Por Martha Raquel.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública autorizou o uso da Força Nacional de Segurança Pública na Terra Indígena Yanomami, onde garimpeiros vêm realizando ataques e ameaças diárias a indígenas na região do Palimiu, em Roraima.
Segundo a publicação no Diário Oficial da União, o apoio da Força Nacional será destinado às “atividades e nos serviços imprescindíveis à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, em caráter episódico e planejado”.
Com três semanas de atraso, culminando em dezenas de ataques de invasores, a medida responde a decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou que o governo garantisse a segurança dos indígenas Yanomami e Munduruku. A portaria, assinada pelo ministro Anderson Torres, tem validade de 90 dias, prorrogáveis.
Rotina de ataques e violência:
Questionado sobre a demora de 21 dias para a autorização de atuação na proteção dos indígenas, o ministério da Justiça não se pronunciou.
Nem um dia de paz: ataques em série
O primeiro ataque aconteceu no dia 27 de abril de 2021, quando um grupo Yanomami interceptou cinco garimpeiros que subiam o rio em direção ao Korekorema, no Rio Uraricoera, em uma voadeira carregada de combustível para avião e helicóptero, apreendendo a carga de 990 litros de combustível.
No episódio, garimpeiros que desciam o rio em direção a Boa Vista, reagiram disparando tiros contra os indígenas. O episódio foi denunciado pela Hutukara Associação Yanomami em ofício enviado à Frente de Proteção Etnoambiental Yanomami (FUNAI), à Superintendência da Polícia Federal em Roraima (PF/RR) e ao Ministério Público Federal em Roraima (MPF/RR).
Duas semanas depois, em 10 de maio, os ataques voltaram a acontecer e se tornaram diários. Há 35 dias os indígenas não conseguem dormir e precisam se manter a postos para fugir dos atentados.
Duas crianças Yanomami, de um e cinco anos, morreram afogadas durante uma das investidas dos garimpeiros ilegal. Assustadas com os tiros, as crianças fugiram pela mata e acabaram caindo no rio, onde morreram afogadas.
Um cachorro também foi morto pelos garimpeiros ilegais como forma de ameaça aos indígenas. Os ataques são feitos com embarcações, armamento pesado e bombas de gás lacrimogêneo.
No Brasil, a venda das bombas de gás lacrimogêneo é de controle do Exército Brasileiro e somente as Forças Armadas e de segurança pública (Polícia Militar, Civil e Federal) podem usar gás.
Questionado sobre como os garimpeiros ilegais conseguem ter acesso às bombas de gás lacrimogêneo, o Exército Brasileiro não respondeu até o fechamento desta publicação.
Oitavo pedido formal de socorro
Desde que os atentados começaram, a Hutukara já enviou oito ofícios e divulgou duas notas públicas denunciando a situação vivida na região e pedindo que as autoridades competentes garantam a segurança dos indígenas.
Na noite do último domingo (13), um novo atentado aconteceu na Comunidade do Palimiu. Três dias antes, outra comunidade, a Comunidade Maikohipi, também sofreu ataques dos garimpeiros.
Um novo pedido de socorro foi enviado na tarde desta segunda-feira (14) à FUNAI, à PF/RR, ao MPF/RR e à 1ª Brigada de Infantaria da Selva do Exército (1ª BIS).
“Um grupo de garimpeiros distribuídos em três barcos atracaram na comunidade e iniciaram um tiroteio contra a comunidade. Diante do novo ataque, os Yanomami se esconderam no mato, e então os garimpeiros seguiram viagem rio acima, em direção ao garimpo do Tatuzão”, denuncia a associação.
O documento assinado por Dario Kopenawa Yanomami, vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami, diz que “a situação de insegurança persiste sem uma presença permanente do poder público para a contenção da violência e da perpetuação de ilícitos relacionados à atividade ilegal em terras indígenas”.
O ofício também denuncia que os indígenas seguem sem equipe de saúde na comunidade e que, portanto, estão sem a possibilidade de pronto atendimento médico no caso de uma emergência.
Dario Kopenawa também viajou de Roraima para Brasília para denunciar impactos do garimpo.
A Funai disse em nota enviada ao Brasil de Fato que mantém agentes no território fazendo a segurança permanente dos indígenas, informação que é desmentida pelos moradores do local.
“A Fundação presta apoio às forças de segurança no local e mantém diálogo permanente com a comunidade. Cumpre ressaltar que o órgão vem mantendo equipes de forma ininterrupta dentro da Terra Indígena, por meio de suas Bases de Proteção Etnoambiental (BAPEs)”, diz trecho do documento.
Segundo a nota da Funai, a “A fundação conta com duas bases localizadas em pontos estratégicos da Terra Indígena Yanomami, que promovem ações contínuas e permanentes de vigilância, fiscalização e monitoramento territorial, a fim de combater ilícitos na região e impedir a entrada de não indígenas nas aldeias, sendo fundamentais para a gestão e proteção da área e para a segurança das comunidades locais”.
Agentes citados pelo órgão como responsáveis pela segurança da comunidade estão, na verdade, a 150 km do local ameaçado. A Terra Indígena Yanomami é a maior reserva indígena em extensão territorial do Brasil.