Por Norbert Suchanek.
Menos de 30 dias antes da Olimpíada do Rio, a Baía de Guanabara e os seus últimos pescadores gritam SOS. Com participação de jornalistas do Rio e de outros países, a barqueata dos pescadores da Baía de Guanabara, no domingo 3 de julho, mostrou isto com toda a clareza. Os representantes de várias colônias de pescadores presentes com seus barcos no evento organizado pelo ambientalista Sérgio Ricardo da Baía Viva, pelo Fórum de Pescadores e Amigos do Mar e pela Associação de Pescadores Livres de Tubiacanga, se sentem abandonados e desrespeitados pelo estado e suas autoridades.
“A única coisa que eu não perdi foi a minha dignidade”, disse o pescador Geraldão, 62 anos da Colônia Z-10 dos pescadores da Ilha do Governador. No passado, sua rede de pesca estava cheia de peixes, hoje a rede é cheia de garrafas pet e sacos plásticos – e o peixe virou uma raridade. Geraldão: “Muitas vezes eu trago para casa dois peixes e cem quilos de lixo plástico. Eu tenho pena dos meus netos. Estes políticos estão acabando com o pescador.”
“Não tem peixe, não tem camarão!”, explica a situação desastrosa da Baía de Guanabara o pescador Ronaldo Moreno do Fórum dos Pescadores e Amigos do Mar. “A Petrobras se apropriou da baía. A gente vai colocar rede perto da ilha da Petrobras e toma tiro.”O governo investe na Olimpíada, mas para os pescadores da baía não tem dinheiro.
Até hoje a maioria das famílias de pescadores que sofreram por causa do grande derramamento de óleo da Petrobras em 18 de janeiro de 2000, ainda não foram indenizados. “É injusto que alguns pescadores recebam indenização como eu. Mas a maioria dos pescadores ainda não foram indenizados. Tem mais de 20 mil”, disse o pescador Alex Sandro Santos da Associação dos Pescadores Livres de Tubiacanga.
Além da poluição diária da indústria de petróleo e do esgoto não tratado da cidade maravilhosa, os participantes da barqueata denunciam uma “iniciativa pioneira” apoiada pela Petrobrás e pelo Banco Bradesco: a Gás Verde, empresa controlada pela Novo Gramacho Energia Ambiental em Duque de Caxias.
A usina Gás Verde, inaugurada em 2009, no Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho, em Duque de Caxias, recupera e purifica o gás metano que o aterro de Gramacho está produzindo sem parar diariamente à base da decomposição e pressão das milhares de toneladas de lixo. Segundo a Comlurb, o gás purificado – chamado no Brasil de biogás – é vendido à Petrobras, para ser usado como gás de processo na Refinaria Duque de Caxias, 70 milhões de metros cúbicos por ano. Além disso, o projeto da Novo Gramacho está recebendo apoio de créditos de carbono com aprovação da ONU porque “atende” todos os requisitos do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), previsto no Protocolo de Quioto.
Mas a realidade pode ser uma outra!
Porque a concessionária Novo Gramacho também é responsável para tratar e cuidar os rejeitos líquidos do processo e especialmente do chorume – um líquido altamente tóxico que o aterro também está produzindo diariamente por causa da decomposição do lixo. Mas segundo os pescadores da região, o tratamento necessário não está sendo feito.
“Hoje tem pescador que passa fome! Isso revolta, porque a Gás Verde ganhou esta concessão (da Comlurb) desde 2007, ela lucra com o gás e tinha obrigação na concessão de tratar o destino final do chorume. Ao invés de tratar, ela lucra com gás e simplesmente está devastando a região de pesca”, reclama o pescador David da Colônia de Pescadores de Duque de Caxias.
Em fevereiro deste ano, o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) multou em R$ 6,6 milhões a empresa Gás Verde por vazamentos de chorume com substâncias tóxicas na Baía de Guanabara e no Rio Sarapuí. Pelo menos seis vazamentos foram registrados. “Há um canal para conduzir o chorume tratado e, na verdade, o chorume está sendo direcionado bruto para esse braço morto do Rio Sarapuí, alcançando a Baía de Guanabara”, explicou Elaine Noce, coordenadora-geral de Fiscalização do Inea numa reportagem do O Globo.
Diversidade perdida!
O chorume de Gramacho e outros poluentes tóxicos afetam diretamente também a biodiversidade. A nossa refeição tradicional é cada vez menos variável. “Alguns anos atrás a gente tinha 12 espécies de pescada aqui. Hoje nós temos duas, porque o peixe não aguenta”, disse o pescador Gilciney Lopes, Presidente da Colônia de Pescadores de Duque de Caxias.
“Nós queremos uma Baía viva. Uma Baía para pesca e lazer: Nós não admitimos entregar a Baía para a indústria do petróleo”, resume o Fundador do Movimento Baía Viva Sergio Ricardo de Lima. “A Baía não pode ser um estacionamento de navios e de oleoduto.” É uma luta de Davi contra Golias.
Veja também o video Davi contra Golias: https://vimeo.com/173565356
Norbert Suchanek, Rio de Janeiro, Correspondente e Jornalista de Ciência e Ecologia, é colaborador internacional do EcoDebate.
www.norbertsuchanek.org
Foto: Márcia Gomes de Oliveira
Fonte: EcoDebate