Por Paula Guimarães.
Uma década e meia de música autoral, sem contar com recursos de leis de incentivo à cultura e, muito menos, investimentos de gravadoras. Isso se chama música independente. O aniversário de resistência artística de Tatiana Cobbett e Marcoliva, da Sonora Parceria, será comemorado com dois shows para a gravação do quinto álbum, o Sawabona Shikoba, com entrada franca, no Sesc Prainha, dias 19 e 20 de setembro, às 20h.
Transitar de forma independente faz parte de um posicionamento político: eles não buscam ser “Pop Star”, muito pelo contrário se colocam contra a massificação, na qual aposta o mercado fonográfico de forma geral, e em defesa da democratização da música. “É por isso que respiramos. Como mudar o mundo, sem que sejamos engajados? Através da arte queremos mostrar que o mundo não precisa ser tão mercadológico”, assinala a cantora.
Tatiana leva para o palco sua linguagem corporal de bailarina e, junto com Marcoliva, inaugurou um novo estilo de se apresentar, com dança, teatro e poesia. Os cantores – ela carioca, ele gaúcho – que vivem na ilha há mais de 20 anos, transformaram o cenário da arte catarinense com a criação de arranjos e letras ímpares. Dos grandes movimentos, como Tropicália, Clube da Esquina e Mangue Beat, resgatam o protesto, a poesia concreta, a mistura de ritmos e a necessidade de fazer música popular para além dos padrões e modismos.
Defesa da música autoral
Marcoliva e Tatiana apostam na arte que transforma e há 15 anos, quando os bares de Santa Catarina só aceitavam formação cover, a dupla iniciou uma nova fase na música catarinense com a defesa da composição própria, formando uma rede que uniu os principais instrumentistas do estado, como Guinha Ramires, Alegre Correa e Rafael Calegari.
“As pessoas que conhecemos ao longo desses 15 anos fizeram toda diferença. Por causa desses contatos, assim que começamos fizemos apresentações no Uruguai e na Argentina, onde nossa música foi muito bem aceita. Da mesma forma no nordeste, onde tínhamos amigos que nos receberam e ajudaram a mostrar nosso trabalho autoral. De volta à Florianópolis é que encontramos a resistência. Mas essa aceitação que tivemos em outros lugares nos fez acreditar que era possível”, conta Marcoliva, que veio para Canasvieiras para tocar na noite. “Ser reconhecido, antes de tudo, no meio artístico, também é muito importante pra nós e esse reconhecimento a gente conquistou”, completa.
Parceria que move
Pedro Loch (guitarra), Rafael Calegari (contrabaixo) e Luis Gama (percussão e bateria) formam a base instrumental do Sawabona Shikoba, que tem como convidados Fidel Pinêro (trompete), ?Luiz Zago (piano), Larissa Galvão (flauta) e Gabriel Vieira (violino). Todos os instrumentistas já foram parceiros em outros álbuns.
Sawabona Shikoba é um tradicional cumprimento originário do sul da África. A origem do nome do álbum está relacionada ao conceito de parceria que marca a trajetória dos artistas, Sawabona quer dizer “Eu te respeito, eu te valorizo, você é importante para mim”. Em resposta, as pessoas dizem Shikoba, que é “Então, eu existo para você”.
A sede por parceiras levou a dupla a percorrer o país, do Rio Grande do Sul ao Rio Grande do Norte, em busca de trocas musicais com os principais artistas da região, o que resultou no álbum Bendita Companhia (2008), composto por 19 faixas. Na trajetória, estão também Parceiros (2001), Música Súbita (2012) e Corte e Costura (2013).
Guinha Ramires – violonista, compositor e arranjador – integrou-se como parceiro com a composição “Tempo” no álbum Bendita Companhia e como instrumentista no CD Corte e Costura e Música Súbita, entre outros trabalhos.“Compor junto é sempre um aprendizado e Tatiana e Marcoliva são muito criativos. Nas últimas duas vezes em que os vi, fiquei muito emocionado com o nível profissional de entrosamento a que eles chegaram. Poucos artistas têm essa garra de ir atrás da música como a Sonora Parceria e, por isso, eles conquistaram tantos seguidores”, afirma o multi-instrumentista.
O violonista Pedro Loch conta que a parceria com a dupla começou há cinco anos, quando se conheceram no Panorama Sesc de Música, em Jaraguá no Sul. Na volta para Florianópolis, os laços se estreitaram e eles montaram o espetáculo “Música Súbita” que unia a Sonora Parceria ao grupo Kiabo Instrumental, formado por ele, Mateus Mira, Larissa Galvão e Rafael Meksenas.
De lá para cá foram algumas viagens, shows e composições juntos: em parceria. Pedro revela que o formato performático de apresentação e a defesa da música autoral pela dupla, o fez ampliar seu olhar para outras faces do fazer artístico. “Na época, eu fazia pouca música autoral. Passei a pensar de uma forma muito mais ampla em arte e como a música deve estar coerente com vários outros aspectos, além dos sonoros”, explica o violonista. Tatiana compôs letras para algumas músicas dele, como “Isso ou aquilo”, “Domingo”, “Aliás”, entre outras.
Qualidade da música catarinense
Ainda hoje, os artistas fora do eixo “Rio-São Paulo” reconhecem a necessidade de educar o público para que esse permita-se a descobrir o novo. “A composição catarinense tem tanta qualidade quanto a música produzida nessas capitais. Tem muita gente boa apresentando nossa música no Brasil e Tatiana e Marcoliva estão entre eles. Quem não conhece e ouve pela primeira vez passa a gostar”, afirma o contrabaixista Rafael Calegari.
Calegari conta que há 12 anos quando conheceu a dupla se surpreendeu com a capacidade de criação dos artistas, de fazer música a qualquer hora e lugar. Segundo o instrumentista, a Sonora Parceria descortinou uma perspectiva que acena para a importância da composição e do posicionamento do artista.“Abriu um mundo que até então eu não conhecia. Minha vida mudou tanto como compositor, quanto como instrumentista e artista. No show de 15 anos, comemoramos mais do que música, o respeito, a admiração e a amizade”, revela.
Responsabilidade do público
Para finalizar o CD que será gravado nos shows, a dupla recorreu a uma campanha de financiamento coletivo, onde pede R$16 mil. Dois álbuns da dupla já foram financiados com a colaboração do público na mesma plataforma, o Catarse.
Os shows com entrada franca, resultado do investimento do Sesc em cultura, foram a maneira encontrada pela dupla para comemorar junto com o público, num ambiente intimista, e, mais do que isso, mobilizá-lo para apoiar a finalização do CD, que só irá ocorrer se a meta do financiamento for atingida até 10 de outubro.
“Tem gente que paga para ver. Estamos propondo que vejam para depois pagar. Não buscamos a colaboração do amiguinho, mas do público, aquele que compreende a importância do nosso trabalho”, afirma Tatiana. Com apenas R$30 é possível adquirir um CD e, com R$10, a coletânea on-line “EP Fragmentos da Memória”, contendo quatro descobertas inéditas desses 15 anos de estrada.
O Teatro do Sesc tem capacidade para 100 pessoas. Os convites podem ser retirados no local uma hora antes do início do show.
Serviço
Quando: dia 19 e 20 de setembro
Onde: SESC Prainha
Horário: 20h
Quanto: Gratuito
Site Oficial
http://www.sonoraparceria.com/
Financiamento Coletivo
www.catarse.me/pt/sonoraparceria15anos
Evento no Facebook
https://www.facebook.com/events/692995887500848/
Fotos de destaque: João Markun (Ensaio Intervenções Urbanas: Sawabona Shikoba)