Gado, carvão, cana e soja estão por trás do desmatamento milionário no Pantanal

Diante das queimadas, Bolsonaro e os ministros Ricardo Salles e Tereza Cristina divulgaram a tese do "boi bombeiro"

Histórico de punições do Ibama por destruição da flora mostra a realidade do “boi desmatador” – “Reprodução Brasil de Fato”

Por Leonardo Fuhrmann.

Com o Pantanal em chamas, o presidente Jair Bolsonaro e seus ministros do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e da Agricultura, Tereza Cristina, apelaram para um herói inusitado: o boi bombeiro. Na teoria, já rejeitada por especialistas, o gado no pasto seria a melhor maneira de combater as queimadas. Só que não há diminuição do gado no Pantanal. O número, na verdade, aumentou. Além disso, o gado intensifica a degradação da vegetação e o assoreamento de nascentes de água.

O perfil das empresas e pessoas físicas que mais destruíram a flora no bioma nos últimos 25 anos, com base na lista de multados pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), sugere a existência de um outro personagem na história: o “boi desmatador”, pois o setor é responsável por uma parte expressiva das maiores multas aplicadas.

De Olho nos Ruralistas contou, ao longo da semana, quais foram os principais multados por desmatamento no Pantanal. Abaixo, segue a lista com os 58 nomes que tiveram, nos últimos 25 anos, autuações acima de R$ 1 milhão. Ela permite que se avance na identificação dos setores que protagonizaram, desde 1995, a destruição do bioma. A siderurgia, a cana-de-açúcar e a soja alinham-se com a pecuária nesse cenário.


Observatório identificou as multas milionárias por desmatamento no Pantanal desde 1995 / De Olho nos Ruralistas

A relação dos grandes infratores do Ibama tem no topo uma empresa voltada para a pecuária, a BRPec, que recebeu uma multa de quase R$ 58 milhões, quase quatro vezes o valor da segunda maior multa. A empresa, que contesta a sanção, é ligada ao BTG Pactual, do banqueiro André Esteves. Na lista total estão outros pecuaristas, produtores de grãos, criadores de cavalos, siderúrgicas e fabricantes de carvão vegetal.

As multas da siderurgia e dos carvoeiros estão intimamente ligadas. Em geral, as empresas compram o carvão em cotas maiores do que as permitidas ou sem comprovação de origem e são punidas em razão de supostamente haver desmatamento em suas cadeias de produção. Nesta lista estão grandes nomes do empresariado nacional, como duas empresas pertencentes à Vale e outra do grupo de Eike Batista.

Famílias tradicionais na região estão entre maiores multados

Esteves não é o único expoente do capitalismo nacional na lista dos pecuaristas acusados de desmatamento. Leo, Clarice e os herdeiros de Fabio Steinbruch são donos de uma agropecuária que está entre os grandes multados. Primos de Benjamin Steinbruch, vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), eles são sócios da Vicunha e da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). A relação inclui ainda ruralistas do interior de São Paulo que investem no Pantanal e outros que já cruzaram a fronteira para o Paraguai e a Bolívia.

Mas a lista traz também latifundiários integrados à vida nas cidades que compõem o Pantanal. Renato Alves Ribeiro, morto no ano passado, aos 101 anos, recebeu uma multa de R$ 13.970.000 em 2016, em Aquidauana (MS). Neto de um dos fundadores do município, ele era dono da fazenda centenária Taboco e tio do atual prefeito, Odilon Ribeiro (PSDB). Silvio Eduardo Burano recebeu um multa de R$ 6.699.000 em 2012, em Porto Murtinho, e outra no ano seguinte em nome da Agropecuária Santa Marina, da qual é proprietário, de R$ 6.560.000,00.

Além da Agropecuária Santana, Geraldo Albaneze, multado em R$ 6.000.000 em 2001, em Corumbá, é presidente do Instituto Alma Pantaneira. Multado no mesmo ano em R$ 5.000.000 em Bodoquena, (MS), Adir Goulart Acosta recebeu o título de cidadão benemérito de Miranda (MS). Pecuarista premiado no Giro do Boi, da JBS, em 2016, Adilson Juliani Gelain recebeu uma multa de R$ 2.502.500 em 2018, em Corumbá, onde é dono da Fazenda Chão Preto.

Cartola, usineiro e sojeiro também foram autuados

Presidente do Aquidauanense Futebol Clube, João Garcia Ferreira recebeu uma multa de R$ 2.000.000 por desmatamento no município em 2001. O time foi vice-campeão estadual neste ano e em 2019 e disputou a fase preliminar da série D do Brasileirão. Em 2018, estava na segunda divisão estadual. O clube começou como uma escolinha de futebol em 2001.

Morto em um acidente de carro em 2016, o usineiro Luiz Guilherme Zancaner recebeu uma multa de R$ 2.597.050 em Rio Verde de Mato Grosso (MS), em 2011. Ele era presidente do Grupo Unialco e dirigiu a União dos Produtores de Bioenergia (Udop) entre 1997 e 2006. Sua empresa, que enfrentou um processo de recuperação judicial, também era dona da usina Alcovale, em Aparecida do Taboado (MS).

A trajetória do produtor de soja Gabriel Introvini foi tema episódio do DuPont Colheita Farta, programa da marca apresentado no Canal Rural. Gaúcho, ele deixou seu estado para produzir no Mato Grosso do Sul. Ele recebeu uma multa de R$ 1.498.100 em Coxim (MS), por desmatamento, em abril de 2006. No mês seguinte, uma operação conjunta do Ministério Público e da Polícia Militar, a mais de 2 mil quilômetros de distância, impediu o desmatamento de uma área de 512 quilômetros em Buriti (MA), na Fazenda São Bernardo, também pertencente a Introvini.

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