Entrevista com Luiz Carlos Vieira, Coordenador Estadual do SINTE
Por Raul Fitipaldi, para Desacato.info.
Ontem, terça-feira, 19 de maio, se passaram 58 dias do início da greve dos professores de Santa Catarina. A mobilização inclui acampamentos na SED na Assembleia Legislativa de Santa Catarina. A exposição do governo cresce e não se avança no sentido de uma solução definitiva.
O Portal Desacato entrevistou o professor Luiz Carlos Vieira, Coordenador Estadual do SINTE. Vieira afirma que o Governo Estadual, “que é um governo de cunho liberal, tem uma visão empresarial da educação,” e que “a grande mídia trabalha para que a população se coloque contrária às reivindicações dos professores”.
DESACATO – Podemos catalogar como histórica esta greve dos professores de Santa Catarina?
Luiz Carlos Vieira – Sim, todas as greves são históricas e esta greve é histórica, porque nós já estamos há 58 dias e ainda não temos uma resposta concreta do Governo de Santa Catarina. É histórica também pelas ações que esta greve proporcionou, como por exemplo, os acampamentos da SED e da ALESC. Mesmo sem ter nenhuma negociação, está expondo o Governo do Estado à sociedade catarinense.
– O governo estadual tem uma visão empresarial da educação que passa por cima dos fundamentos essenciais da educação pública, gratuita e de qualidade?
L.C.V. – O Governo Estadual, que é um governo de cunho liberal, tem uma visão empresarial da educação, porque discute a educação como despesa e não como investimento, tendo em vista que todos os anos as contas do Governo do Estado, no que se refere investimento da educação, tem deixado a desejar. O Governo nunca investe aquilo que normalmente tem por obrigação na educação. Quando ele quer trabalhar na educação visando o professor ele coloca a meritocracia: a quantidade que o professor deve aprovar. Coloca a assiduidade, que a progressão tem que ser pelo mérito do trabalhador e não coloca em xeque a estrutura, que é um dever dele. É uma visão empresarial. O Governo pensa que os problemas da educação se resolverão apenas com um projeto de gestão e não com um planejamento de longo prazo, onde todos os envolvidos possam sugerir alternativas para os problemas.
– A ameaça de contratação de ACTS coloca em perigo a qualidade do ensino e os direitos de estabilidade básico dos trabalhadores concursados?
L.C.V. – A ameaça da contratação dos ACTs coloca em perigo a qualidade do ensino quando estes não têm qualificação e são contratados sem um processo seletivo que vise as questões pedagógicas. Os ACTs são contratados com um salário menor do que os concursados, e por isso, corre-se o risco de ter um profissional com uma formação que não seja adequada.
“Se já tem greve, não existe vitória absoluta para ninguém.”
– Quem é o principal prejudicado do processo de greve: os estudantes, os professores, o governo estadual, a educação em geral?
L.C.V. – Todos são prejudicados. Os estudantes, por sua vez, são prejudicados no sentido de que eles ficam sem os conteúdos, e quando esses conteúdos são aplicados na reposição, muitas vezes é de uma forma aligeirada, e sem acúmulo. Já os professores são prejudicados porque são descontados seus dias e quando tem que fazer a reposição, há um acúmulo de trabalho também. O Governo do Estado também é prejudicado porque ele tem a problemática na relação de trabalho e também não só na questão financeira, mas no desgaste político, assim também como os trabalhadores. Quando há um processo de greve, há um prejuízo para todos. A melhor saída é o governo atender todas as reivindicações da categoria sem ter a necessidade da greve. Se já tem greve, não existe vitória absoluta para ninguém.
– A categoria sente que esta greve conta com o apoio da população, especialmente dos pais dos alunos?
L.C.V. – Em parte a categoria sente o apoio da população, especialmente dos pais e dos alunos, mas a grande mídia trabalha para que a população se coloque contrária às reivindicações dos professores, não entendem a greve como um fator de negociação , um fator de melhoria na qualidade da educação e querem colocar a comunidade, os pais e os alunos contra os trabalhadores. A população que vive a educação, que acompanha seus filhos nas escolas, acompanha a situação da educação no Estado, ela sim apoia as reivindicações dos professores, que não é apenas corporativista da categoria e sim para uma educação de qualidade de modo geral.
– É coerente, no ano em que o Governo Federal lançou o slogan “Pátria Educadora” que existam greves de professores tão marcantes como as do Paraná e esta de Santa Catarina?
L.C.V. – Não é coerente, pois o slogan “Pátria Educadora” parte do Governo Federal, e do Governo Federal é que vem a maioria das verbas para todos os programas e projetos da educação, sejam elas dos estados ou dos municípios. As greves estaduais e municipais que estão ocorrendo no Brasil, todas têm pautas específicas, ou são por demandas reprimidas do passado que os governos estaduais e municipais não responderam, ou são pautas que surgiram neste momento que os estados e municípios não respeitam os direitos dos trabalhadores. No Paraná, por exemplo, os trabalhadores estão em greve pela data base, reajuste de seus vencimentos e também porque o Governo quer alterar a previdência, ou seja, o Governo quer cobrar a parte que é aumentar o desconto previdenciária e não dar garantias no seu processo de aposentadoria. Em Santa Catarina, o Governo do Estado quer retirar os direitos já conquistados há décadas, por exemplo, a regência de classe, não paga o reajuste do piso nacional na carreira, que é um reajuste garantido na Lei 11738/2008 e que é pago apenas no início de carreira, ele achatou a tabela salarial e paga de forma desigual os trabalhadores em educação.
– Pode sintetizar qual é a solução que permitirá que a categoria volte às aulas?
L.C.V. – A solução para que a categoria volte às aulas é o Governo anunciar algumas garantias sólidas para a categoria, relativas àquilo que ele colocou em sua proposta, por exemplo, que ele não incorpore a regência de classe no vencimento, fazer o reenquadramento na tabela salarial, que ele aplique o reajuste dos 13,01% conforme a Lei 11738, a anistia das faltas de 2012 até 2015, a revisão do Decreto 3593 sobre a questão das faltas injustificadas para a progressão e que faça a descompactação, ou seja, que valorize os trabalhadores com maior tempo de serviço e com maior formação, essa é a solução que permite que a categoria volte às aulas.
Por fim, o professor Luiz Carlos Vieira afirma a Desacato.info:
“A greve é um direito legítimo dos trabalhadores. Um direito daqueles que pagam seus impostos e que financiam todos os serviços públicos, portanto, a educação. É um direito da sociedade e principalmente um direito da classe trabalhadora e os trabalhadores precisam continuar com suas reivindicações, que vão se reverter numa educação de qualidade e que vai melhorar a luta e a autonomia dos cidadãos e cidadãs.”
Imagens: Sinte/SC