O ministro Celso de Mello, decano do STF (Supremo Tribunal Federal), decidiu nesta 6ª feira (22.mai.2020), tirar o sigilo da gravação da reunião ministerial de 22 de abril. O material foi apontado pelo ex-ministro Sergio Moro como prova de que o presidente Jair Bolsonaro tentou interferir na autonomia da PF (Polícia Federal).
Em diversos trechos da gravação, o mandatário e seus ministros disparam termos de baixo calão contra entidades e políticos. Foram ao menos 43 palavrões e xingamentos, conforme transcrição da transcrição da reunião, feita pela PF. Eis também a íntegra (22 MB). Leia mais abaixo a relação dos termos de baixo calão utilizados.
Sobre o jornal Folha de S.Paulo, Bolsonaro diz que prefere “não ter informação do que ser desinformado”. “Aí a bosta da Folha de São Paulo, diz que meu irmão foi expulso de 1 açougue em Registro, que tava comprando carne sem máscara. Comprovou no papel, tava em São Paulo esse dia. O dono do restaurante… Do açougue falou que ele não estava lá. E fica por isso mesmo. Eu sei que é problema dele, né? Mas é a putaria o tempo todo para me atingir, mexendo com a minha família”, diz.
O presidente também usou palavrões ao afirmar que, de olho em proteger a privacidade, tentou diversas vezes efetuar mudanças na composição de sua equipe de segurança oficial no Rio de Janeiro.
“Não consegui! Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meus, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence à estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira”, dispara.
Em outro momento, Bolsonaro ataca os governadores do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), e de São Paulo, João Doria (PSDB). “O que esses caras fizeram com o vírus, esse bosta desse governador de São Paulo, esse estrume do Rio de Janeiro, entre outros… É exatamente isso. Aproveitaram-se do vírus. Tá 1 bosta de 1 prefeito lá de Manaus agora, abrindo covas coletivas. Um bosta.”
GUERRA CIVIL
Aos ministros Abraham Weintraub (Educação), Fernando Azevedo (Defesa), e ao então ministro Sergio Moro (Justiça), o presidente tece críticas a movimentos desarmamentistas e a governos que optaram por seguir medidas de contenção ao novo coronavírus: “O que esses filhos de uma égua querem, Weintraub? É a nossa liberdade”, diz Bolsonaro. “Olha como é fácil impor uma ditadura no Brasil. Como é fácil… O povo está dentro de casa. Por isso que eu quero, ministro da Justiça e ministro da Defesa, que o povo se arme!”, diz.
“É a garantia que não vai ter 1 filho da puta aparecer para impor uma ditadura aqui! Que é fácil impor uma ditadura! Facílimo… Um bosta de 1 prefeito faz uma bosta de 1 decreto, e deixa todo mundo dentro de casa”, continua o presidente.
Em seguida, Bolsonaro se posiciona favoravelmente, ao que tudo indica, a uma revolta civil contra governadores que não têm se alinhado com o governo. “Se (o povo) tivesse armado, ia pra rua. E se eu fosse ditador, né? Eu queria desarmar a população, como todos fizeram no passado, antes de impor a sua respectiva ditadura. Eu peço ao Fernando e ao Moro que, por favor, assinem essa portaria hoje e que eu quero dar 1 puta de 1 recado para esses bosta! Por que que eu tô armando o povo? Porque eu não quero uma ditadura! E não dá pra segurar mais! Não é? Não dá pra segurar mais”, conclui.
“Tem que falar, pô! Vai ficar quieto até quando? Tem que falar, botar pra fora, esculachar! Não pode botar algema! Decisão do próprio Supremo. E vamos ficar quieto até quando? Fica humilhando nosso povo, por quê?”, diz noutro momento.
GOVERNABILIDADE
O mandatário diz ainda que se importa em governar especialmente para aqueles que o elegeram. Afirma, porém, que não espera ganhar as próximas eleições à Presidência: “O pessoal fica apontando pra mim, ‘Votei em você pra você fazer alguma coisa!’, ‘Votei em você pra você tomar decisões, pra você brigar!’… E é verdade. Eu tô me lixando com a reeleição. Eu quero mais que alguém seja eleito, se eu vier (me tornar) candidato, tá? Pra eu ter… Eu quero ter paz no Brasil, mais nada”, comenta.
Em outro trecho, o presidente sugere que, em caso de eleição de partidos de esquerda em eleições futuras, ele e seus aliados precisariam sair do Brasil, sob risco de perseguição. “Eu e uma porrada de vocês aqui vamos ter que sair do Brasil. E eu tenho certeza que vão me condenar por homofobia, 8 anos (de prisão) por homofobia. Daí inventam 1 racismo, como inventaram agora pro Weintraub. Desculpa, desculpa o desabafo. Puta que pariu! O Weintraub pode ter falado a maior merda do mundo, mas racista? Vamos ter que reagir pessoal, é outra briga”, diz.
TROCAS MINISTERIAIS
De acordo com a transcrição da reunião feita pela PF, Bolsonaro faz referência às constantes trocas ministeriais que havia feito até 21 de maio. “Vai pra puta que o pariu, porra! Eu que escalei o time, porra! Trocamos 5. Espero trocar mais ninguém! Espero! Mas nós temos que, na linha do Weintraub, de forma mais educada 1 pouquinho, né? É de se preocupar com isso. Que os caras querem a nossa hemorroida! É a nossa liberdade! Isso é uma verdade”, diz.
O vídeo faz parte de inquérito autorizado por Celso de Mello a pedido da PGR (Procuradoria Geral da República) para apurar a acusação feita por Sergio Moro ao deixar o Ministério da Justiça e Segurança Pública, no fim de abril. As investigações apuram se o presidente agiu para tentar evitar que familiares e amigos fossem investigados.
O pivô para a crise foi a exoneração do então diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, nome de confiança de Moro, em 24 de abril. Poucas horas depois de publicação no Diário Oficial, o ministro deixou o cargo, acusando Bolsonaro de tentar interferir na corporação.
Os termos usados na reunião:
Jair Bolsonaro, presidente1 “veio pra minha retaguarda”;
1 “querem é a nossa hemorroida”;
1 “fodido”;
1 “foda-se”;
5 “merda”;
7 “bosta”;
8 “porra”;
2 “foder”;
4 “putaria”;
2 “puta que o pariu”;
2 “filho da puta”;
1 “cacete”.
Paulo Guedes, ministro da Economia3 “porra”;
3 “foder”.
Pedro Guimarães, presidente da Caixa Econômica1 “porra”
Braga Netto, ministro-chefe da Casa Civil1 “caralho”