Siri: Direito à moradia e responsabilidade ambiental

    Foto: Rafael Venuto

    Por Lavínia Kaucz e Yeda Teixeira/Fotos por Rafael Venuto.

    Entre as três capitais-ilha do Brasil, Florianópolis é, desde a década 70, um atrativo turístico alimentado pelos falatórios sobre suas belezas naturais. Já naquela época, a cidade se destacava por possuir um dos melhores Índices de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) do país. Melhor ainda na categoria de renda, em que somava 0,970 pontos, como registrado em pesquisa feita pela Sebrae-SC. Estes atributos foram grandes motivantes para que muitas famílias do interior de Santa Catarina e outras regiões do país migrassem para a capital catarinense.

    Na década de 1980, cerca de trinta famílias ocuparam as Dunas dos Ingleses e construíram suas casas de madeira batida sobre a areia fina e movediça, constituindo a Vila do Arvoredo, popularmente conhecida como Comunidade do Siri. Nativos de Florianópolis venderam para estas famílias terrenos que não podiam ser habitados. Sem políticas voltadas para educação ambiental, nativos ou migrantes não refletiam sobre os impactos ambientais de vender ou comprar pedaços de areia.

    Anos antes destas famílias se estabelecerem na Dunas, o Código Florestal, sancionado em 1965, já estabelecia que áreas caracterizadas como dunas de areia seriam especialmente protegidas, definidas como Áreas de Preservação Permanente (APP’s). Para a efetiva proteção destas áreas não seria permitido, em termos legais, quaisquer construções de propriedade pública ou privada.

    Um dos empecilhos na construção de propriedades em Florianópolis era o Decreto-Lei 9.760 de 1946, que decretava que as Ilhas Marítimas do Brasil pertenceriam à União, sendo propriedade da Marinha. Por este motivo, os habitantes da Ilha não poderiam fazer uso de um instrumento legal importante para a posse de uma terra: o usucapião.

    Em 2005, uma alteração no Decreto-Lei mudou o cenário de cidades como Florianópolis. A partir deste ano, todas as Ilhas Marítimas que eram sede de Município deveriam pertencer então ao governo estadual. Mesmo assim, cerca de 60% da cidade é formada por áreas públicas ou de propriedade da União. “O que a gente vê é que ainda no município, tínhamos poucas áreas dentro da ilha que não eram consideradas áreas públicas. Resumindo, o que resulta disso aí: entre 60% e 70% das construções que existem em Floripa são clandestinas”, afirma o professor de direito ambiental José Rubens Morato Leite.

    Por possuírem infraestrutura, valorização imobiliária e estarem consolidadas em questões ambientais, algumas propriedades construídas em áreas de preservação permanente não são consideradas alvos de remoção pelos órgãos municipais. Entretanto, a Comunidade do Siri é considerada uma ocupação em área de risco aos moradores.

    Foto: Rafael Venuto

    O mar não é pra pobre

    Carlos Eduardo Ferreira, apelidado de Kadú, conquistava aos poucos o sonho de trazer mais cultura e lazer para a Comunidade do Siri. Programou para que todo domingo acontecessem, na escola do bairro, oficinas das mais diversas para as crianças e os adolescentes. Aquele domingo de sol de junho não ia ser diferente. Era dia de coordenar o futebol.

    Seus filhos mais velhos, Matheus de 11 anos e Miguel de 10 anos, jogavam bola no quintal da casa. Laura, a filha pequena de 4 anos, sentada ao lado da porta de entrada da casa brincava com a areia e a terra. Apesar do parto recente, Andrea Felisoni aparentava estar com disposição “Foi parto normal, né?! Mais tranquilo”. O mais novo herdou o nome do pai, com menos de uma semana de vida dormia tranquilo no quarto. Agora, a casa de madeira de quatro cômodos é o abrigo de seis integrantes da família.

    Kadú é uma figura conhecida tanto no bairro como nos órgãos municipais por ser um dos responsáveis pelos acordos que buscam soluções para a ocupação das dunas.  Mudou de Canoas, no Rio Grande do Sul, para Florianópolis em 1998, logo que sua mãe, Mara, comprou o terreno da casa na comunidade. Ainda naquela época, a ocupação da dunas era pequena e estima-se que não passavam de 80 famílias.

    Enquanto preparava o almoço de domingo junto com a esposa, Kadú usava orgulhoso as novas facas que ganhou da mãe. No começo de 2017, foi sorteado para cursar gastronomia no Instituto Federal de Santa Catarina enquanto termina o segundo grau pelo PROEJA. Como Kadú, muitos moradores não concluíram o Ensino Médio durante a adolescência. De acordo com dados da Prefeitura, 77% dos moradores adultos da Vila do Arvoredo possuem apenas o Ensino Fundamental.

    Após um aumento significativo no número de moradores, Kadú iniciou em 2005 seu processo de envolvimento com a luta por direito à moradia e melhor qualidade de vida para os moradores. “A gente sabe que em cima das dunas os moradores não podem ficar”, comenta sobre a situação.

    Nas ruas de areia da Vila do Arvoredo, crianças andam com suas bicicletas e brincam correndo de um lado para outro. Ao horizonte de uma das ruas principais, uma montanha de areia surge e aparenta a qualquer momento desabar. Surpreendente como outras belezas naturais da Ilha da Magia, a areia que o vento sul traz em direção às casas preocupa moradores e autoridades.

    Foto: Rafael Venuto

    A quantidade de areia carregada pelo vento para dentro da comunidade é uma preocupação constante. Além dos problemas de saúde que as partículas de areia causam quando inaladas, o terreno movediço não permite boa estabilidade para as casas de madeira. Em locais de declive do terreno, a chuva castiga, alagando casas e dando prejuízo aos moradores.

    A comunidade, que havia começado com trinta famílias lá na década de 80, hoje já é formada por aproximadamente 400 famílias. O território total ocupado é de aproximadamente 84 mil m², de acordo com o programa de Geoprocessamento da Prefeitura de Florianópolis. Este aumento no número de moradores, explica Kadú, é decorrente do crescimento das famílias que já moravam no local. “Quando cheguei aqui, não passavam de 80 famílias. Aí, os filhos dos que já moravam aqui foram casando e tendo outros filhos e netos e foram ocupando outros terrenos”, conta o canoense.

    Enquanto o tráfico disputa poder e território no Siri e a Polícia Militar atua no combate à criminalidade, os moradores lutam para que os órgãos municipais não derrubem suas casas. “A tática usada pela prefeitura e polícia militar para justificar a destruição das casas é criminalizar as moradias. Eles dizem que as casas são usadas pelo tráfico, mas a maioria é de morador”, contesta Kadú.

    No domingo de dias das mães, a comunidade, que já era considerada pacificada desde o final de 2017, presenciou quatro execuções. A investigação da PM sobre os assassinatos não foi concluída. “Foram quatro execuções. Já na segunda-feira, a FLORAM apareceu aqui e derrubou quatro casas”, contou Kadú, justificando sua crítica às ações dos órgãos municipais para remoção das casas construídas nas dunas.

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    Antes de serem demolidas, as casas são marcadas com um “X” preto, enquanto muitas delas ainda se encontram habitadas. Kadu conta que as casas são marcadas durante o dia, e à noite chegam pessoas encapuzadas e coagem a família com violência a saírem de lá em um prazo determinado – do contrário, ameaçam de morte. “Depois disso o pai de família vai embora, por se sentir humilhado de apanhar na frente dos filhos, e porque não quer morrer, né?”, conta Kadu.

    O superintendente da Fundação Municipal do Meio Ambiente de Florianópolis (Floram), Álvaro Casagrande, nega que a Floram tenha relação com as marcações das casas. O órgão ambiental tem o poder de demolir casas construídas em APP, mas somente quando elas se encontram desocupadas. A avaliação, que decide se a casa está habitada ou não, é feita na hora. “O conceito de ‘desabitada’ é bem relativo. O fiscal tem essa discricionariedade para decidir”, afirma Casagrande, referindo-se à noção jurídica do poder discricionário (liberdade de ação dentro dos limites da lei). “A orientação que eu dou é a seguinte: se tem alguém morando ali, não pode demolir, mas se alguém colocou uma geladeira ali dentro, botou um sofá e tá guardando pra alguém ocupar, aí você demole”. Nas operações de demolição que envolvem comunidades com presença do tráfico, como no Siri, a equipe da Floram leva a PM como forma de evitar confrontos com pessoas que querem evitar a demolição das casas, alegando posse.

    Mesmo entre as dificuldades vivenciadas diariamente pelos moradores, alguns mantêm o apego com a comunidade. Dona Maura, 71 anos, é uma das moradoras mais antigas do local. Comprou seu terreno há 25 anos, em frente ao que ainda era um lago, – quando chovia, enfrentava uma invasão de rãs pela casa, conta rindo da situação. Hoje, o lago já não existe. No lugar, casas foram construídas por moradores que chegaram com o passar dos anos.

    Maura é benzedeira e conhece quase toda a comunidade. Os moradores recorrem à ela para curar diversos problemas de saúde. Ela faz remédio, chá, pomada, e atende todo mundo sem olhar a quem. Também é dona de uma vendinha localizada embaixo da sua casa.

    A casa de Maura está localizada em uma área das dunas que já está consolidada pela vegetação. Ela mora com seu marido e tem boas lembranças de suas vivências no Siri, como as visitas dos netos, que ainda crianças brincavam nas dunas. Além disso, a proximidade do mar, aonde chega em dez minutos a pé, é outro ponto positivo. E a insegurança? “Tem em tudo quanto é lugar”, responde Maura com tranquilidade, e alega: “Todo lugar é bom, se a pessoa souber viver”.

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    Mais casas vazias do que gente na rua

    Toda propriedade precisa exercer uma função social. Esse conceito relativiza o direito à propriedade, que deve estar submetida a um regramento que visa o bem coletivo. “Antes da Constituição de 88, o nosso pensamento político era individualista, voltado aos interesses privados. No período pré-Constituição houve um grande movimento, de muitos movimentos sociais, para fazer com que esse pensamento mudasse no sentido de que o interesse tinha que ser coletivo. E isso foi colocado e é um dos maiores avanços”, explica Flávia Gazzola Gobbato, doutoranda em Arquitetura e Urbanismo pela UFSC.

    Imóveis ociosos, portanto, são inadmissíveis do ponto de vista da lei. Mas existem com muito mais frequência e impunidade do que permite a Constituição. Segundo estudos da Fundação João Pinheiro, de Belo Horizonte, o número de imóveis vagos no Brasil ultrapassa 7,2 milhões. Enquanto isso, o Brasil está entre os países com maior carência habitacional do mundo: em 2015, correspondia a 6,35 milhões de domicílios.

    Esses dados são reveladores por mostrarem que a falta de moradia faz parte de um problema que transcende a falta de espaço para morar. Milhões de imóveis permanecem vazios enquanto milhões de pessoas vivem em condições precárias. Essa disparidade é efeito da especulação imobiliária, especialmente forte em Florianópolis devido aos conhecidos atrativos turísticos e à pretensa qualidade de vida.

    “As classes mais altas têm o poder de pressionar os governantes para que os recursos e investimentos se voltem para as áreas em que habitam, e não pras áreas periféricas. E isso gera o processo de segregação socioespacial, que faz parte da estruturação da cidade”, explica Gobbato. O crescimento da cidade acontece num eixo de fácil acesso a outras facilidades e serviços, como saúde, educação e segurança. “A disputa maior é pelo tempo”, observa a arquiteta, referindo-se à busca por moradia em lugares mais centrais  para economia de tempo de deslocamento. E quando a infraestrutura de uma determinada região cresce, o preço da terra sobe – o que não passa despercebido pelos proprietários, que mantêm o terreno ou imóvel desabitado para vender posteriormente, quando será mais valorizado.

    Foto: Rafael Venuto

    Desde a aprovação do Estatuto das Cidades, em 2001, o Brasil passou a incorporar instrumentos para barrar a especulação imobiliária, exigindo que o proprietário dê uma função social à propriedade – do contrário, o terreno pode ser desapropriado. “Mas na prática isso não funciona, porque os terrenos são normalmente grandes, e os prefeitos não querem comprar essa briga”, critica Gobbato.

    Em Florianópolis, de acordo com o Plano Municipal de Habitação de Interesse Social(PMHIS), o déficit habitacional é de aproximadamente 7.842 domicílios (com dados de 2010). Isto representa quase 14% das famílias do município que ganham até 3 salários mínimos. Além desse número, outras 710 famílias residem em áreas de risco ou de preservação permanente e precisam ser realocadas – desses domicílios, 158 estão localizados na Vila do Arvoredo.

    O PMHIS mostra que a disponibilidade de área para construção de Habitações de Interesse Social (HIS), destinadas às famílias que se encontram em situação de déficit habitacional ou precisam ser realocadas, é maior que a demanda. Somente no distrito dos Ingleses, onde se localiza a Vila do Arvoredo, o saldo de terras disponíveis para construção é de quase 565 mil m². Isso significa que, mais uma vez, o que falta não é espaço, mas vontade política.

    Ao todo, o plano identificou 64 Áreas de Interesse Social (AIS) no município, que são assentamentos precários, com necessidade de regularização e ações para o desenvolvimento social. O Estatuto das Cidades permite que os municípios adotem instrumentos para facilitar a regularização das terras e a implementação de políticas habitacionais. Em Florianópolis, desde 2005 há uma lei que define as Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS). Essas zonas são ocupações de populações de baixa renda, já consolidadas em área urbana. Nelas, se aplicam normas específicas para a regularização, urbanização e edificação (quando não há riscos para os moradores).

    José Silva* costumava ser um membro ativo da Associação de Moradores da Vila do Arvoredo (Amovila), que desde 2002 organizava a luta e representava os moradores da comunidade. Nas reuniões da associação, que chegavam a contar com mais de cem pessoas, eram debatidos assuntos referentes à articulação da Vila com o poder público, e também eram organizados eventos internos para criar um ambiente mais solidário dentro da comunidade, como mutirões e a confecção de um jornal impresso.

    A Amovila participou das negociações envolvendo as três tentativas de realocação da comunidade. No Rio Vermelho e depois na Vargem do Bom Jesus, localizados no Norte da Ilha, a compra do terreno para a construção de moradias para a população da Vila foi impedida por um abaixo-assinado, realizado pelos moradores locais.

    Foto: Rafael Venuto

    A terceira tentativa foi quase bem sucedida. Em 2009, o prefeito Dário Berger conseguiu a aprovação de uma verba federal de R$ 9 milhões destinada à realocação dos moradores para um terreno localizado nos Ingleses. A prefeitura ficou com o dinheiro até outubro de 2013. Sem nenhuma destinação, a verba voltou para Brasília.

    José levanta a voz, já firme e endurecida pela luta, quando começa a falar sobre a omissão do Estado em atender às demandas da comunidade. “A nossa luta é para ser um cidadão. É para ter direito à cidade”. A Amovila foi dissolvida em 2012, em meio ao desgaste das promessas não cumpridas pela prefeitura e à pressão do tráfico no local. “A gente lutou muito. Agora a gente não vê expectativa nem luz”, lamenta José.

    Segundo o Superintendente de Habitação e Saneamento, Lucas Arruda, há um projeto já concluído para a construção de 96 apartamentos em um terreno na Servidão Três Marias, localizada a aproximadamente quatro quilômetros da comunidade. O terreno já foi comprado e falta aprovar a licitação de uma construtora para realizar a obra. Esses apartamentos serão destinados à parte da população que ocupa a área mais instável das dunas, mas ainda não foi feito um cadastro que defina quem são essas pessoas. Não há prazo de entrega dos apartamentos.

    Além da política de reassentamento, a Prefeitura pretende regularizar os imóveis que se encontram em uma zona já urbanizada. A Lei Federal 13.465 de 2017 institui uma nova política de regularização fundiária, que facilita e desburocratiza a legitimação de posse. É com base nessa lei que a Prefeitura e o Conselho de Habitação estão discutindo as melhorias na infraestrutura a serem realizadas na comunidade e nas outras Áreas de Interesse Social da cidade. As prioridades de ação ainda estão sendo definidas.

    “Área Proibida pra Pobre”

    O direito de construir e o direito a um meio ambiente equilibrado são garantidos pela Constituição. A comunidade do Siri é exemplo de um caso de colisão de direitos. Estabelecida nas dunas dos Ingleses, as casas estão em cima de um lençol freático de mais de 200 milhões de metros cúbicos de água. Uma parte da comunidade não possui saneamento básico, são mantidas fossas e o lixo é acumulado na areia, ocasionando a degradação do meio ambiente e uma possível contaminação da água. Por outro lado, a situação vulnerável da comunidade exige uma política habitacional que contemple as necessidades reais dos moradores. “Ninguém tá em cima das dunas porque quer”, ressalta Andrea Felisoni, moradora da comunidade há aproximadamente 20 anos.

    Esses dois direitos são equivalentes, ou seja, nenhum prevalece sobre o outro. Isso faz com que a interpretação da lei seja feita a partir de cada caso individualmente. “Estamos tratando de dois direitos fundamentais, que de fato até esbarram num terceiro direito fundamental, que é o da vida digna”, observa José Morato Leite, professor de Direito Ambiental da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). De acordo com o professor, essa análise sempre é subjetiva, e o olhar que busca a proporcionalidade muitas vezes tende para um lado.

    Lino Peres, vereador de Florianópolis pelo Partido dos Trabalhadores (PT), explica que a luta por esses dois direitos divide-se em pauta marrom e pauta verde. “A pauta marrom é uma luta antiga da moradia. Esta é uma dívida histórica no Brasil, que vem desde a escravidão e colonização”, explica o vereador, que também é professor do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFSC. Por outro lado, a pauta verde surgiu de uma reação dos ambientalistas às organizações capitalistas industriais que foram se apropriando da natureza.

    Hoje, segundo Lino, essas duas pautas se juntaram no Estatuto da Cidade, lei de 2001 que segue o conceito de sustentabilidade. Mas o conceito é difícil de ser colocado na prática. “Florianópolis é uma das cidades mais caras do país. E quais são as terras mais baratas? Aquelas que não dá pra habitar, que são os mangues, íngremes, os maciços. Então as pautas se chocaram: como a cidade é cara, eu vou morar aonde?”, questiona o vereador.

    “APP é Área Proibida pra Pobre. Deviam chamar assim”, brinca José Silva. “Se aqui a gente tá ilegal, ali eles também tão”, complementa o morador, apontando para o outro lado da rua da sua casa.  O trocadilho faz sentido: a APP das Dunas dos Ingleses abrange uma área muito maior que a ocupada pela comunidade, incluindo à que abriga o Costão Golf Club Residencial, mas apenas os moradores do Siri são pressionados para sair. “Eles têm uma legitimidade de estar ali tanto quanto os outros”, aponta o vereador Lino Peres.

    Foto: Rafael Venuto

    A construção do Costão Golf Club e Residencial é um exemplo de propriedade privada em APP’s legitimada legalmente. O clube de golf e condomínio residencial foi construído na ponta sul das Dunas dos Ingleses.  Em 2005, a procuradora Analúcia Hartmann emitiu uma ação civil com pedido de liminar para embargar a construção do residencial. A ação foi movida pelo Ministério Público com o apoio de ONG’s e Associações de Moradores dos bairros do norte da Ilha, além de um abaixo-assinado com mais de 2500 assinaturas.

    Além de ser proibida a construção do residencial pelo Código Florestal, foi alegado que o empreendimento causaria danos ambientais por estar localizado em uma área fragilizada ambientalmente. “Os agentes públicos se preocupam com as dunas por conta da ocupação [Siri], mas cada 1 ml de pesticida usado no gramado do Costão Golf contamina 20 mil litros de água dos mananciais”, critica Kadú. A utilização de pesticidas no gramado de golf foi uma das razões para a abertura do processo judicial.

    Como consta no documento processual, um Estudo de Impacto Ambiental feito pelo próprio empreendedor informou que seriam usadas 30 toneladas por ano de pesticidas e inseticidas. Entidades de defesa do meio ambiente e associações de moradores da região do empreendimento alertaram que esta ação colocaria em risco a contaminação do aquífero, localizado abaixo das dunas de areia. A utilização dos agrotóxicos também poderia oferecer riscos à saúde pública, já que a Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (CASAN) possui três poços de captação de água próximos à região do Costão Golf.

    Outros danos ambientais causados pela construção do clube também foram destacados na ação civil. Na época, a FATMA e outros órgãos municipais foram punidos pela autorização do licenciamento ambiental para o empreendimento. Mesmo com a tentativa do MP de embargar a construção, hoje o Costão Golf Club e Residencial é uma realidade já consolidada em cima das dunas, com casas de luxo e os altos custos para uma partida de golf. Kadú critica a diferença entre a comunidade do Siri e o clube: “A mesma lei que vale para o pobre, não vale para o rico”.

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