No dia 05/11/2020 o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) acolheu um recurso movido pelo Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA/SC), determinando a suspensão dos efeitos da decisão do Juiz Federal Marcelo Krás Borges na Ação Civil Pública n° 5026964-94.2018.4.04.7200 no que diz respeito à suspensão das atividades de elaboração do Plano de Manejo do Parque Estadual do Rio Vermelho (PAERVE). Esse acontecimento é mais um capítulo na história de violação do direito da Comunidade Quilombola Vidal Martins em participar da utilização do seu território, conforme garante a Convenção n° 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em seu art. 15.
É importante destacar que desde o final de outubro servidores do IMA/SC realizam incursões no território da comunidade, antecipando inclusive o acórdão do TRF-4 publicado no dia cinco de novembro, de modo que estavam efetivamente descumprindo a determinação judicial válida à época. Não suficiente, é conhecida a demora do Instituto do Meio Ambiente em realizar o Plano de Manejo, tendo-se iniciado a elaboração apenas sete anos após o prazo disposto no art. 27, §3° da Lei nº 9.885/2000. Tal demora culminou no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado entre o IMA/SC e o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), que obrigou o IMA/SC a elaborar o Plano de Manejo até o dia 31 de agosto de 2020, sob pena de ajuizamento de ação de improbidade administrativa contra o atual Presidente do Instituto.
Ocorre que, a legitimidade da Comunidade dos Remanescentes do Quilombo Vidal Martins sobre o território que se sobrepõe a glebas do PAERVE já está comprovada, sendo matéria inclusive de acordo firmado na mesma ACP que determinou que o INCRA conclua a titulação do território quilombola em 300 dias (prazo que terminará no início de dezembro deste ano). Portanto há verdadeira expectativa de concretização do direito ao território por parte da Comunidade Quilombola Vidal Martins, já tendo sido realizado o laudo antropológico e o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) do Quilombo, conforme os trâmites exigidos no processo administrativo junto ao INCRA.
Não é admissível, portanto, que a comunidade seja excluída da gestão de seu território, o que implica na necessidade de uma participação efetiva na elaboração do Plano de Manejo, ultrapassando os meros convites formais para a participação nas oficinas participativas de elaboração do Plano de Manejo do PAERVE. O manejo do parque deve ter como princípio máximo o respeito à comunidade e ao seu convívio harmônico com o meio ambiente, conforme o entendimento do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) de que não é “possível se discutir conservação da natureza sem levar em consideração a relação entre povos e comunidades tradicionais e a natureza, na medida em que essas relações sociais estabelecidas influenciam nas tomadas de decisão, usos e manejos que se fazem desses mesmos recursos quer sejam em território protegidos para o
uso sustentável quer nos de proteção integral”. Disponível em: https://www.icmbio.gov.br/…/povos-ecomunidades….
Sendo assim, nós, Remanescentes do Quilombo Vidal Martins, manifestamos nosso repúdio frente a esta iniciativa do IMA/SC em dar seguimento à elaboração do Plano de Manejo sem garantir efetivamente a participação da Comunidade. Esta ação representa mais uma das tantas injustiças que enfrentamos desde a escravização de nossos antepassados. Por fim, exigimos que esse processo de elaboração do plano de manejo seja revisto e solicitamos que a Comunidade Quilombola Vidal Martins possa participar do processo de elaboração do Plano de Manejo de forma amistosa, democrática e inclusiva, o que infelizmente não tem ocorrido até o momento. Do contrário, estaremos diante de mais um caso de racismo institucional perpetrado por um órgão do Estado, o que não desejamos que ocorra.
Seguimos em luta!
Nenhum Quilombo a Menos!
Florianópolis/SC, 17 de novembro de 2020.