“Isso aí é Sucupira.” – Vereadores de Florianópolis querem creches e saúde privatizadas urgentessimamente

    “Isso aqui é Sucupira, essa câmara não é séria”

    Por Artur Cappellette, para Desacato.info.

    “Isso aqui é uma sucupira, essa câmara não é séria”, protestou o vereador Lino (PT) depois da sessão em que 16 vereadores colocaram a tramitação PL das Organizações Sociais (OS) em regime de urgência urgentíssima, nesta terça-feira, 17. Sucupira é a cidade fictícia do prefeito Odorico Paraguaçu, um político corrupto e cheio de artimanhas.

    A artimanha governamental aqui é o “voto de cabresto em vereador, é uma vergonha”, por esse motivo a aprovação do projeto está praticamente garantida. “Eu perguntei para o presidente Gui Pereira (MDB), vocês vão ganhar, então para que pressa?”

    O motivo, segundo os vereadores da situação, é um declarado interesse público de novas creches em funcionamento. “Audiências públicas atrasariam em 20 dias o projeto e a população tem se manifestado claramente pelas redes sociais: é um clamor da população. Ela é a favor, sim, das OS”.

    Como não quisessem discutir nada, a sessão ordinária foi encerrada abruptamente, enquanto a oposição ainda tentava votar requerimentos e declarar os votos. “Foi uma agressão”, resumiu o vereador Afrânio (Psol), à reportagem do Portal Desacato.

    Assim que declarou encerrado o expediente, Pereira foi cercado. O tumulto fez com que a assessoria de comunicação, encerrasse a transmissão ao vivo da TV Câmara. Enquanto isso, na rua e nas galerias os servidores municipais, em greve há sete dias, ameaçavam repetidamente: “não vai ter sossego”.

    Atrás de policiais militares e guardas municipais, o vereador pelo PSB, Bruno Souza, esperava o elevador, sossegadamente, rindo dos manifestantes que desciam a escada à sua frente. “Fascista”, “Traidor”, “Golpista” gritavam. Em resposta, Souza enviava beijinhos aéreos.

    Mais cedo, o socialista usou discurso irônico e voz melosa para ataca-los. Primeiro alegou que os servidores não são parte da população, mas um “grupo organizado ao qual a bancada do UFC (em referência à oposição) sabe fazer o seu showzinho”. Quando vaiado, pediu que os servidores visitassem “a Escola Marista (privatizada pelo governo estadual) do Morro da Caixa para vaiar as crianças e as famílias que deixam seus filhos lá”.

    Sem defender o PL das Organizações Sociais, Pereira discursou em defesa da legalidade do processo que ele liderava. Segundo ele, o regulamento da casa autoriza abreviação do processo legislativo quando um projeto é relevante para a população e “esse projeto é tão relevante, que hoje estamos com a casa cheia”, apontou. Ele não foi vaiado porque os servidores caíram nos risos. “Tira a batata da boca”, gritou uma mulher em referência a pronúncia peculiar que usava ao enfatizar as palavras.

    A legalidade do que acontecia não era um ponto pacífico nem entre os da oposição, nem entre procuradores do Ministério Público de Santa Catarina ou entre os analistas do Tribunal de Contas do Estado e nem na procuradoria da Câmara de Vereadores. Todos os órgãos apontaram falhas na lei que instituiu o programa “Creche e Saúde Já”, proposta por Gean Loureiro.

    O vereador Pedrão (PP), no plenário, acusou os colegas de desconhecerem o que estavam votando. “Vocês não leram o projeto e nem sabem do que estão falando”, acentuou. Enquanto os vereadores defendem que o projeto servirá para abrir a UPA Continente e 10 creches “o PL não especifica qual é a UPA e quais são as creches, vocês estão pautados pelas propagandas, senhores vereadores”, ironizou. A rigor, o projeto de lei pode ser aplicado para privatizar todos os serviços públicos que não tem poder de polícia.

    Além de não prever controle social das OS, o PL ainda abre espaço para interesses pessoais. O progressista sugeriu que comparassem a Lei Federal 9637/98 com o projeto em tramitação “para ver que uma das grandes alterações é que suprime da qualificação das OSs o tempo de atividade, que a OS tenha o seu plano de carreira e de cargos, justamente para evitar que as ONGs, que estão sendo criadas nesse momento, que não tem expertise nenhuma, possam assumir a execução de um serviço público”.

    O projeto ainda abre a possibilidade que o prefeito escolha a ONG de maneira unilateral “através de uma comissão designada por ele, conforme conveniência e oportunidade”, explicou.

    Lembrando o parecer da procuradoria, Afrânio lembrou que o artigo 61 da Lei Orgânica “não permite que entre projeto de lei para regular matérias de reforma de ensino, tem que ser um PLC (Projeto de Lei Complementar)”. Um PLC exige maioria absoluta (12 vereadores), enquanto o PL precisa apenas de maioria simples, com qualquer quantidade de vereadores em plenário. “Está tudo errado aqui dentro”, criticou.

    Lino observou que o projeto “não tem estudo atuarial ou estudo do impacto no orçamento, é uma coisa amadora”. O projeto também não prevê fiscalização, “então, imagina no que vai dar isso… vai ser uma ‘intransparência’ total. O petista defende que o sindicato dos médicos seja chamado para discutir o problema da quarteirização. “A empresa que entra, a ONG sem fins lucrativos, ela vai subcontratar os médicos e os enfermeiros. Eles estão sentindo na ponta isso”.

    Para a oposição o dia só não foi pior porque Marquito conseguiu pedir vistas do PL que estava sendo analisado na Comissão de Meio Ambiente. No Regime de urgência urgentíssima, ele terá três dias para apresentar seu parecer, que antecipou, será contrário. Teoricamente, a tramitação só retornará às comissões na sexta-feira, quando não há reuniões ordinárias na câmara. Ainda assim, poderá haver expediente extraordinário.

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