Em nota, estudantes indígenas e quilombolas divulgam conquistas e garantem que luta continua

MEC foi chamado para reunião com Secretaria do Governo para explicar corte nas Bolsas. Ministério afirmou atender todos os inscritos. Foto: Guilherme Cavalli/Cimi

Após semana de mobilização em Brasília (DF), movimento dos estudantes indígenas e quilombolas divulgou documento sobre avanços nas políticas de permanência e acompanhamento dos povos e comunidades tradicionais no ensino superior. A organização que iniciou nas universidades contra a paralisação do Programa Bolsa Permanência (PBP), ganhando corpo contra os cortes de aproximadamente 4 mil vagas no programa, permaneceu na capital federal de 18 a 22 de junho em atos pela manutenção das assistências estudantis que garantem a presença dos povos nas academias.

Após pressão, o MEC assumiu o compromisso de atender todos os inscritos em 2018. Movimento orienta que inscrições sejam agilizadas no site do programa. Segundo ministério, o pagamento das bolsas acontecerá na medida que as inscrições forem efetivadas. Acesse aqui o site para inscrição.

Na Câmara dos Deputados, após incidência nas Comissões de Educação e de Direitos Humanos e reuniões com deputados, delegação garantiu que ações afirmativas para indígenas e quilombolas sejam incluídas como parecer ao projeto de lei (PL) 1434/2011, que está sob relatoria da deputada Alice Portugal (PCdoB – BA).

PROJETO DE LEI 1434/2011

O PL cria um fundo nacional de assistência estudantil (FUNAES), embasa projetos de moradia estudantil de instituições de educação superior públicas, concede bolsas de manutenção voltadas à permanência no ensino superior e apoia o desenvolvimento de projetos de assistência à saúde dos estudantes. Referente aos estudantes indígenas, o PL garantirá assistência à moradia estudantil com respeito às suas tradições culturais. Uma subcomissão foi criada para acompanhar a relatoria que incluirá as demandas dos povos indígenas e quilombolas no PL 1434/2011.

Agendas com Governo

Nas agendas com órgãos do Governo, representações do movimento questionaram a oferta do MEC, que no dia 16 anunciou 2.500 vagas no PBP. “As ofertas divulgadas não contemplavam todos e todas estudantes indígenas e quilombolas”, expõe o documento. Em resposta aos questionamentos, representante da Secretaria de Ensino Superior, Vicente de Paula Almeida Júnior, afirmou que o quantitativo exposto pelo ministério trata-se de uma estimativa. “O MEC irá atender todos os inscritos”, garantiu.

Ainda, o MEC comprometeu-se a rever os estudantes retirados do PBP por ultrapassar tempo estimado de curso. Para o movimento, o critério desconsidera as especificidade dos povos, como “situação de vulnerabilidade socioeconômica no enfrentamento de condições logísticas e financeiras para se manter na universidade, a realidade de escolarização básica defasada e de inserção nos novos ambientes de aprendizado e de avaliação, despreparados para a diversidade”.

Trincheiras de resistência

Além das conquistas pontuais nos poderes Executivo e Legislativo, a mobilização “constitui-se como trincheira de resistência”. A unidade entre estudantes indígenas e quilombolas foi pontuado pela mobilização como fato histórico que permanecerá “contra qualquer retrocesso nas políticas sociais” que afete os povos e comunidades tradicionais.

Nosso movimento é pela garantia da democratização do direito à educação como esforço de diminuir a exclusão e violências historicamente perpetrada no país.

No fim do documento,o movimento se dispõe a dialogar com MEC para aperfeiçoar políticas de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. Todavia, garantem não recuar nos direitos conquistados. “Nenhum indígena ou quilombola ficará fora da universidade por cortes orçamentários realizado pelo Governo de Michel Temer no Ministério”, afirma nota.

Durante a semana de lutas, a delegação de aproximadamente 300 estudantes, de 18 universidades e institutos federais, cumpriu agendas na Câmara dos Deputados, nas Comissões de Educação e Direitos Humanos, na Casa Civil, Ministério da Educação, Secretaria de Planejamento, Secretaria de Articulação Social da Presidência da República, Secretaria de Promoção de Igualdade Racial.

A sociedade brasileira é fruto da violenta colonização. Por séculos nós, povos indígenas e quilombolas, fomos violentados numa perspectiva de formação do “Estado Nacional”, por um projeto assimilacionista que não considerou nossas crenças, culturas ou tradições. Chegou-se a afirmar que nos anos dois mil não existiríamos mais. Contudo, mesmo diante dos cinco séculos de violência estrutural, não somente existimos, como também reivindicamos nossos espaços. Em resistência e luta, marchamos em retomadas. Nossos anciões iniciaram a luta por nossos territórios, hoje continuada por todos. Em continuidade a caminhada dos mais velhos, avançamos nas lutas por espaço nos territórios do saber, utilizando a educação como instrumento de luta. Hoje ocupamos e exigimos a permanência nas universidades.

Sabemos que as políticas do Estado são planejadas e implementadas a partir de uma lógica desenvolvimentista que coloca no centro o capital, as empresas, e o agronegócio, considerando-nos um entrave.

O Programa de Bolsa Permanência (PBP), instituído por meio da Portaria nº 389, de 9 de maio de 2013, é fruto das constantes lutas do movimento indígena e quilombola por políticas de ações afirmativas. Não se trata de uma mera compensação financeira, mas de uma política de reparação das incontáveis e constantes agressões à pluralidade de nossos povos e comunidades.

Garantir nossa permanência nas universidades por meio de uma bolsa que busca custear despesas básicas – moradia, alimentação, transporte – é uma medida obrigatória a partir dos princípios constitucionais (Art. 205 e 208 CF 1988). Entendemos que promover qualquer interrupção ou redução nas políticas de ações afirmativas é compactuar com as documentadas políticas colonizadoras, racistas e genocidas.

Contra qualquer retrocesso, o movimento estudantil de indígenas e quilombolas organizou-se em jornadas de mobilizações nas universidades, para cobrar a abertura do programa no primeiro semestre de 2018 e contra a redução do número de inscrições. Na semana de 18 a 22 de junho, representando 18 universidades e institutos federais, lideranças e estudantes indígenas de 40 povos e quilombolas das cinco regiões do país mobilizaram-se em Brasília.

Na capital federal, apresentamos as demandas do movimento para combater a dificuldade de permanecer por insuficiência financeira e racismos institucionais e garantir a continuidade de políticas afirmativas voltadas ao acesso e permanência no ensino superior.

No Poder Legislativo, fortalecemos a principal pauta do movimento: desejamos que o Programa Bolsa Permanência se torne uma política de Estado, independente de governos, com leis que amparem a eficiência do programa. As agendas com deputados e senadores sensíveis à causa permitiram fazer avançar o projeto de lei (PL) 1434/2011 na Câmara dos Deputados. Sob relatoria da deputada Alice Portugal (PCdoB – BA), o PL cria um fundo nacional de assistência estudantil (FUNAES). Na Comissão de Educação da Câmara, a presença da delegação contribuiu para a criação de uma subcomissão especial para debater, acompanhar e propor medidas acerca da crise nas universidades públicas e institutos federais de educação. O movimento integrará a iniciativa como forma de refletir as deficiências das políticas de ensino para indígenas e quilombolas.

Além disso, se aprovado, o PL embasará projetos de moradia estudantil de instituições de educação superior públicas, concederá bolsas de manutenção voltadas à permanência no ensino superior e apoiará o desenvolvimento de projetos de assistência à saúde dos estudantes. Referente aos estudantes indígenas, o projeto garantirá assistência à moradia estudantil com respeito às suas tradições culturais.

O movimento considera que, diante da conjuntura de sucateamento das políticas públicas de inclusão assumido como projeto pelo Governo de Michel Temer, os encaminhamentos feitos na esfera legislativa contribuíram para um grande avanço na assistência estudantil diferenciada, o qual beneficiará também toda a comunidade acadêmica que vem constantemente sofrendo com os retrocessos na assistência estudantil e nas políticas afirmativas.

No Poder Executivo, as agendas conquistadas através de marchas, rituais e mobilizações, evidenciaram o despreparo do Governo para trabalhar com políticas que gestem uma universidade plural e respeitosa a diversidade. Na reunião junto à Casa Civil, com representações do Ministério da Educação, pela Secretaria de Ensino Superior e Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, mais Secretaria de Planejamento, Secretaria de Articulação Social da Presidência da República, Secretaria de Promoção de Igualdade Racial, representações do movimento questionaram sobre o número de bolsas estipulado pelo MEC. As ofertas divulgadas não contemplavam todos e todas estudantes indígenas e quilombolas, levando em consideração, por exemplo, casos de estudantes do semestre anterior que não puderam fazer as inscrições.

A representação do governo garantiu que o programa Bolsa Permanência atenderá todos os inscritos e que irá agilizar o cadastramento e a homologação desses alunos no sistema. O número de 2.500 vagas disponibilizadas pelo MEC, segundo a Secretaria de Educação Superior, corresponde a uma estimativa feita a partir da análise dos inscritos em 2017. Questionado por lideranças indígenas e quilombolas, o MEC comprometeu-se a atender todos os inscritos no programa. Recomendamos que os parentes indígenas e quilombolas agilizem suas inscrições. O pagamento das bolsas sairá na medida que as inscrições forem realizadas.

O ministério também garantiu que os estudantes retirados do sistema de Bolsa Permanência devido a ultrapassar o tempo de curso serão reinseridos no programa. Compreendemos que limitar a bolsa ao tempo padrão do curso desconsidera as lutas históricas por políticas públicas e sociais, a situação de vulnerabilidade socioeconômica no enfrentamento de condições logísticas e financeiras para se manter na universidade, a realidade de escolarização básica defasada e de inserção nos novos ambientes de aprendizado e de avaliação, despreparados para a diversidade. Também somam-se  como dificuldades o distanciamento das aldeias, terras indígenas, quilombos, comunidades, de suas famílias e de sua cultura, sua dificuldade de adaptação ao ambiente da universidade, incluindo as vivências de atos de discriminação e preconceito que impactam sua trajetória acadêmica. Desconsiderar tudo isso é legitimar o racismo institucional. Diante dessa realidade, na reunião cobramos do MEC que reveja a política que aplicação da bolsa em tempo determinado. Exigimos que o auxílio seja durante todo o período acadêmico, independente de tempo.

Além das conquistas pontuais, a semana de mobilização em Brasília possibilitou a unificação das lutas dos estudantes indígenas e quilombolas. O movimento constitui-se como trincheira de resistência que permanecerá vigilante contra qualquer retrocesso nas políticas sociais. Cabe o informe ao Ministério da Educação: nos propomos ao diálogo para aperfeiçoamento nas políticas de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. Contudo, não recuaremos nos direitos conquistados. Nenhum indígena ou quilombola ficará fora da universidade por cortes orçamentários realizado pelo Governo de Michel Temer no Ministério.

Nosso movimento é pela garantia da democratização do direito à educação como esforço de diminuir a exclusão e violências historicamente perpetrada no país. Estudar não pode ser mais um privilégio de poucos.

Assinam o documento final indígenas e quilombolas das universidades:
UFBA, UFSB, UNIFESSPA, UFRB, UFMT, UFG, UFPB, UFOPA, UFT, IFPE, UFPEL, FURG, UFSCAR, UFSC, UNIPAMPA, UFSM, UNB, UFT, UFMG.

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