Por Guigo Ribeiro, para Desacato.info.
Pelas 11 horas, despertava na alegria do sono de dever realizado. O sucesso dava-se, em sua concepção, ao bater o ponto e ter a certeza de ter produzido acima do que pedia o patrão. Então, levantava e uma linda mesa de café da manhã preparada pela esposa Rosa o aguardava. Frutas, pães, café quente e o jornal. Porque um homem que não se informa, se conforma, dizia. Após a tardia primeira refeição, gostava de caminhar pelo bairro e ver o dia. Notava o crescimento das árvores, das crianças. Abraçava os mais velhos. Querido, recebia o carinho e seguia para a casa do pai, morador próximo, o que possibilidade momentos frequentes juntos para trocas de notícias, resultados do futebol e ouvir insistentemente sobre quando chegaria o primeiro neto. Dada a atenção, retornava para a casa, beijo carinhoso em Rosa e malinha preparada pelas mãos da mesma com os itens necessários para seu momento de próprio cuidado do dia: aulas de natação.
À tarde, ainda com o cloro no corpo, passava na paróquia próxima ao seu lar para um abraço em Valdir, líder da estrutura celestial, e suas orações. Por vezes, ofertava significativas contribuições em dinheiro para a manutenção do espaço de fé. Isso feito, chegava em casa para o momento das juras de amor eterno à companheira, namoros no sofá e projeções de viagens nas férias. Apesar da não previsão visto o excesso de trabalho, a poupança para tal era como domingo para a missa: sagrada. Nus no após, sonhavam com um mundo melhor para os futuros filhos, filhos estes brincando em uma sociedade mais justa, digna e menos violenta. Rosa o abraçava como último abraço antes de uma longa viagem. Ele, ria o amor e contava estrelas imaginárias em céu azul. Almoçavam pelas 16 horas e Rosa, enfim, matava a fome pela espera da presença do companheiro na mesa tão farta quanto no café da manhã. Arroz, feijão, carnes e saladas. Sucos naturais e um café forte para o após. Além, papos soltos, tarefas de casa e o momento de colocar, como dizia rindo, o bloco na rua.
À noite, tomava um longo banho ao som do rádio. Se perfumava com o melhor perfume e conferia o efeito da navalha no rosto. Êxito, entrava nas roupas cuidadosamente passadas e se olhava no espelho em orgulho e honra. O batente era até pouco antes do sol chegar. Na sala, o altar, a prece, proteção e o agradecimento pela dádiva de estar em pé e trabalhar. Pedia saúde e justiça, não sem antes mentalizar uma linda noite estrelada de trabalho. Assim, saia rumo ao seu carro tão perfumado quanto seu corpo e ia bater o ponto. Na entrada, sorrisos e abraços cordiais para cada ser presente acompanhado da sincera preocupação ao questionar se tudo bem. Cruzava o corredor e abraçava com carinho seu superior, o agradecendo mentalmente pela oportunidade e fazendo uma promessa: daria sempre o melhor! Cruzava um longo corredor para pegar suas coisas e aproveitava o caminho. Na volta, igual. Entrava no turno, pedia licença para os demais presentes e pegava no batente. Alicates para tirar unhas inteiras, cigarros apagados em rostos, socos, tapas e chutes com o máximo de força possível (por isso, dizia, não comia sem feijão) e facas para marcas corpos e, se com sorte, lembrar do momento para sempre. Não manuseava bichos por considerar que os protótipos de Che Guevara não tinham dignidade para estar em contato com animais. Quando óbito, ria pelo extermínio de mais um inimigo. Quando com tempo vago, acompanhava o motorista até Perus para o despejo do corpo. Era muito esforçado, diziam os mais próximos. Assim também se considerava.
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