Direitos indígenas na Constituição não podem ser alterados, aponta análise jurídica do Cimi sobre PECs 187 e 343

Nota técnica da Assessoria Jurídica do Cimi aponta que direitos constitucionais indígenas são cláusulas pétreas e PECs 343 e 187 são inconstitucionais

Foto: Fábio Nascimento/MNI
Por Assessoria de Comunicação do CIMI.

Em nota técnica sobre as Propostas de Emenda à Constituição (PECs) 187/2016 e 343/2017, a Assessoria Jurídica do Conselho Indigenista Missionário – Cimi avalia que ambas as proposições são inconstitucionais, por atingirem cláusulas pétreas da Constituição Federal e por pretender alterar diretos humanos protegidos pela legislação internacional, a exemplo da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

As PECs, que tramitam conjuntamente na Câmara dos Deputados, pretendem alterar os direitos reconhecidos aos povos indígenas nos artigos 231 e 232 da Constituição Federal de 1988. A análise aponta que tais artigos tratam de direitos e garantias individuais e coletivas e são, portanto, cláusulas pétreas, “resguardadas pela imutabilidade constitucional”.

“Todos os elementos do direito indígena que conformam o Capítulo VIII da CF/88, do Título VIII, são direitos individuais indígenas, em certo plano; mas, vão muito além, diante da cosmovisão, por serem direitos indisponíveis manejados no plano da coletividade, considerando a relação multicultural e pluriétnica das gentes indígenas”, afirma a nota técnica.

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“A apropriação das riquezas naturais por terceiros, particulares, existentes em território indígena, é eminentemente inconstitucional”

Propostas inconstitucionais

A nota da Assessoria Jurídica do Cimi analisa ponto a ponto cada uma das propostas que tramitam na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados.

A PEC 343/2017, de autoria do deputado Nelson Padovani (PSDB-PR), é considerada mais danosa das duas e apontada como inconstitucional porque, além da tentativa de alterar as cláusulas pétreas dos artigos 231 e 232, afronta a autonomia dos povos indígenas, ao prever a cessão de terras demarcadas para a exploração por não índios e a abrir caminho para a exploração de recursos hídricos e minerais sem autorização do Congresso Nacional.

“O usufruto das terras indígenas é exclusivo”, afirma a nota. “A apropriação das riquezas naturais por terceiros, particulares, existentes em território indígena, é eminentemente inconstitucional”.

“Permitir que a Funai exerça a tutela indígena é fazer retroceder o direito humano do índio em 30 anos, quando vigorava a política integracionista que pretendia a eliminação completa dos povos indígenas”

Povos indígenas manifestam-se contra as PECs 187 e 343 na CCJC da Câmara dos Deputados, em Brasília. Foto: Tiago Miotto/Cimi

A peça também destaca a inconstitucionalidade da proposta que previa que os acordos para a exploração agropecuária das terras indígenas por fazendeiros seriam negociados entre não indígenas interessados e a Fundação Nacional do Índio (Funai), sem a participação dos povos indígenas.

“Permitir que a Funai exerça a tutela indígena é fazer retroceder o direito humano do índio em pelo menos 30 anos, quando vigorava a política integracionista, que pretendia a eliminação completa dos povos indígenas e das diferenças culturais em um período de poucos décadas”, expõe a Assessoria Jurídica.

No caso da PEC 187/2016, de autoria do deputado Vicentinho Júnior (PL-TO), a proposta, além de inconstitucional, é considerada “irrelevante” e “inócua” pela análise técnica. A proposta pretende alterar o artigo 231 para incluir uma autorização explícita a “atividades agropecuárias e florestais” em terras indígenas – algo que já é permitido pela própria constituição.

Segundo a nota, a PEC 187 traz “uma ideia positiva, mas inócua, de romper com o preconceito quanto a produção e comercialização indígena. Esse tipo de exercício pernicioso, caso aconteça, deve ser punido pelo Estado, por meio de suas instituições, mas nunca por meio de uma Emenda à Constituição”.

“Se é o caso de contribuir com os povos indígenas, seja na produção, seja na comercialização, necessário que se crie as condições por meio de políticas públicas locais e regionais, mas nunca mexendo na Constituição”, conclui a análise jurídica.

A nota também relembra a ampla participação dos povos indígenas durante o processo Constituinte, nos anos de 1987 e 1988, para destacar a legitimidade conjunto normativo-constitucional indígena que integra a Constituição Federal de 1988.

“Nesse sentido, qualquer mudança que implique em radicalização do texto constitucional é viciada, é ilegítima e tende a colocar por terra o que foi construído com a direta participação dos grupos indígenas”, afirma a nota.

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