Conselho teme efeitos sociais da pandemia entre os jovens

Preocupação é maior com os mais vulneráveis, afetados pelo desemprego

Participantes chegam ao centro de educação de jJovens e adultos, para o segundo dia de aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ocorre neste domingo (10) à tarde, em todo o país
foto: Antonio Cruz

Por Alex Rodrigues.

Responsáveis por sugerir políticas públicas que ajudem a promover o bem-estar e os direitos de quem tem entre 15 e 29 anos de idade, membros do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve) estão preocupados com os impactos da pandemia do novo coronavírus (covid-19) entre os jovens. A preocupação ocorre, principalmente, com a parcela mais vulnerável, afetada pelo desemprego e por outros problemas antes mesmo do surgimento da doença e das suas consequências econômicas.

“Basta vermos as dificuldades que os jovens já enfrentavam para sabermos que, a médio e longo prazo, quando superarmos a pandemia, os mais prejudicados serão eles. Principalmente os que não tiverem capacitação técnica, instrução ou experiência. Esses vão ter mais dificuldade de acessar os postos de trabalho”, disse o presidente do Conjuve, Rafael Davi Campos, à Agência Brasil.

Representante do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos no conselho, o advogado com pós-graduação em gestão pública defende que, embora a prioridade, neste momento, seja evitar que a doença se espalhe e proteger a população indistintamente, é necessário pensar adiante e providenciar meios de proteger os grupos mais suscetíveis aos desdobramentos da pandemia.

“É papel do Conjuve destacar a importância de não olharmos apenas para o presente, de nos anteciparmos e pensarmos no futuro. Nesse sentido, é preciso um olhar atento às políticas públicas voltadas para a juventude, pois muitos jovens são pais de família, sustentam suas casas, ajudam seus pais, e certamente enfrentarão grandes dificuldades”, acrescentou Campos.

Devidos aos efeitos da pandemia, o Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta que, este ano, o Produto Interno Bruto (PIB), ou seja, a soma de todos os bens e serviços produzidos no Brasil, cairá 5,3%. Já a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que, além de mortes, a covid-19 pode causar o fechamento de 195 milhões de postos de trabalho em tempo integral, em todo o mundo. Só na América Latina e no Caribe, a crise pode custar 14 milhões de vagas de trabalho. Para o diretor regional da OIT, Vinícius Pinheiro, os impactos da covid-19 sobre a economia vão exigir “verdadeira reconstrução dos mercados de trabalho”.

Empreendedorismo

Representante da Confederação Brasileira de Empresas Juniores (Brasil Júnior) no Conjuve, o engenheiro Renan Nishimoto acredita que, uma vez vencido o vírus, a “reconstrução” de que Pinheiro fala vai exigir que muitos jovens criem seus próprios postos de trabalho. Para isso, vão precisar de capacitação e estímulos.

“A tendência é que o desemprego entre a juventude se agrave. Com muitos jovens recém-formados e outros tantos sem estudos e sem experiência profissional, disputando vagas de trabalho com pessoas mais qualificadas, o país estará diante de dois caminhos: ou vai ter que criar mecanismos para incentivar a contratação dessa parcela da população, ou vai tentar estimular os jovens a empreender”, disse Nishimoto, às vésperas de a Câmara dos Deputados aprovar, na madrugada dessa quarta-feira (15), a Medida Provisória 905/19, que cria o contrato de trabalho Verde e Amarelo.

O contrato prevê, entre outras coisas, a redução de encargos para quem oferecer a oportunidade do primeiro emprego a jovens de 18 a 29 anos, com remuneração de até um salário mínimo e meio (R$ 1.567,50). O texto ainda vai ser analisado pelo Senado antes de seguir para sanção presidencial, mas há o risco de a MP perder a validade se não entrar em vigor até o próximo dia 20. Em votação eletrônica no portal e-Cidadania, do Senado, 60.075 pessoas votaram contra a proposta e 2.865 a favor da instituição do contrato de trabalho.

“Acreditamos que não adiantará criar novas obrigações para um setor produtivo em maus lençóis. Por isso estamos elaborando uma campanha para estimular os jovens a empreender. Queremos ajudá-los, fornecendo informação para que, depois, eles possam ter autonomia”, comentou Nishimoto, que já presidia a Comissão de Inclusão Produtiva do Conjuve.

Cumprindo outra de suas atribuições, o Conselho Nacional da Juventude vem fazendo parcerias com organizações sociais, cujas iniciativas podem ajudar os jovens a se preparar para a crise. Um acordo de cooperação assinado com o Centro Integrado de Estudos e Programas de Desenvolvimento Sustentável (CIEDS), por exemplo, possibilitará que mentores voluntários forneçam dicas e ajudem gratuitamente a micro e pequenos empresários a lidar com as dificuldades.

“Por mais que estejamos falando de pequenos negócios, sabemos que empreender não é uma opção para toda a juventude, assim como não será para todas as outras pessoas. Por isso, também estamos discutindo recomendações mais gerais, que contemplam as necessidades básicas das pessoas. Porque sabemos que, antes de pensar em estudar, muita gente está tentando conseguir o que comer no dia seguinte. Mas é preciso reforçar que, de alguma forma, em breve, vamos ter que criar novos postos de trabalho. Por isso, estamos apostando na vertente da capacitação para o empreendedorismo, que é algo que já existe, inclusive nas comunidades mais carentes e que, muitas vezes, não consegue ultrapassar o nível da informalidade e gerar mais renda para a própria comunidade, justamente porque faltam conhecimentos básicos aos responsáveis”, enfatizou Nishimoto.

A capacitação dos jovens, de forma mais ampla, e a manutenção dos postos de trabalho já ocupados por jovens são preocupações do representante da União Nacional dos Estudantes (UNE) no Conjuve, Luis Filipe Eich. Segundo ele, a entidade estudantil propõe que contratos de estágio perto do encerramento sejam prorrogados.

“Se um contrato de estágio vence agora, no meio deste período, o estagiário ficará desamparado, sem renda, pois ninguém mais está contratando”, argumentou Eich, reforçando a necessidade de o Poder Público pensar, desde já, em ações para proteger a juventude.

“Já há alguns anos, sabemos que, em crises econômicas, os jovens são mais atingidos. Principalmente no aspecto de trabalho e renda. Com menos vagas de emprego, a juventude é jogada ou para o desemprego, ou para a informalidade e o trabalho precário. Isso só pode ser superado com investimentos em educação, no seu sentido mais amplo, em capacitação técnica, e com vontade política para garantir que as vagas para a juventude sejam dignas”, acrescentou.

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