Auditoria da dívida pública brasileira

Gráfico 2Por Thiago Burckhart, para Desacato.info.

Um dos temas fundamentais do debate político nacional, que foi inclusive abordado durante a campanha presidencial do ano passado, é a questão da dívida pública brasileira que ainda causa um gigantesco rombo no orçamento público nacional, onde mais de 40% do mesmo é destinado ao pagamento de juros e amortizações decorrentes da mesma. Fruto de uma operação iniciada na ditadura militar totalmente sem transparência, a dívida é um dos principais instrumentos do modelo neoliberal – marcado pela financeirização da economia – que hoje também assola os países do sul da Europa.

Assim, o pagamento dos juros da dívida que anualmente ultrapassa os 40% do PIB do Brasil – sétima maior economia do mundo – debilita incondicionalmente os investimentos nas áreas sociais do país, que hoje vivem de investimentos pífios em saúde, educação, seguridade, cultura, entre outros. Este modelo é altamente rentável para os detentores de títulos da dívida, que se beneficiam dos maiores juros do mundo, sem entretanto haver qualquer tipo de contraprestação para com a sociedade. Dessa forma, estamos distribuindo renda para os ricos e não para os pobres, um processo totalmente o inverso do que deveria ser, haja vista que os pagadores dessa dívida somos nós: cidadãos.

O aspecto mais intrigante da dívida é que ela é fruto de mecanismos meramente financeiros – de taxas de juros abusivas, contratos inexistentes e de juros sobre juros, o famoso anatocismo, que inclusive já foi considerado ilegal pelo Supremo Tribunal Federal pela Súmula 121 – não havendo controle de capital, e nem mesmo são revelados os detentores dos títulos públicos, são sigilosos. Enquanto isso, a dívida pública continua aumentando e os gastos do governo federal com a mesma também estão aumentando, mesmo que frequentemente economistas ligados ao governo afirmem o contrário.

Esse cenário evidencia uma verdadeira crise na dívida pública, de modo que essa aprofunda ainda mais a desigualdade social pois as famílias mais ricas do país estão ainda com o recheio do bolo nas suas mãos, de modo que as bordas são minimamente distribuídas para o povo. Esse é um grande paradoxo no cenário político-econômico brasileiro, que apesar de ser a sétima maior economia do mundo ainda convive com índices de Desenvolvimento Humano e de Educação péssimos.

Por uma auditoria da dívida

A Constituição Federal estabelece em seu artigo 26 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) a necessidade da feitura de uma auditoria pública para a averiguação dos fatos geradores do endividamento público brasileiro. Para isso, a Constituições estabeleceu o prazo de um ano logo após sua promulgação, contudo a auditoria nunca foi realizada. Em 2000 foi feito um Plebiscito Popular de nível nacional que contou com a participação de mais de 6 milhões de pessoas que demonstraram ser favoráveis à realização da auditoria pública. Logo após o Plebiscito, os líderes do movimento manifestaram-se diretamente com a Presidência da República e com o Congresso Nacional, mas nenhuma providência institucional foi tomada.

Entretanto, o Equador recentemente realizou uma auditoria em sua dívida pública. Em 2007 foi criada pelo presidente Rafael Correa uma comissão no país responsável por realizar a auditoria. Após um ano de trabalho, no final de 2008, a Comissão entregou o relatório final ao presidente pelo qual ficou evidenciado que 70% de toda a sua dívida não existia, ou seja, era fruto de pagamento indevido. O presidente imediatamente suspendeu o pagamento da parcela indevida da dívida. Nos anos seguintes os gastos sociais no Equador aumentaram expressivamente, quase triplicaram em relação aos anos anteriores. O Equador provou ao mundo que o instrumento da auditoria é eficaz e ainda deu uma lição de soberania.

No Brasil em 2009 foi criada uma Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a dívida pública – CPI da dívida –, pelo deputado Ivan Valente (PSOL/SP) responsável por investigar a dívida pública da União, estados e municípios, o pagamento de juros, os beneficiários destes pagamentos e seu monumental impacto nas políticas sociais e no desenvolvimento sustentável do país. Também temos um precedente histórico no ano de 1931, pelo qual foi realizada uma auditoria da dívida externa brasileira e constatou que 40% da mesma não existia, era indevida e fruto de irregularidades.

Assim, existem diversos movimentos como o Auditoria Cidadã da Dívida que lutam pela realização de uma auditoria na dívida pública brasileira externa e interna, de modo a evidenciar as irregularidades existentes. Os movimentos encontram diversas dificuldades de concretizar o feito, haja vista os fatores políticos e econômicos que permeiam esse processo como o financiamento privado de campanhas políticas e a cobertura da grande mídia que dificulta a tomada de posição “antissistema” pelos governantes. Dessa forma, cabe a nós o engajamento social e a participação nesse processo que é um verdadeiro assalto aos cofres público, de modo a construir uma sociedade mais justa e igualitária.

Thiago Burckhart é estudante de Direito.

 Imagem: Arquivo de Internet.

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