Gestão democrática e autonomia: a importância e significado das eleições para o Conselho Universitário da UFFS

    Por João Alfredo Braida1, Luís Fernando Santos Corrêa da Silva2, Antônio Marcos Myskiw3.

    Neste mês de agosto acontecerão as eleições para o Conselho Universitário (CONSUNI) da UFFS. O Conselho é integrado por 54 cadeiras, assim ocupadas: Reitor (que preside o Conselho), Vice-Reitor, 3 Pró-Reitores indicados pelo Reitor (que presidem as 3 Câmaras do Conselho), 6 diretores de Campus (eleitos pela Comunidade Universitária do respectivo campus); 3 representantes da Comunidade Regional (indicados pelo Conselho Estratégico e Social da UFFS, integrado por representantes de entidades e instituições da região de abrangência da Universidade) e mais 40 representantes eleitos pela Comunidade Acadêmica, sendo 27 professores, 7 servidores técnico-administrativos em educação e 6 estudantes. São essas 40 cadeiras que estão em disputa na eleição de agosto, para um mandato de 02 anos, a se iniciar em 01 de setembro de 2021. Essa composição e formas de ocupação das cadeiras do CONSUNI estão fixadas no Art. 12 do Estatuto da Universidade.

    A existência de um Conselho Universitário deliberativo é determinação legal, como forma de garantir a observância do princípio da “gestão democrática” no ensino público, previsto no Art. 206, Inciso VI, da Constituição Federal, e no Art. 3º, Inciso VIII, da Lei Federal nº 9.394/1996 (Lei que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB). A mesma lei, no Art. 56, determina que, nas instituições de Educação Superior, a observância do princípio da gestão democrática é assegurada mediante a existência de “órgãos colegiados deliberativos, de que participarão os segmentos da comunidade institucional, local e regional”. Portanto, de acordo com o mandamento legal, o princípio da gestão democrática somente se efetiva, se torna real, mediante a existência do Conselho Universitário, mas não só, pois é necessário que, além de existir, o Conselho efetivamente desempenhe suas funções deliberativas, normativas, fiscalizatórias e recursais, como previsto no Estatuto da Universidade.

    Importante observar que, de acordo com o descrito acima, não é o Reitor, e sua equipe, que garante a observância do princípio da gestão democrática, mas sim o Conselho Universitário, instância deliberativa máxima das universidades federais. Não sem razão, uma vez que a legislação atual possibilita que o reitor nomeado pelo Presidente da República não seja aquele escolhido pela Comunidade Universitária. Isso, inclusive, é o que aconteceu na UFFS, na escolha do reitor atual, em 2019, e em outras 18 universidades federais e 3 institutos federais. Desconsiderando a consulta pública feita na comunidade Universitária e a eleição realizada no Conselho Universitário da UFFS, o Presidente da República escolheu como reitor o candidato que ficou em terceiro lugar em ambos os processos (obteve pouco mais de 20% dos votos na consulta pública e menos de 10% dos votos na eleição no Conselho Universitário).

    Portanto, a escolha do reitor da UFFS, de certo modo, não observou o princípio da gestão democrática, visto que a decisão da Comunidade Universitária não foi respeitada, como de praxe em governos anteriores, desde a redemocratização do país em 1988. O atual reitor da UFFS não foi escolhido por seus méritos acadêmicos, sua competência administrativa ou sua capacidade de liderança, referendados pelo voto da comunidade universitária. O atual reitor da UFFS foi escolhido em função de seu alinhamento político-ideológico com o Presidente da República, e, assim, se pode dizer que na UFFS a autonomia (outro princípio constitucional – Art. 207 da Constituição, segundo o qual a própria Universidade decide seus rumos), foi substituída pela heteronomia (alguém de fora define os rumos da Universidade). Uma das consequências desse processo heteronômico é que, nos últimos dois anos, o Conselho Universitário e, portanto, a gestão democrática, tem sido constantemente desrespeitado. Decisões do Conselho não foram publicadas, conselheiros foram ameaçados, processos tiveram a tramitação atrasada, conselheiros foram impedidos de acessar a sala das sessões, o poder de veto do reitor foi utilizado em situações indevidas, o direito ao recurso a decisões do reitor no Conselho Universitário foi negado, entre outras situações que ferem os princípios da autonomia universitária e da gestão democrática.

    Diante desse cenário, podemos concluir que a eleição de agosto se reveste de importância extraordinária, uma vez que a escolha de uma ampla maioria de conselheiros comprometidos com a ideia de uma Universidade pública, democrática e autônoma, como determina a legislação, é a única possibilidade de manter a UFFS dentro do marco legal, que exige uma gestão democrática e que se traduz na existência de um Conselho Universitário independente e capaz de exercer, plenamente, suas prerrogativas de deliberação. A eleição de agosto tem o poder de indicar se a Comunidade Universitária almeja uma Universidade pública, democrática, autônoma, gratuita, laica, socialmente referenciada, na qual o conhecimento e a ciência são valores inalienáveis e estão a serviço do desenvolvimento de um mundo melhor para todos e todas. Portanto, nessas eleições não podemos arriscar na hora do voto, depositando o voto em candidatos que não estejam realmente comprometidos com a autonomia e a gestão democrática, ou que pautem a sua ação na defesa de interesses de grupos político-ideológicos em detrimento do interesse público.

    O momento que vivemos aponta e explicita que isenção e neutralidade em relação à forma como a Universidade tem sido gerida, não é outra coisa que indiferença com a possibilidade de enfraquecimento e destruição da Universidade Pública brasileira, patrimônio da nossa sociedade. Optar pelo caminho da destruição é estar na contramão da história, pois assim como outras Universidades mundo a fora, a Universidade Pública brasileira foi criada para estar à frente da sociedade, para construir e valorizar saberes, artes e culturas e ser vanguarda na história, ao mesmo tempo em que busque ser politicamente responsável, socialmente inclusiva e de excelência acadêmica.

    1 Professor do Campus Chapecó, Professor da Área de Agronomia, ex-Diretor do Campus Realeza e ex-Pró-reitor de Graduação da UFFS.

    2 Professor do Campus Erechim, Professor da Área de Sociologia, Diretor do Campus Erechim.

    3 Professor do Campus Realeza, Professor da Área de História, ex-Diretor do Campus Realeza.

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