Em tempos de escola alienante a aula de história é na Sapucaí

Laranjal, batedores de panela vestidos de gado, um presidente Bozo fazendo arminha, as fake News, um excrementíssimo presidente fazendo flexões no carro alegórico, um Cristo vivo em múltiplos corpos invisíveis socialmente

Por Maria Frô

Imagem: O “Jesus da gente”, da Mangueira, e Marcelo Adnet como Bolsonaro, na São Clemente (Montagem). Reprodução/ Revista Fórum

A Tuiuti há dois anos arrasou na Sapucaí contando toda a narrativa do golpe. Nos atuais governos neopentecostais fundamentalistas de Bolsonaro/Crivella, em que as escolas de samba perderam financiamento público como forma autoritária de silenciamento, elas ficaram ainda mais independentes e críticas.

Foram raras as escolas de samba que não fizeram crítica social este ano. Seguindo uma tradição que em tempos de golpe, censura, autoritarismo a arte tem obrigação de fazer refletir, as escolas de samba ensinaram ao povo brasileiro, muito além do samba: na Sapucaí podemos ver um Brasil nu e cru, furando a mediação narrativa da Globo.

A Mangueira depois de denunciar em 2019 os horrores da ditadura militar, neste ano traz um Cristo negro cravejado de balas, um cristo morador de rua, um cristo mulher, um Cristo da gente que o samba canta. Um Cristo que ao contrário do presidente amigo das milícias é amigo do povo, é o povo.

Um Cristo não eurocêntrico que, mesmo nascendo nazareno moreno, ganhou olhos azuis e cabelos louros nas representações medievais e renascentistas. Um Cristo que denuncia o genocídio da juventude negra, um calvário bem conhecido das mães das periferias das grandes cidades.

Um Cristo invisível como são os moradores de rua, um Cristo mulher onde a rainha da bateria sem plumas não samba e traz seu corpo vestido, torturado com a coroa de espinhos, personificando o país do feminicídio.

Nas redes sociais a direita fundamentalista caricata se revolta com o desfile da Mangueira. A escola foi acusada de defender bandidos. A ignorância histórica dos bolsominions fundamentalistas não percebe que Cristo foi crucificado.

A crucificação romana era uma pena aplicada aos ladrões. A Cruz era símbolo de tortura de ladrões. Na Antiguidade, o símbolo dos primeiros cristãos era o peixe e não a cruz. Foi apenas quando o cristianismo se institucionalizou que o símbolo da cruz foi ressignificado.

Portanto, nada mais fiel ao Cristianismo do que a representação da Mangueira com seu Jesus jovem, negro, cravejado de balas.

Jesus foi tratado pelo poder como um ladrão, assim como a imensa maioria dos jovens negros assassinados pela polícia sem ficha criminal, sem antecedentes é tratada pelo racismo institucional e estrutural deste país de longa tradição escravagista.

São Clemente mata a cobra e mostra o pau
Com o enredo intitulado O Conto do Vigário, a São Clemente desvela o conto, os vigários e vigaristas da malandragem histórica da política brasileira: No mercado da fé, ganha mais quem vender mais promessas e é um mercado democrático do óleo milagroso ao amor de volta em três dias.

A proposta da escola foi trazer para avenida uma grande charge da vigarice, arrolando ao longo do tempo alguns contos do vigário históricos: venda de terreno na lua para ser vizinho de São Jorge ou a venda de terreno no céu, compre baratinho seu pedaço de chão no paraíso.

Não faltou a grávida de Taubaté, o caçador de marajás, os laranjas, a fábrica de fake News entre outras tantas vigarices, pois o Brasil não é um país para amadores.

Na alegoria “Malandro oficial”, Marcelo Adnet faz flexões como Bolsonaro sobre um carro alegórico. Adnet também é um dos autores do samba da São Clemente deste ano. A dama perfeita, porque todo político malandro tem uma esposa “perfeita” e o Redescobridor, representando Cabral e os ex-governadores que passaram por Bangu cheio de privilégios também no presídio.

Mas, a novidade neste carro é o Super Juiz, talvez o maior dos vigaristas desde os tempos coloniais. Os super juízes inflados pela mídia viram bonecos infláveis, heróis do combate à corrupção , mas que entregam nossas riquezas ao capital internacional.

Para completar a alegoria, as laranjetes e o gado cego diante das vigarices do candidato que elegeu.

A máquina de propaganda de mentiras
No último carro, a São Clemente traz a alegoria da fábrica de fake News onde a vigarice ganha a era digital em tempo real e em velocidade astronômica. A alegoria representa a propagação de mentiras nas plataformas virtuais como instrumento para influenciar as decisões políticas das massas. “Brasil, compartilhou, viralizou nem viu! E o país inteiro assim sambou, “caiu na fake News”.

O malandro oficial se atualiza, viraliza, cai na rede, vende gato por lebre. Não poderia faltar neste carro as milícias digitais, aquelas que operam a grande fábrica de fake News, abastecendo o mercado da rede com suas mentiras.

Em tempos de imbecilização geral da nação, de escola sem partido, sem verbas e sem liberdade de cátedra a Sapucaí é pós graduação em história do Brasil.

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