Economistas classificam PEC 55 como injusta, antidemocrática e ineficiente

Por Hylda Cavalantti

Economistas e acadêmicos classificaram de contraproducente, injusta, antidemocrática e inconstitucional Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55, em tramitação no Senado, com objetivo de congelar os gastos públicos por 20 anos. Em audiência pública conjunta realizada pela comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) e Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), no Senado, nesta terça-feira (8), os profissionais disseram que a proposta é incapaz de resolver a situação econômica do país e apontaram como alternativa uma reforma tributária.

No entanto, a PEC foi avaliada como solução positiva para a crise por técnicos convidados pelos aliados de Michel Temer e é apontada como justificativa para reduzir o número de desempregados. A leitura do relatório do senador Eunício de Oliveira (PMDB-CE) está prevista para amanhã, em reunião da CCJ.

Pedro Paulo Zaluth Bastos, professor associado do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), afirmou que o texto resultará na paralisação nas despesas do governo. “Isso quer dizer que um mesmo volume de recursos que em 2016 foram congelados pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) não pagará o mesmo volume de serviços ao longo do tempo. No mínimo, a PEC deveria acompanhar o deflator (ferramenta que restabelece um determinado valor descaracterizado pela inflação) implícito do Produto Interno Bruto (PIB)”, disse.

Para Bastos, caso seja aprovada a proposta, o nível real de gastos vai cair, mas isso significa que a oferta real de serviços vai ser menor do que o que foi paralisado em 2016. O que acarretará na eliminação das determinações constitucionais de percentuais obrigatórios destinados para os setores de educação e saúde. “A proposta de país que a PEC oferece é de um Estado que é menor que os países africanos de baixa renda. A PEC é absolutamente inviável”, reclamou.

“A proposta também é muito injusta do ponto de vista social. Da forma como está, pune os inocentes e nada faz com os criminosos, que são os sonegadores fiscais, e os privilegiados com a política tributária agressiva. Não existe motivo nenhum para a gente punir os inocentes e continuar poupando os criminosos e privilegiados”, ressaltou.

Regime tributário ineficiente

Guilherme Santos Mello, professor do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (Cecon-Unicamp), disse que o atual regime fiscal brasileiros tem muitos problemas, como ser baseado em medidas de curto prazo, não dar apoio nem suporte aos investimentos, o que dificulta o planejamento no país.

“O regime tributário brasileiro é complexo, ineficiente e gera distorções. Um novo regime fiscal deve garantir capacidade de financiamento ao Estado brasileiro. Tem que garantir transparência das contas públicas e priorizar o investimento público. E nosso sistema atual não contempla estes itens”, afirmou. De acordo com o economista, antes de se pensar na PEC o Executivo deveria pensar em discutir uma reforma do sistema tributário para aperfeiçoar as regras fiscais brasileiras.

“Não considero, como muitos dizem, que a proposta institui um novo regime fiscal. A PEC só altera um dos aspectos do regime fiscal atual que é o ritmo de crescimento da despesa pública, mas não mexe em mais nada. Não fala sobre desonerações, não modifica o sistema de gastos primários no país. Temos que reconhecer que a atual situação das contas públicas e o endividamento do país precisam ser enfrentados, mas com a retomada do crescimento econômico. E, para isso, investimento é fundamental”, destacou.

Santos Mello chegou a ser aplaudido e chamou a atenção dos senadores quando sugeriu que se além de uma regra de gastos, o país quiser manter uma regra de superávit primário, que esta regra seja calcada em metas mais flexíveis. Ele também sugeriu a retirada do item “investimento público em infraestrutura” do cálculo de resultado primário, assim como sugeriu a taxação de grandes fortunas.

“Na PEC há uma redução enorme do Estado brasileiro em nível de despesas. Se há alternativas melhores, porque não considerá-las, em vez de aprovar medidas que vão engessar o Brasil por 20 anos?”, questionou.

Já o acadêmico Samuel Pessoa, professor assistente da Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getúlio Vargas no Rio de Janeiro (EPGE/FGV) e chefe do Centro de Crescimento Econômico do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (IBRE/FGV) e o economista Marcos José Mendes, chefe da assessoria especial do Ministério da Fazenda, defenderam a proposta.

Pessoa afirmou que o Brasil vive o que definiu como “pior crise dos últimos 120 anos”, o que provocou ironias e reclamações. Segundo ele, os quatro momentos dramáticos observados na história do país foram a primeira guerra mundial, a crise da dívida externa nos anos 80, o período do governo Collor e o momento atual.

“Descobrimos por volta de 2014 que o Tesouro brasileiro tinha um problema de insolvência. Reconhecemos que somos uma sociedade que tem problemas distributivos, mas o início do caminho para resolver os problemas do país passa pela PEC”, acrescentou.

Marcos Mendes mostrou vários itens que considerou como mitos em torno da proposta. Disse que o ajuste fiscal que o Executivo pretende implementar “é o que o país precisa”. Afirmou, também, que a PEC, em sua avaliação, “reconstrói o realismo orçamentário”, uma vez que considera que nos últimos anos foram superestimadas receitas e “incluídas mais e mais despesas ao orçamento”. “Com a PEC, o limite de despesas terá de ser obedecido pelo orçamento”, ressaltou.

Perto de 40 senadores se inscreveram para discursar sobre o tema. “Essa PEC deveria se chamar PEC da moralização dos gastos públicos e não PEC do teto de gastos, porque nunca se gastou tanto como nos últimos governos”, disse Ricardo Ferraço (PSDB-ES). “Seu discurso é fundamentalista e ideológico, senador Ferraço. Está baseado em mera ideologia privatista por parte dos que querem transformar o Brasil num Estado mínimo”, respondeu Roberto Requião (PMDB-PR).

“Falar em maior crise do país quando já passamos por períodos tão tumultuados e sem levar em conta que os gastos feitos no governo anterior foram para manter programas sociais, que tanto ajudaram a reduzir a desigualdade, chega a ser ridículo”, comentou Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM). “Não há como usar outras justificativas para negar que os governos anteriores levaram o Brasil a uma crise”, disse José Aníbal (PSDB-SP).

O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) disse que o ajuste em tramitação por meio da PEC “é só em cima dos mais pobres”. “Será que não dá para proporem que pelo menos alguma conta seja paga pelo andar de cima?”, ironizou.

Fonte: Sul21

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