Por João Gabriel Almeida, da Colômbia, para Desacato.info.
No meio da crise política, uma palavra se tornou o centro dos discursos: democracia. Cada um dos lados a reivindica. Quero somente trazer 5 pontos para fomentar o debate:
- Uma grande lição linguística para as forças políticas é que o significado de uma palavra é construído socialmente. O sentido da democracia não é dado junto com a palavra, mas está sempre em disputa.
- A discussão da deposição da presidente pode ser considerada anti-democrática não porque o é, mas porque se dá por uma via de judicialização. Em Constituições mais democráticas, como da Venezuela, há instrumentos como o referendo convocatório para cumprir este papel, que é totalmente legítimo. Ou seja, há uma dupla moral no discurso governista. Por um lado é correto, pois a oposição utiliza de instrumentos autoritários e indevidos para assumir o poder, mas não existe possibilidade de fazê-lo por vias democráticas, pois nos últimos 14 anos não se avançou nem uma gota em uma reforma política real, que ampliasse a nossa frágil democracia.
- A judicialização é um ovo da serpente cultivado pelo próprio PT. Na incapacidade de construir maioria política própria, muitos avanços, principalmente nos direitos das minorias, já estavam sendo conquistados por vias judiciais, sem passar pela câmara. Dialogando com o ponto anterior, jogar nas mãos do judiciário o destino político nacional por medo de ampliar processos democráticos não foi uma ação inventada pela oposição.
- Por mais que Michel Temer e Cunha sejam figuras asquerosas, também é verdade que eles foram eleitos tão democraticamente como a Dilma. A diferença é que sim, eles têm crimes declarados e já investigados que justificam uma ação judicial, mas é necessário reconhecer que o espaço que eles ganharam no cenário político brasileiro se deu dentro do jogo democrático atual. Ou seja, defender a democracia institucional por ela mesma é também defendê-los.
- A maior gravidade do momento político não é sua polarização. A polarização é a consequência de uma politização necessária para o debate político. O problema central é o vazio de discursos. Há, hoje, um “empate catastrófico”, a impossibilidade de se gerar um discurso político que defina as coordenadas do jogo. É verdadeiramente o que está em disputa hoje, qual narrativa vai sobressair ao cenário e se consolidar como a “verdade” do momento.
O desafio do próximo período é não cair no conformismo de tentar impor seu grupo político de maneira conservadora, mas sim que este momento tão delicado produza novos parâmetros de como fazer política. Ainda não se apresenta nenhum horizonte neste sentido, mas se não tivermos claros o que ambicionar vamos afundar no já velho imediatismo que nos trouxe até esta situação.