É um fato da economia internacional que o epicentro da crise do capital, a Europa, funciona como uma espécie de “caixa de ressonância” dos efeitos da crise, em distintos âmbitos. No entanto, o pedregulho jogado no mar da crise econômica na Europa teve sua ressonância (os efeitos de suas ondas) sempre “tardiamente” no nosso país. Foi assim que o “junho” brasileiro chegou dois anos depois de um levante internacional da juventude. E assim também chegou atrasada a recessão ao Brasil: ela vem rastejante, mas sem perspectiva de melhora.
No relatório de inflação do banco central do final de março é apontado que a perspectiva de crescimento do PIB para o país é de 0,5%. Alguns analistas do mercado já preveem uma queda de mais de 1%. E há quem diga que as previsões são otimistas, se levarmos em conta uma série de fatores que podem impactar a economia nacional.
O fato é que alguns pilares do ciclo anterior estão “desmoronando”. Como primeiro elemento, o enorme fluxo de capital advindos da Europa e EUA em crise para o Brasil (que com suas enormes taxas de juros era um pólo atrativo à especulação) agora tem afetado distintos setores da economia que cresceram com base ao boom de dólares e aumentaram suas dívidas enormemente com a valorização do dólar, que possivelmente fechará o semestre mais forte com relação ao real desde 1999, quando da adoção do sistema de cambio flutuante.
Isso tem um impacto no conjunto da economia, pois afeta as empresas com dívidas em dólar, os investimentos e o consumo interno no país, que no último ciclo tem se baseado no “mar de crédito”, e que vem atingindo seus limites e especialmente vai exercer influência nos preços e na inflação já galopante.
Do ponto de vista da indústria, o longo movimento de desindustrialização no país (desde os finais dos anos 1980) pode sofrer nova clivagem negativa, pois as perspectivas são novamente negativas. Estima-se queda de 2,3% na indústria em 2015, sendo que uma queda de 3,4% da indústria de transformação e 5,5% na de construção, vindo num resultado negativo desde o ano passado (e com baixo crescimento há alguns anos).
Ou seja, mesmo com a desvalorização do real, que poderia favorecer determinados seguimentos industriais para a exportação, a perspectiva é de forte recuo. Particularmente, a indústria automobilística sofreu, segundo Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), um recuo de 28,9% em comparação com fevereiro do ano que passado. O quadro se agrava quando analisamos que o principal destino dos carros produzidos no Brasil é a Argentina (46%), que sofre importantes dificuldades econômicas.
O caminho que resta ao Brasil é aprimorar a indústria extrativa e particularmente a pecuária, como forma de buscar adentrar na disputa internacional de alimentos (com gigantes do Brasil na área), mesmo com previsão de crescimento em 5% na indústria extrativa e 1% na agropecuária, isto não tem mudado o quadro de desindustrialização no país e, além disso, acabam por formar fortes oligopólios em setores de baixo valor agregado, menos estratégicos em comparação com a produção em potencias imperialistas.
Outros dois importantes segmentos econômicos do país, o petróleo e a construção civil, estão em xeque agora a partir da investigação da operação Lava Jato, que tem a Petrobrás e principais empreiteiras (Odebrecht, Camargo Correio, Queiroz Galvão etc.) envolvidas no centro do escândalo. A Petrobrás acaba de assinar um contrato de mais de 3 bilhões de dólares com o Banco de Desenvolvimento Chinês, mas o banco colocou como crivo a investigação da empresa. Há que ver como os impactos políticos, junto às oscilações das commodities (que é o nome que é dado a estas matérias primas tais como o ferro, petróleo, cobre, soja, etc) no plano internacional poderão afetar esse outro pilar da economia brasileira.
Ou seja, no quadro geral, são diversos terrenos de instabilidade na economia nacional. E a combinação para os trabalhadores agora parece ser de menos crédito e mais inflação e desemprego. Segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), a economia brasileira gerou 41,3 mil empregos em janeiro de 2015, ante 731,4 mil em janeiro de 2014, com forte eliminação de vagas na indústria de transformação e construção. E para piorar com uma restrição aos novos desempregados a partir de medidas provisórias de Dilma que restringem este direito.
A “solução” já ganhou, portanto, seu signo no governo: ajustes econômicos contra os direitos dos trabalhadores (sob o nome de ajustes fiscais e monetários). Agora é notável que mesmo nessa solução exista uma enorme ausência de perspectiva de fortalecimento da economia nacional, que expressa indiretamente também enorme queda de popularidade de Dilma, que já vinha questionada desde junho de 2013 e na atualidade tem uma política econômica que é como se dissesse “hoje eu tiro os direitos e, amanhã, quando a recessão aprofundar, eu tiro outros mais”.
Ainda que na superfície do país o quadro ainda não pareça de “crise”, nas estruturas econômicas a situação vai se tornando casa vez mais complicada. A recessão parece que veio pra ficar, e seu impacto poderá trazer enormes consequências para a economia, mas também para o tabuleiro político nacional e a situação dos trabalhadores no país.
A única contraposição necessária a esse caminho recessivo que enfrentará o país é retirar imediatamente as MPs 664 e 665, que retiraram os direitos trabalhistas e iniciar um caminho de ruptura com a estrutura de dominação financeira no Brasil, cancelando o pagamento da dívida pública, taxando as grandes fortunas e revertendo os gastos em investimentos nas demandas fundamentais da população, o que deve vir em paralelo a um fortalecimento da ação dos trabalhadores no controle dos serviços públicos e no sistema bancário, criando as bases de uma verdadeira independência do país frente ao capital financeiro e às potências econômicas.
Fonte: Esquerda Diário
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