Por Catarina Barbosa.
O desmatamento na Amazônia aumentou 29,54% entre agosto de 2018 a julho de 2019, quando comparado com o mesmo período do ano anterior, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Mas quem são as pessoas que devastam a floresta? Segundo a procuradora do Ministério Público Federal e integrante da Força-tarefa Amazônia, Ana Carolina Bragança, há uma mecânica muito bem estabelecida para devastar a floresta, que começa com a extração ilegal da madeira, seguida da grilagem e depois da pecuária.
A Força-tarefa Amazônia promove ações de combate ao desmatamento no Amazonas, Rondônia e no Pará, sendo que, neste último, o foco é a mineração ilegal de ouro. No dia 17 de junho, uma outra Força-Tarefa em Defesa da Amazônia da AGU (Advocacia-Geral da União) conseguiu bloquear mais de R$ 302 milhões em bens de desmatadores da Floresta Amazônica no Mato Grosso e no Pará.
A procuradora da República, Ana Carolina Bragança esclarece que há uma série de ações de combate ao desmatamento e que a realizada pela AGU foi no sentido de autuações por meio multas, bloqueios de bens e procedimentos instituídos pela própria AGU. Já a Força-Tarefa Amazônia tem como área alvo, a Tríplice Fronteira entre Acre, Rondônia e o Sul do Amazonas, mas de estratégias de enfrentamento à criminalidade ambiental organizada e também aplicação de medidas cíveis quando necessário. Além do combate à criminalidade, a Força-Tarefa também atua na promoção de direitos de comunidades tradicionais afetadas pela ações ilegais.
“Eu acho importante destacar é que existe sim, senão um perfil, um modus operandi, relacionado ao desmatamento. O desmatamento, normalmente, se inicia com a coleta e exploração de madeira de valor em uma determinada área. Essa área pode inclusive, ser uma unidade de conservação ou uma terra indígena, ou terra pública não destinada mesmo. Após a retirada de toda a madeira de valor vem em um segundo momento: o desmatamento a corte raso, normalmente, visando a formação de pastos para a pecuária extensiva”, explica Bragança.
A procuradora explica que são dois momentos de exploração ilegal da floresta: o primeiro em que atuam os madeireiros ilegais e segundo em que atuam os grileiros, que abrem o caminho para expansão da fronteira agropecuária.
“Os padrões de desmatamento que a gente vem observando nessa nossa área alvo que mencionei é o padrão de desmatamento primeiro do corte seletivo e depois do desmatamento com a abertura de áreas pecuárias. Também é um desmatamento muito ligado à áreas produtivas que já existem.”
Ela cita exemplos acompanhados pelo MPF de grileiros que estão migrando do norte de Porto Velho, em Rondônia, para o município Lábrea, no sul do Amazonas. O mesmo acontece que grileiros do Acre que estão migrando para Boca do Acre, município do sul do Amazonas. Logo, o grileiro, o desmatador da Amazônia que abre área para a pecuária são pessoas ligadas à atividade econômica, que expandem seus negócios por meio da devastação.
Segundo a procuradora da república, Ana Carolina Bragança os empresários envolvidos na exploração ilegal são majoritariamente brasileiros e o observado na área de atuação da Força-Tarefa se repete em toda a Amazônia e o desafio é, justamente, identificar onde as ilegalidades são praticadas.
Como exemplo de combate, ela cita o Carne Legal, que há 10 anos cobra dos frigoríficos a origem das carnes que eles adquiriram para que se assegure que não foi de área desmatada e caso seja identificada, eles podem ser responsabilizados.
A Amazônia dentro da Amazônia
Uma das muitas críticas relacionadas à elaboração de políticas públicas no país é o desconhecimento da real situação das populações envolvidas. Para as pessoas que vivem na Amazônia o caso é o mesmo. Carentes de emprego, renda e assistência social, os moradores dos municípios encontram no trabalho ilegal uma forma de sobreviver.
A procuradora da República explica que os desmatadores conhecem as fragilidades da população e fazem uso dela para manter as atividades ilegais, sendo que cada região possui vários desmatadores e isso exige uma política diferenciada já que o crime é fragmentado, apesar dos danos serem compartilhados.
“É importante colocar que diferente de uma estrutura de crime organizado piramidal, típico das organizações criminosas muito conhecidas como, por exemplo, o PCC, a criminalidade ambiental, embora organizada, é muito horizontalizada, o que implica dizer que os núcleos criminosos não são os mesmos na Amazônia inteira, eles são regionalizados e os criminosos atuam em diferentes atuando municípios”, diz.
Perfil: Extração de madeira -> grilagem -> pecuária
Rômulo Batista, da Campanha de Amazônia do Greenpeace reforça a complexidade do problema: desmatamento. Na análise dele, a solução para a questão não é única.
“A gente tem que se espelhar no que aconteceu no passado. Entre 2004 e 2012 houve uma queda muito grande do desmatamento. O que ocorreu de diferente nessa época? A gente teve a valorização do Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (INPE) e o lançamento de projetos de detecção de desmatamento em tempo real, que era utilizado para fiscalização do IBAMA e a gente teve um aumento também de operações de inteligência, onde se buscava não só o desmatador que era o autor do desmatamento, mas também quem tava por trás, e quem mandava fazer esse desmatamento.”
“Teve-se ainda a criação de Unidades de Conservação e Terras Indígenas, que são – e já foi comprovado pela ciência que é a maneira mais efetiva de parar a fronteira do desmatamento”, diz Batista.
Contudo, o coordenador afirma que desde a posse do presidente Jair Bolsonaro o que se vê é uma diminuição de repasse aos órgãos de fiscalização e controle: ICMBIO (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) e IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais), além da desvalorização da ciência.
“A gente vê que pessoas que estavam, por exemplo, em Terras Indígenas, destruindo garimpos ilegais foram exoneradas do cargo de coordenação dentro do órgão e mais recentemente vimos uma tentativa declarada abertamente pelo Ministro do Meio Ambiente, de passar a boiada, de dar de baciada a desregulamentação ambiental no Brasil. Então, acho que o primeiro e mais importante é a gente ver cada vez mais a mobilização popular ao entorno desse tema”, diz ele.
Edição: Rodrigo Durão Coelho.
Fonte: Brasil de Fato.