Detento com covid-19 cumprirá prisão domiciliar no Pará; Defensoria pede testagem

O caso foi confirmado na noite desta quarta-feira (8) pelo governo estadual; OAB aponta omissão do STF

A população carcerária do Pará ultrapassa os 20 mil detentos – Akira Onuma/SEAP

Por Catarina Barbosa.

Na noite desta quarta-feira (8), o estado do Pará anunciou que subiu para 165 o número de casos de coronavírus confirmados no estado. Entre eles, um homem que cumpre o regime semiaberto no Centro de Progressão Penitenciário, no bairro de Val de Cans, em Belém. Em decorrência da infecção, a Vara de Execução Penal concedeu prisão domiciliar com monitoramento para o detento, com estado de saúde estável.

De acordo com o defensor público Vladimir Koenig, o caso foi confirmado pela Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) do Pará na noite da última terça-feira (7). Durante uma reunião interinstitucional realizada nesta quarta-feira (8), além da necessidade de isolar o paciente, foi reforçada a importância de que o detento possa cumprir o restante da sua pena em prisão domiciliar.

A defensoria pediu ainda que todas as pessoas que tiveram contato com ele, sejam servidores ou outros detentos, sejam testados para a covid-19.

“A preocupação da defensoria é muito grande, por conta desse primeiro caso, já que o Pará tem uma superpopulação carcerária. Nós temos mais gente presa do que o sistema tem vagas e isso gera uma impossibilidade de um distanciamento de forma a impedir que um preso transmita para o outro e inclusive para os servidores públicos que trabalham no sistema prisional”, explica.

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O defensor ressalta a preocupação com a estrutura do sistema prisional que naturalmente é um local de grande propagação de diversas doenças e pode sobrecarregar o sistema de saúde caso o coronavírus se dissemine nesse ambiente.

“Tem um risco muito grande de uma disseminação no sistema prisional, o que causaria a necessidade do uso de leitos no sistema de saúde pública, que já é deficitário, ainda mais se a gente imaginar que as pessoas fora do sistema prisional também precisam de leitos”, diz.

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Tragédia anunciada

A presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PA), Juliana Fonteles, afirma que desde a chegada do coronavírus no Pará está dialogando com o Ministério Público Federal do Pará (MPFPA), a Defensoria Pública da União e o Mecanismo Nacional de Combate e Prevenção à Tortura e a Frente pelo Desencarceramento, mas que o caso já era esperado.

“Isso já é uma tragédia anunciada a nível nacional. A gente está extremamente preocupado, porque a sociedade precisa entender nesse momento que isso é um desafio muito grande. A vida do preso, ela vale tanto quanto a vida de qualquer pessoa que está aqui fora. E não adianta apenas tomar medidas preventivas nesse momento de drama do coronavírus para sociedade aqui fora, porque existem vários atores que estão em uma cadeia que envolve as unidades prisionais”, destaca.

Questão humanitária

O isolamento do preso infectado  deve ser tratado como questão humanitária de acordo com as recomendações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em relação ao tratamento de detentos que contraíram a covid-19, explica Fonteles. A presidente da OAB-PA afirma, no entanto, que o Supremo Tribunal Federal (STF) se omitiu de garantir a proteção da vida dessa população durante a pandemia.

“O STF  poderia nesse momento ter dado um grande exemplo de humanidade para a nação, porque foi feito um pedido ao STF para que os presos que estão no grupo de risco tivessem direito à prisão domiciliar, só que o STF não deferiu, houve apenas uma recomendação de um ministro”, lamenta.

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A população carcerária do Pará ultrapassa 20 mil detentos. Na unidade prisional em que foi confirmado o paciente com a covid-19 há 135 presos de um total de 150 vagas. Por estarem em regime semi aberto, os detentos trabalham e estudam. Apesar de a unidade estar abaixo de sua capacidade total de presos, Koenig afirma que isso não torna o caso menos grave.

“A casa penal, independentemente da quantidade de pessoas que estão presas, representa um potencial grande [de contágio], porque os presos têm contato com servidores públicos que podem levar para fora do ambiente carcerário a contaminação. Familiares também, porque são pessoas que poderiam estar com trabalho externo e ter tido algum contato com outras famílias. Mesmo que não seja uma casa penal das maiores, é importante que se monitore com muita precisão as pessoas que tiveram contato e que se possa fazer alguma contenção se for necessário”, ressalta.

A Seap e a Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa) criaram uma série de protocolos para a prevenção da covid-19 nos presídios do estado, mas o defensor público ressalta a dificuldade em colocar as medidas de prevenção em prática em uma realidade em que a maioria dos presídios está superlotada e sem condições estruturais básicas para detentos e trabalhadores.

“Além delas, historicamente, não estarem estruturadas como diz a lei, são poucas as unidades prisionais que não estão com superlotação. Então, o protocolo, ele pode ser muito bem pensado e pode ser muito eficiente no plano das ideias, mas quando a gente leva isso para uma realidade que é de superlotação, de carência material em todos os sentidos, de EPI, de insalubridade, de ventilação das celas, de acesso à luz natural, de impossibilidade de higienização das mãos, pequena quantidade de servidores públicos para tomar conta dessas unidade e superlotação, o que obriga as pessoas a estar muito próximas uma das outras, quando a gente pensa nesse cenário fica muito difícil que um protocolo muito bem pensado tenha um resultado esperado, porque a realidade vai confrontar”, afirma.

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