Por Pedro Varoni e Vitor Prado.
O Projor – Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo em parceria com o Volt Data Lab publica nesta edição especial do Observatório da Imprensa o “Atlas da Notícia“, levantamento inédito com base em jornalismo de dados sobre a presença ou ausência da imprensa em todo o território nacional.
Foram identificados, nessa primeira etapa do projeto, 5.354 veículos — entre jornais impressos e sites —, em 1.125 cidades de 27 unidades federativas. Um universo que compreende aproximadamente 130 milhões de pessoas, mais de 60% da população brasileira.
Para se entender o conceito de “desertos de notícias”, é preciso, entretanto, olhar para os espaços não contemplados na pesquisa: 4.500 municípios representando 70 milhões de habitantes não têm registros de meios noticiosos impressos ou digitais.
“O Atlas da Notícia é, antes de mais nada, uma ferramenta para conseguirmos enxergar quais as localidades mais carentes de jornalismo no Brasil”, explica Sérgio Spagnuolo, editor do Volt Data Lab, agência de jornalismo de dados que conduziu o levantamento e a pesquisa. “Dessa forma, ao criar conhecimento sobre esses desertos informativos, o Atlas servirá como ponto de partida para entendermos melhor a configuração do jornalismo no país.”
Esta legião de brasileiros — quase 35% da população nacional — não dispõe de notícias sobre sua própria comunidade, vivendo nos chamados “desertos de notícias”, onde não se cobre, entre outras coisas, nem a Prefeitura ou a Câmara Municipal. Não há, nesses territórios, a produção jornalística, o que compromete a capacidade decisória dos cidadãos.
O Atlas é um ponto de partida necessário para possíveis pesquisas imersivas nesses vazios e também nas comunidades em que o jornalismo está presente. Em função do caráter quantitativo do nosso primeiro levantamento, ainda não se pode avaliar a integridade — qualitativa — da prática profissional jornalística.
Num momento de mudanças de paradigmas e de emergência da ideia de pós-verdade, é necessário se voltar a perguntas básicas, como: para que servem as notícias locais ou regionais? Como elas se relacionam com uma noção mais ampla de cidadania?
O projeto se inspira no America’s Growing Deserts of News da revista Columbia Journalism Review. Os números apurados pelo Volt Data Lab se baseiam em três fontes de informações: Secretaria de Comunicação do Governo Federal, Associação Nacional de Jornais (ANJ), além de uma campanha de crowdsourcing.
Metodologia
Nesta primeira etapa, foram considerados apenas os jornais e sites de notícia e buscou-se, além de números absolutos, um recorte proporcional considerando a presença de veículos a cada cem mil habitantes.
O Volt Data Lab observa que não se trata, nesse caso, propriamente de alcance populacional mas da diversidade de veículos nos territórios pesquisados. Outras questões como circulação, abrangência geográfica efetiva e taxa de consumo deverão ser contempladas em outras etapas do projeto.
Os dados dos veículos impressos e online também foram cruzados com o IDHM – Índice de Desenvolvimento Humano Municipal, considerando três indicadores socioeconômicos: população, escolaridade e renda. Mas, por dificuldades cadastrais, 47 cidades ficaram de fora dessa relação com o IDHM. As relações de 100 mil habitantes por veículo foram apuradas apenas em cidades com mais de cem mil habitantes para evitar distorções metodológicas.
Os números
Eles indicam o predomínio dos meios impressos (63% contra 37 % dos digitais). Como já se poderia prever, em termos absolutos, São Paulo é o estado com maior número de veículos noticiosos (1.641), seguido do Rio Grande do Sul (600) e Santa Catarina (547).
Mas se levarmos em conta a concentração populacional, Santa Catarina, Distrito Federal e Rio Grande do Sul são as unidades da federação com maior concentração de veículos a cada cem mil habitantes, média de 8,8. Em compensação, todos os estados do nordeste possuem, em média, um veículo mapeado a cada 100 mil habitantes.
De um ponto de vista da proporcionalidade, Santa Catarina é a unidade da federação com maior número de jornais impressos do Brasil, seguida do Rio Grande do Sul e Distrito Federal.
Já nos veículos online, a liderança proporcional é do Distrito Federal, seguido de Rondônia e Santa Catarina. O Maranhão é o estado com menor número de veículos online, considerando a relação por cem mil habitantes.
No recorte por regiões do Brasil, há, novamente, uma diferença entre os números absolutos e os proporcionais considerando a relação para cada cem mil habitantes e a presença de veículos impressos e digitais. O sudeste ocupa o primeiro lugar nos números absolutos, com 2.643 veículos impressos e online, mas se considerarmos a proporcionalidade na relação a cada cem mil habitantes ocupa o terceiro lugar.
A liderança, nesse caso, é da região sul com média de 5,49 veículos para cada cem mil habitantes, seguida do centro-oeste com 4,5 veículos, norte com 1,31 veículos. A média mais baixa está no nordeste com 0,72 veículos. Os números do impresso acompanham a tendência do ranking geral. Mas se consideramos, os veículos online a liderança passa a ser da região centro-oeste, seguida pelo sul, sudeste, norte e nordeste.
As regiões metropolitanas também foram ranqueadas a partir do critério da proporcionalidade de presença de veículos impressos e digitais a cada cem mil habitantes. A liderança, nesse caso, é do Distrito Federal, seguida de Porto Alegre, São Paulo, Curitiba, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Das capitais de outras regiões do país, Belém aparece na sétima posição, seguida de Salvador, Fortaleza e Recife.
Das cidades do interior com mais veículos mapeados digitais e impressos são Campinas e Santos, empatadas em 12º lugar, com 30 veículos mapeados, seguida por Ribeirão Preto, em 19º lugar, com 22 veículos.
Ao considerarmos apenas os veículos impressos Porto Alegre assume o 1º lugar no país, seguida do Distrito Federal, Curitiba, São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro.
Quando se trata de veículos online, porém, o Distrito Federal ocupa a primeira posição, São Paulo a segunda e Porto Alegre a terceira.
O diagnóstico da situação atual do desertos de notícias no Brasil poderá ser melhor compreendido a partir de parcerias e análises de profissionais e pesquisadores de todo o país. O Atlas marca o início de um processo de conhecimento não só das boas práticas de jornalismo, como da falta que elas podem fazer para a construção de um país mais cidadão e justo.
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Pedro Varoni é jornalista e editor do Observatório da Imprensa | Vitor Haddad do Prado é jornalista e editor assistente do Observatório da Imprensa.