carona a jovens indígenas que se movimentavam a pé pelas imediações. “A vítima aceitou a carona e foi conduzida até o local do crime, especialmente selecionado em razão de ele o conhecer muito bem, dado que sua família havia possuído, em outros tempos, uma propriedade lindeira por ele frequentada. Lá, a ofendida, embriagada excessivamente, sem poder resistir, foi estuprada, estrangulada e morta”, afirmou.

Ainda segundo a denúncia do Ministério Público, as ações do acusado decorreram de motivo torpe, correspondente ao “desprezo do denunciado para com a população originária Kaingang e seus integrantes, nutrido pela falsa ideia de que tal comunidade e as autoridades constituídas reagiriam com passividade ao estupro em razão de sua condição de indígena”.

“Convém esclarecer que o denunciado estava procurando sua vítima em eventos sabidamente frequentados por jovens indígenas, havendo, inclusive, oferecido carona a outras garotas da mesma etnia, de modo que se pode afirmar que o fato de a ofendida integrar tal etnia foi fator determinante para que ela fosse objeto preferencial da escolha do denunciado. Ainda, a infração penal foi perpetrada mediante dissimulação, dado que a vítima fora atraída para o cenário dos eventos criminosos aceitando uma proposta de carona oferecida pelo denunciado, sem sequer imaginar o que lhe poderia acontecer em seguida”, relata o promotor na sua denúncia.

Na avaliação do advogado Bira Teixeira, contratado pela família de Daiane e pela comunidade kaingang da Guarita, a denúncia revela “o total desprezo pela vida humana” por parte do acusado. “Aquilo que estávamos dizendo desde o início, que gostaríamos de respostas em relação às circunstâncias do crime, inclusive sobre a existência de indícios de que ela teria sido morta também por sua condição de indígena, acabou sendo também o convencimento do Ministério Público”. A Daiane, acrescentou o advogado, “foi brutalmente assassinada neste ato de covardia também pela sua condição de indígena, pelo menosprezo ao povo indígena kaingang”.

Ainda segundo o advogado, a família e a comunidade kaingang estão de certa forma satisfeitas com a denúncia oferecida pelo Ministério Público porque o crime foi doloroso demais e uma dor que persistia era o temor de que o caso fosse colocado para debaixo do tapete, o que acabou não acontecendo.

“A nossa defesa e todas as organizações que estão acompanhando o caso não deixaram que ele fosse pra debaixo do tapete. A Dona Júlia (mãe da Daiane) de certa forma ficou aliviada. Na primeira conversa que tive com ela, ela me disse que não acreditava que haveria justiça. Nós vamos seguir dando voz a Daiane neste procedimento e vamos trabalhar como assistentes de acusação neste processo, para que o criminoso seja condenado e para que, mediante o debate público sobre o caso, consigamos inibir a prática de crimes semelhantes no futuro”, disse Bira Teixeira.

Sul21 está tentando contato com a defesa do acusado, mas ainda não obteve retorno.

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