Por Indianara Siqueira.
Atualmente, a luta de homens trans e mulheres travestis e transexuais se intensificou e se fortaleceu nas redes sociais
Nosso país é o primeiro no mundo no ranking de assassinatos dessas pessoas, de acordo com a ONG Transgender Europe. Aqui, não temos respeito ao nome social nos serviços públicos, causando grande constrangimento e sofrimento, expondo essa parcela da população ao bullying e até provocando suicídios.
Isso tudo acontece mesmo depois de 20 anos da aprovação do nome social, que foi reivindicado pelo grupo Filadélfia durante a Conferência Municipal de Saúde, em Santos (SP), em 1996.
As pessoas transvestigêneres não estão inseridas nas escolas e universidades, devido ao desrespeito e às agressões físicas e psicológicas sofridas nesses espaços. Este cenário elimina as pessoas trans do mercado de trabalho que também não está preparado para acolher. Pelo contrário, nos obrigam ao uso do banheiro, vestiário e vestuário não conforme a nossa identidade de gênero. Parece um ciclo sem fim de sofrimento e exclusão.
Nos obrigam a forjar uma caricatura daquilo que esperavam que fôssemos, o que leva mais de 90% de mulheres transvestigêneres a ter na prostituição a sua única opção de sobrevivência e homens transvestigêneres a subempregos e mendicância. Alguns, hoje, também já se aventuram no mundo da prostituição tendo seus corpos fetichizados como homens com vagina.
Na saúde pública, o desrespeito é tão grande, que muitas pessoas procuram atendimento em último caso. Muitas vezes, o problema de saúde se agrava a tal ponto, que provoca óbito de nossa população transvestigênere. Somos pessoas sem direito algum. Nem a existir dentro de nossa própria casa familiar, porque somos expulses em início de transição, geralmente quando completamos 18 anos. A expulsão de casa nos leva a viver e a dormir nas ruas e ainda nos expõem ao uso abusivo de drogas e álcool para amenizar o sofrimento, o que provoca outros sofrimentos.
Somos invisibilizades dentro dessa sociedade racista, misógina, machista, intertranslesbihomofóbica*, que nos mata a conta-gotas em cada vez que nos negam direitos. E também nos assassinam das maneiras mais cruéis por meio de crimes de ódio. O debate sobre gênero nas escolas é urgente para conscientizar as pessoas, desde cedo, que somos todes pessoas que têm direito de existir, independentemente de identidade de gênero e orientação sexual.
Continuaremos resistindo. Somos resilientes. Nossos corpos rasgarão essa sociedade como navalhas, derrubando seus padrões opressores e assassinos. Direito, visibilidade e respeito a todes os corpos transvestigêneres. Não recuaremos. E, sim, avançaremos e venceremos por nós, porque esta também será a salvação dessa sociedade pautada no machismo assassino da cisheteronorma**. Por mim. Por nós e por todes.
Indianara Siqueira é transvestigênere, presidente do TransRevolução, idealizadora do PreparaNEM e da CasaNEM e vereadora suplente pelo PSOL
*Transvestigênere: para além da vestimenta, da genitália e do gênero.
**assassinades – em vez de usar artigo binários como A ou O, a população trans adota o vocabulário neutro com o E.
*intertranslesbihomofóbica: ódio a pessoas intersexuais, transexuais, lésbicas, bissexuais e homossexuais.
**cisheteronorma: cis = pessoa cisgênera, ou seja, pessoa que se identifica com o gênero com o qual foi designada ao nascer. Hetero = pessoa cuja orientação sexual é heterossexual. Norma = normativa, isto é, que segue as normas da sociedade.
Fonte: Brasil de Fato.