Por Ramon Rafaello.
“Até 2018, o número de pessoas em situação de fome no Brasil aumentou de 100 mil (para 5,2 milhões) devido a um aumento acentuado nas taxas de pobreza e desemprego e a cortes radicais nos orçamentos para agricultura e proteção social”, afirma o relatório da Organização Não Governamental, Oxfam, divulgado em setembro de 2020, onde o Brasil aparece como epicentro emergente da fome extrema.
Apesar do cenário de pobreza (ou desigualdade social), observa-se através da Pesquisa da Pecuária Municipal (PPM) divulgada pelo IBGE em novembro de 2020, e também por meio dos dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) divulgados em setembro de 2020, que o Brasil fechou o ano passado como maior exportador de carne bovina e de soja do mundo. Apesar de tanta produtividade no agronegócio, este modelo de desenvolvimento econômico-capitalista, não tem sido capaz de promover o bem estar social e colocar comida na mesa dos trabalhadores e trabalhadoras, que produzem a riqueza da nação.
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Não existe pais que seja próspero, sustentável, digno e feliz, quando sua população encontra-se privada dos seus direitos humanos fundamentais, sufocada e ameaçada pelo desemprego, doença e fome. Em meio a este cenário, o governo tem falhado em prestar auxilio para os mais necessitados diante das restrições impostas pela pandemia. Segundo a Oxfam, até final de junho do ano passado, “o governo federal distribuiu apenas 10% da ajuda financeira prometida aos trabalhadores e empresas, através do Programa de Apoio Emergencial ao Emprego (PESE), com grandes empresas obtendo mais benefícios do governo do que os trabalhadores ou micro e pequenas empresas”.
Sem políticas efetivas para o combate a pobreza e a desigualdade social, a fome apavora, consome e devora os sonhos, a vida e a dignidade humana de milhares de brasileiros e brasileiras. De acordo com a pesquisa de Análise da Segurança Alimentar no Brasil, divulgada pelo IBGE no dia 17 de novembro de 2020, entre 2017 e 2018 “o equivalente a 25,3 milhões de lares estavam com algum grau de insegurança alimentar: leve (24%, ou dezesseis milhões), moderada (8,1%, ou cinco milhões), grave (4,6%, ou três milhões)”.
Estes números elevadíssimos, indicam uma tendência de aprofundamento do cenário de vulnerabilidade e desigualdade socioeconômica em 2021, devido a inflação do combustível, do gás de cozinha e principalmente dos alimentos, que fechou o ano de 2020 com alta de 4,52%, a maior taxa desde 2016. Além disso o desemprego atinge atualmente 14,4 milhões de pessoas, o que representa o maior índice de crescimento desde 2012, conforme os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, divulgados pelo IBGE no dia 30 de abril de 2021.
Neste cenário o Brasil vem sendo vitimado também pela ineficiência, o descaso e a omissão do governo federal, em relação a pandemia, o que custou mais de 400 mil vidas e o sofrimento de milhares de famílias. Este quadro poderia ter sido evitado, se as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) houvessem sido respeitadas e promovidas presidente da república, como será atestado pela CPI da covid, o que levará (eu acredito) o principal responsável deste genocídio, para o impeachment e possivelmente para a cadeia, por crimes contra a saúde pública e a humanidade.
Porém não há espaço neste limitado artigo, para descrever incontáveis atitudes inumanas e lamentáveis, de um estelionatário eleitoral que chegou a presidência prometendo um país melhor, mas nada tem feito além de disseminar discursos de ódio, mentiras, extremismo políticos, repressão, sofrimento e morte.
Encerro este breve texto, afirmando que apesar do cenário vivenciado atualmente, mantenho viva a convicção de que a transformação da realidade é possível e vem sendo construída, por uma multiplicidade de corações esperançosos que sonham e lutam pelo meio ambiente, por democracia e direitos humanos, fazendo com que a história permaneça incansavelmente seguindo seu curso, porem é preciso sempre estar atento e forte, pois como disse Antônio Gramsci; “o velho mundo está morrendo, o novo tarda em aparecer e nessa meia luz surgem os monstros”. Entre a penumbra e o alvorecer deste mundo novo, vários monstros se apresentam representados pela fome, o desemprego e o fascismo, e por tudo isso, é imprescindível mais do que nunca fortalecer e desenvolver as relações de apoio e solidariedade entre a classe trabalhadora, povos negros e indígenas, estudantes, intelectuais e demais seguimentos populares, precisamos todos dar as mãos, unificar lutas, sonhos e esperanças, para matar a fome por comida, cidadania, emprego, dignidade, liberdade e muito mais.
Poesia da fome
Parado no
trânsito intransitivo
da cidade não tenho nome
nem identidade eu sou a fome
que apavora/consome e devora
Agora já comeu
toda cidadania e não
sobrou nada, quem dirá
alegria, mas ficou a poesia
nesse verso de barriga vazia
E nessa desventura
a vida se transfigura no
labirinto da loucura, eu sou
um faminto que procura matar
a morte, forte como quem come
I n c o n s t
i t u c i o n a l i
s s i m a m e n t e
vou comer a fome
tem gente com fome
tem gente com fome
Vou devorar o produto da
riqueza e me alimentar com o
fruto da pobreza, que salivando
deseja sobreviver pra comer a
a vida de sobre mesa
(Ramon Rafaello)
BIBLIOGRAFIA
IBGE: insegurança alimentar grave atinge 10,3 milhões de brasileiros. Endereço virtual (acessado no dia 06/04/2021): https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2020-09/ibge-inseguranca-alimentar-grave-atinge-103-milhoes-de-brasileiros
Desemprego é de 14,4% e atinge 14,4 milhões, maior número desde 2012.(acessado no dia 25/03/2021): https://economia.uol.com.br/empregos-e-carreiras/noticias/redacao/2021/04/30/desemprego-brasil-pnad-continua-ibge.htm?cmpid=copiaecola
Relatório: Vírus da Fome (Oxfam), disponível no endereço virtual (acessado no dia 25/03/2021) https://www.oxfam.org.br/blog/epicentro-da-fome/
Ramon Rafaello é estudante de antropologia e mestrando do Programa de Pós-Graduação em Estado e Sociedade da Universidade Federal do Sul da Bahia.
A opinião do/a autor/a não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.