Um tema tem aparecido recorrente entre meus colegas: o triste destino dos jornalistas velhos. Muitos não conseguem compreender por que, ao chegarem a uma idade na qual estão muito mais experientes e acumulam tanto conhecimento, são demitidos dos seus locais de trabalho. Que lógica é essa que substitui um jornalista com anos de estrada por um novato inexperiente? Por que tanta desconsideração com trabalhadores que, muitas vezes, deram sua vida pela empresa onde trabalham?
A resposta é simples e deveria ser conhecida pelos jornalistas, visto que eles são os que mais se deparam com as notícias da vida, narrando-as. É o capitalismo. Simples assim.
O dono da empresa fica rico a partir da exploração da força de trabalho do empregado. É o trabalhador o que gera valor. E como o capitalista lucra? Diminuindo cada vez mais os seus custos de produção. É por isso que o dono do jornal investe em inovação, em novas tecnologias. Para diminuir os custos. Assim, um trabalhador trabalhará oito horas, com máquinas que aceleram o trabalho, e produzirá mais para o dono do jornal.
Esse tipo de coisa cria uma concorrência entre os próprios trabalhadores, porque a maior divisão do trabalho permite ao trabalhador fazer o trabalho de cinco, 10 ou 20 pessoas. Veja que hoje, no jornal, uma mesma pessoa dirige, fotografa, escreve, edita foto, filma, edita vídeo, posta na internet e compartilha. Uma pessoa fazendo o trabalho de oito. E quem não se adapta a isso está morto. É descartado por ineficiência.
Marx mostra isso muito bem. Quanto mais aumenta a divisão do trabalho, mais simplificado fica o trabalho. Então, aquele jornalista velho, que tem muito conhecimento sobre seu fazer e sobre o mundo fica obsoleto. O sistema não quer alguém experiente e sabido. O sistema quer alguém capaz de fazer muitas funções simplificadas, que não necessitam de muita experiência. E por quê? Porque aí pode pagar menos. E pagando menos, diminui seus custos de produção.
Um bom jornalista, velho e experiente não se sujeitaria a trabalhar como “produtor de conteúdo”, com um salário de 600 ou 800 reais. Iria querer um salário que fosse compatível com todo o investimento que fez em si mesmo, já que tudo o que tem é sua força de trabalho para vender. Mas o sistema capitalista é cruel. Quanto mais tu investes em ti, mais caro tu ficas, então menos interessante para o patrão. O patrão quer sempre pagar o menor salário que, junto às inovações, vão aumentar seus lucros. E essa não é uma prática só de capitalistas não. Ela tem aparecido, amiúde, até nos sindicatos de trabalhadores, que se comportam como tais.
A equação, portanto, é de simples resolução. Na sociedade capitalista, o velho, o que tem experiência e conhecimento, o que investiu em si mesmo, deixa de ser lucrativo para o patrão. Porque exige mais e, muitas vezes, não aguenta o tranco da multifunção que é exigida agora. Então, ele é rifado.
Atualmente, no mundo do jornalismo, pouca exigência de qualificação jornalística é necessária. O que se pratica nas redações é pura propaganda e qualquer novato, com um mínimo de conhecimento dos softwares, pode produzir um texto padrão. Não se exige mais o texto burilado, literário, bonito. Não se exige o repórter, aquele que vai ao local da notícia e ouve as pessoas, e vê o ambiente. O que, depois, monta uma complexa narrativa que é produção de conhecimento e que ajuda o leitor a entender toda a atmosfera na qual se deu o fato. Jornalismo de verdade.
Não, esse jornalista dinossáurico não é mais necessário. Pelo menos não para o dono do jornal ou da TV. E, como também explica Marx, quanto mais o capitalista da comunicação cresce e ganha dinheiro, os ganhos dos trabalhadores diminuem e a concorrência entre eles aumenta. A guerra mais mortífera se dá no campo dos trabalhadores. É perverso, mas é assim.
Então, a luta por melhores salários nas redações acaba sendo aquela que, se vitoriosa, provocará mais desemprego. Uma armadilha de difícil desarme. Um problemão.
Diante disso, que fazer? Lutar pelo fim desse sistema de exploração. Derrotar o capitalismo. A única saída. Ah, mas é difícil. Sim, é difícil, mas não é impossível. E, para fazer isso há que estudar, conhecer, lutar e estar disposto a enfrentar a mudança. Pense no servo da gleba que, no interior do tempo das trevas, sonhava com liberdade. Quantos deles caíram para que chegasse o tempo do capital? E não foi para acabar armadilhado outra vez. O mundo burguês que assomou das brumas do feudo ainda não é o melhor dos mundos. É preciso transformá-lo. Para que se acaba a propriedade privada e o trabalho assalariado. E nesse novo mundo, os velhos terão lugar.
À luta, pois…
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Foto: Arquivo da internet.
[avatar user=”Elaine Tavares” size=”thumbnail” align=”left” link=”file” target=”_blank” /]Elaine Tavares é jornalista.