Por José Álvaro de Lima Cardoso.*
Assim como ocorreu em 1964, entre os principais grupos de interesses no golpe desferido em 2016 contra o Estado brasileiro, um deles é o do império. Os irmãos Koch, por exemplo, proprietários da segunda maior empresa privada dos Estados Unidos, com faturamento anual de US$ 115 bilhões, financiaram grupos que participaram diretamente do o golpe atual no Brasil, como o “Movimento Brasil Livre” e “Estudantes pela liberdade”. De uma hora para outra, estes grupos surgiram no cenário político brasileiro com vigor surpreendente, e com aparência de espontâneos (sobre o assunto há muita informação disponível na internet). Segundo o experiente historiador Moniz Bandeira, toda a estratégia do golpe inspirou-se no manual do professor Gene Sharp, intitulado Da Ditadura à Democracia, para treinamento de agitadores, ativistas, em universidades americanas e até mesmo nas embaixadas dos Estados Unidos, para liderar ONGs.
O golpe no Brasil faz parte de um projeto de recolonização continental dos Estados Unidos, como vêm apontando, por exemplo, Adolfo Pérez Esquivel, argentino agraciado com o Nobel da Paz em 1980. Os Estados Unidos dependem dos recursos naturais da América Latina e, por esta razão, não querem perder o controle político da região. Os recentes golpes de Estado aplicados em Honduras e Paraguai, seguiram metodologias bastante semelhantes à aplicada no Brasil. São golpes desferidos sem participação das forças armadas, utilizando os meios de comunicação, parcela do judiciário e políticos da oposição para sacramentar o processo. Evidente que, no caso do Brasil, dada a vigorosa reação do movimento social e popular, e da juventude, os golpistas vêm utilizando a polícia militar para reprimir violentamente as crescentes manifestações.
O Brasil tomou iniciativas nos últimos anos, que desagradaram ao império: aproximação com os vizinhos sulamericanos, fortalecimento do Mercosul, ingresso nos Brics, votação da Lei de Partilha, projeto de fabricação de submarino nuclear em parceria com a França, etc. Tudo indica, que o pré-sal é a motivação principal da cobiça imperialista: possíveis 300 bilhões de barris de petróleo (70 bilhões já comprovados) que mudaram a inserção internacional do Brasil na produção de energia. Um sintoma de que o petróleo está no centro do golpe é a voracidade com que a nova administração da Petrobrás está se desfazendo do patrimônio da empresa. O Conselho de Administração da Petrobrás deverá aprovar ainda em setembro, a venda de 90% da sua maior e mais lucrativa malha de gás, a Nova Transportadora do Sudeste (NTS), subsidiária que responde pelo escoamento de 70% do gás natural do país.
Mas o interesse dos EUA no golpe não é só pelo petróleo, que costuma tomar por bem ou por mal. Está relacionado também com as reservas de água existentes na região, os minerais e toda a biodiversidade da Amazônia. O governo dos Estados Unidos negocia neste momento com o governo Macri a instalação de bases militares na Argentina, uma em Ushuaia (na Terra do Fogo) e a outra localizada na Tríplice Fronteira (Argentina, Brasil e Paraguai). Tudo indica que o grande interesse da instalação destas bases é o Aquífero Guarani, maior reserva subterrânea de água doce do mundo. O Aquífero se estende ao Brasil (840.000 Km²), Paraguai (72.500 Km²), Uruguai (58.500 Km²) e Argentina (225.000 km²). Os EUA e a Europa enfrentam grave problema da falta de água, a maioria dos rios dos EUA e do Velho Continente estão contaminados, e no caso dos EUA.
A operação Lava Jato deliberadamente dizimou parte da construção civil brasileira, fechando empresas e prendendo seus executivos, em nome do combate à corrupção. Não foram poucos os juristas que denunciaram as conexões internacionais da Lava Jato e suas inúmeras ilegalidades. Em 2013 vazou na imprensa informações da NSA (Agência de Segurança Nacional) pelo seu ex-técnico Edward Snowden, através dos quais se descobre que a Agência espionava preferencialmente a Petrobrás. De uma hora para outra aparece um juiz de primeira instância, com um volume enorme de informações sobre a Petrobrás, contando com o apoio e ampla cobertura da mídia.
Segundo escreveu o jornalista Luiz Nassif, a Lava Jato foi montada com base no mesmo receituário utilizado na chamadas Primaveras Árabes, que desestabilizou governos do Oriente Médio. Acesso, por exemplo, a um volume enorme de informações sobre a Petrobrás e a montagem de um esquema sofisticado de comunicação, com assessorias especializadas, e amplo apoio da grande mídia, ecoando com força as denúncias de corrupção, sempre seletivas.
Moniz Bandeira vem destacando os vínculos do juiz Sérgio Moro, com instituições norte-americanas. Em 2007 o magistrado frequentou cursos no Departamento de Estado. Em 2008, passou um mês num programa especial de treinamento em Harvard, na Escola de Direito. Em outubro de 2009, participou da conferência regional sobre “Ilicit Financial Crimes”, promovida no Brasil pela Embaixada dos Estados Unidos. Segundo o historiador, não foi casual a eleição, pela revista Time, de Sérgio Moro como um dos dez homens mais influentes do mundo.
No plano ideológico e social não podem restar dúvidas sobre o caráter conservador e antinacional da Lava Jato. Os vazamentos seletivos, sempre contra símbolos populares e nacionais, conseguiram despertar uma reação histérica da classe média, de caráter extremamente preconceituoso e intolerante, e contra tudo que que possa sugerir a soberania do Brasil. Não por acaso, o alvo central é a Petrobrás, empresa que simboliza a grande ousadia desenvolvimentista de um país de capitalismo periférico, e também zeladora constitucional da riqueza do pré-sal.
Mais do que uma operação contra a corrupção, a Lava Jato despertou a ira contra estratégias de desenvolvimento nacional, políticas de conteúdo nacional, utilização dos recursos do pré-sal para saúde e educação. Os indícios são muito fortes, de que a operação Lava Jato compõe as estratégias norte-americanas de apropriação do petróleo, água, e outros minerais existentes no Brasil. E também de interrupção de uma experiência de desenvolvimento soberano, ainda que com importantes limitações. Vale lembrar que povos que desconhecem sua própria história, estão destinados a cometerem os mesmos erros do passado.
—
*Economista.
Imagem: Arquivo da Internet.