Ruas em Vigília

Vigília em Curitiba. Foto: Elenira Vilela

Por Míriam Santini de Abreu, para Desacato.info.

Os vídeos e fotografias que desde sexta-feira passada (6) pululam nas redes sociais dão a dimensão do que significa um trecho do livro “Sobre a tirania – Vinte lições do século XX”, do professor de história da universidade de Yale Timothy Snyder (Companhia das Letras, 2017). Ele diz: “O poder deseja que seu corpo amoleça na poltrona e que suas emoções se dissipem na tela. Saia de casa. Leve seu corpo a lugares desconhecidos, onde vivem pessoas desconhecidas. Faça novos amigos e se manifeste junto deles. (…) Nada é real se não acaba nas ruas”.

Na semana passada, milhares de pessoas saíram de suas casas e acorreram ao emblemático Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, tomando o prédio e as ruas adjacentes em defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Nesta semana, acorrem à sede da Polícia Federal em Curitiba, demarcando assim dois espaços que simbolizam o ápice e o desfecho (provisório) de um fato político com desdobramentos imprevisíveis.

As imagens da Vigília em Curitiba, iniciadas ainda no sábado (7) com a violenta repressão contra os manifestantes pró-Lula, agora tem mostrado místicas, apresentações musicais, falas de políticos e artistas. E isso tem irritado. Muito. Nesta quarta-feira (11), a imprensa informou que o Sindicato dos Delegados de Polícia Federal do Paraná (SINDPF-PR) pediu a “transferência imediata” de Lula. De acordo com policiais, a presença do ex-presidente “oferece riscos à população e aos funcionários”. A nota diz que houve “invasão da região” por “centenas de pessoas ligadas a movimentos sociais e outras facções”.

Essas presenças na rua, no entorno do prédio da Polícia Federal, evocam o mais atual e emblemático significado de vigília: a condição de quem está desperto. O filósofo e sociólogo francês Henri Lefebvre escreve no livro “A revolução urbana” que a passagem na rua, espaço de comunicação, é a uma só vez obrigatória e reprimida: “Em caso de ameaça, a primeira imposição do poder é a interdição à permanência e à reunião na rua”.

O Poder teme a rua. Porque nela é que acaba o que é real.

 

Míriam Santini de AbreuMíriam Santini de Abreu é jornalista em Florianópolis.

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