A partir da decisão de alguns partidos políticos de não mais utilizar doações em dinheiro de pessoas jurídicas, pode estar surgindo uma nova etapa da política brasileira, ao se possibilitar uma frente formada, por exemplo, por PT, PCdoB e PSOL; quanto ao nome que esta frente teria, há diferenças importantes entre se chamar “Progressista” ou “de Esquerda”
Por Nicolas Chernavsky, CulturaPolitica.info.
O progressismo brasileiro chegou a uma encruzilhada histórica. O modelo de financiamento dos partidos através de doações de pessoas jurídicas tem uma resistência tal da sociedade brasileira que levará a crescentes derrotas eleitorais do progressismo, se este não mudar sua forma de financiamento. Nesse contexto, estão de fato surgindo movimentos nos partidos mais progressistas do país no sentido de se financiarem sem doação de dinheiro de pessoas jurídicas, focando nas doações de pessoas físicas. Nesse sentido, é possível que PT, PCdoB e PSOL venham nos próximos anos a estar nessa situação, o que possibilitaria a criação de uma frente política entre estes partidos para manter a maioria progressista especialmente nas eleições presidenciais, pois mesmo tendo o progressismo vencido quatro eleições presidenciais seguidas, ainda está muito longe de alcançar o tempo em que o conservadorismo predominou anteriormente na política brasileira, entre 1964 e 2002 (ao todo 38 anos).
Quanto a essa possível frente entre PT, PCdoB e PSOL, também ouve-se a proposta de que se chame “Frente de Esquerda”. Haveria também outras opções, como “Frente Popular”, por exemplo. Afinal, qual seria o nome mais adequado para essa frente? E por que o nome é importante? Porque o nome passa uma mensagem profunda à sociedade sobre a natureza da frente. Assim, dada a história das expressões “progressista” e “de esquerda”, não dá na mesma usar uma ou outra. O termo “popular” seria mais neutro, apesar de dever essa neutralidade muito a uma perda de especificidade no espectro político, já que “popular” é um termo caro também a influentes partidos conservadores do mundo, como o Partido Popular da Espanha e o Partido Popular Europeu. Mas qual seria então a diferença entre “Frente Progressista” e “Frente de Esquerda”?
Para esclarecer essa questão, é preciso obviamente saber se há diferença, e qual diferença haveria, entre “progressismo” e “esquerda”. A observação do uso histórico e atual do termo “esquerda” indica que ele vem sendo usado em dois sentidos diferentes, sendo que essa distinção não costuma ser percebida frequentemente nas análises políticas. Um dos sentidos usados é de fato como sinônimo de “progressismo”. O outro sentido é na ênfase aos interesses coletivos, e não nos interesses individuais. Podemos perceber também que o uso de cada um destes dois sentidos em geral depende do progressismo ou conservadorismo de quem fala. Assim, pessoas mais progressistas tendem a usar mais o primeiro sentido (“esquerda” com um sentido igual ou próximo a “progressismo”), enquanto que pessoas mais conservadoras tendem a usar mais o segundo sentido (“esquerda” como a ênfase nos interesses coletivos, e não nos interesses individuais). Para reforçar a percepção de realidade deste raciocínio, podemos perceber que uma situação análoga ocorre com o uso do termo “direita”. Há dois sentidos para seu uso. Um deles é como um sinônimo de “conservadorismo” (sentido mais usado quanto mais progressista é a pessoa) e o outro sentido é a ênfase nos interesses individuais, e não nos coletivos (sentido mais usado quanto mais conservadora é a pessoa). Assim, para haver maior clareza no discurso, proponho que quando o sentido pretendido para “esquerda” ou “direita” for um sinônimo de “progressismo” ou “conservadorismo”, sejam usados diretamente os termos “progressismo” e “conservadorismo”, deixando os termos “esquerda” e “direita” para o outro sentido dos termos, aquele em que se enfatizam os interesses coletivos sobre os individuais (esquerda) ou os interesses individuais sobre os coletivos (direita).
Dessa forma, o nome “Frente Progressista” seria menos ambíguo que o nome “Frente de Esquerda”. Entretanto, um esclarecimento da diferença entre os termos “progressismo” e “esquerda” não necessariamente leva a que alguém prefira o progressismo à esquerda, ou vice-versa. Essa é uma outra questão. Para analisá-la, é preciso fazer para “progressismo” o que foi feito para “esquerda” no parágrafo anterior, ou seja; se o sentido específico (não ambíguo) de “esquerda” é a ênfase nos interesses coletivos, e não nos interesses individuais, qual é o sentido de “progressimo”? Seria a ênfase na conciliação entre os interesses coletivos e os interesses individuais, sem uma ênfase maior em uns ou em outros. E aí surge outra pergunta interessante. E o conservadorismo, o que seria? Seria o oposto de progressismo, ou seja, a falta de ênfase na conciliação entre os interesses coletivos e interesses individuais. Resumindo: quanto mais progressista se é, mais facilidade se tem para conciliar os interesses coletivos e os individuais. Quanto mais conservador se é, menos facilidade se tem para conciliar os interesses coletivos e os individuais. Se no espectro político progressismo-conservadorismo a pessoa pender para a região mais progressista, ela é progressista. Se enfatizar mais os interesses coletivos ela é progressista de esquerda. Se enfatizar mais os interesses individuais, é progressista de direita. Se houver equilíbrio (equilíbrio, não conciliação) entre os interesses coletivos e individuais, é progressista de centro. Analogamente, os conservadores podem ser conservadores de esquerda, de direita ou de centro. O tema é longo e importante, mas para este artigo, o importante é que fique clara não só a diferença entre progressismo e esquerda mas também o fato de que precisamos nos perguntar lá no fundo o quão interdependentes são os interesses coletivos e os individuais, e portanto, o quanto realmente podemos enfatizar uns ou outros. Quanto menos priorizarmos os interesses coletivos ou os individuais, e sim os conciliarmos, mais progressistas seremos, em uma “Frente Progressista”, quem sabe com PT, PCdoB e PSOL juntos sem financiamento de pessoa jurídica, focando no financiamento por pessoa física.
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