Por Gustavo Marinho.
Publicado hoje (17), Dia Internacional da Luta Camponesa, o Caderno de Conflitos do Campo de 2019, organizado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), aponta o ano de 2019 como o ano com o maior número de conflitos no campo registrados nos últimos cinco anos. De acordo com a publicação, foram 1833 casos de conflitos no campo registrados em 2019, número que corresponde ao aumento de 23% no número de casos, comparado ao ano de 2018.
No que toca os conflitos pela terra, foram registrados 1254 casos ao longo do ano, desses, 1206 ocorrências envolveram algum tipo de violência e ameaças provocadas por grileiros e supostos proprietários. De acordo com a CPT, esse é o maior número registrado desde o ano de 1985.
O Caderno aponta ainda o crescimento no número de assassinatos, de tentativas de assassinato e de ameaças de morte contra quilombolas, indígenas e comunidades tradicionais em relação ao ano anterior. Somente no que diz respeito aos casos de ameaça de morte, o aumento representa 21% em 2019, totalizando 201 ameaças no campo.
Para Débora Nunes, da coordenação nacional do MST, olhar a luta pela terra no Brasil é se deparar com um processo de concentração e reconcentração de terras.
“A síntese da luta pela terra no Brasil é o aprofundamento da concentração e da extrema violência do agronegócio e do Estado contra os povos do campo, das águas e das florestas. A terra, assim como outros bens comuns da natureza, a água, as florestas, a fauna e flora, os minérios e a biodiversidade têm sido alvo de grandes disputas para serem apropriados e então transformados em dinheiro, lucro e negócio pelo capital.”
Nunes destaca o papel do Estado no processo de concentração de terra que sustentam os casos de violência e conflitos no campo, “o aporte do Estado, seja na garantia de recursos públicos, seja na flexibilização da legislação que permita a livre exploração e a criminalização de quem se opõe a esse projeto, são fatos importantes para entendermos o cenário de conflito, violência e concentração do campo brasileiro”.
Para ela, o aumento nos números de violência no campo possuem relação direta com as ações do governo Bolsonaro. “O governo Bolsonaro estimula cotidianamente a violência contra todos aqueles e aquelas que lutam pelos seus direitos e no que diz respeito à luta pela terra não é diferente. O presidente declarou guerra às famílias que se mobilizam contra a concentração de terras no país, com um discurso violento e odioso que dá carta branca aos ataques contra todos que lutam pela terra”.
2019 fica lembrado ainda como o ano que não foi criado nenhum assentamento e não teve nenhuma nova terra indígena demarcada. Mas foi o ano que bateu o recorde na liberação de agrotóxicos no Brasil pelo governo Bolsonaro.
“Temos vivenciado a destruição do que foi conquistado ao longo de muitos anos no Brasil, a flexibilização de compra de terras por estrangeiros, a privatização dos assentamentos, a negação do direito ao reconhecimento de territórios quilombolas e indígenas. Tudo isso significa uma série de retrocessos não só para o campo, mas para o conjunto do povo brasileiro”, explicou Débora.
Também, como registro recorde de todas as edições do Caderno de Conflitos da CPT, o ano de 2019 foi o ano que apresentou o maior número de mobilização envolvendo camponeses e camponesas. De acordo com o Caderno, foram registradas 1301 ao longo do ano, um aumento que simboliza 142% em relação ao ano de 2018.
Os números do Caderno apontam o envolvimento de 243.712 pessoas nas mobilizações realizadas em todo o ano, tendo o Nordeste como a região que apresentou o maior número de ações que envolvem a luta dos camponeses e camponesas.
“A necessidade de realizar a Reforma Agrária é cada dia mais presente, pois nos deparamos com uma serie de problemas que são decorrentes da forma como a estrutura fundiária foi constituindo e das consequências desastrosas desta”, ressalta Débora.
“O aumento no número de mobilizações é a resposta concreta dos trabalhadores e trabalhadoras aos ataques e descaso de Bolsonaro com o campo brasileiro. Devemos seguir mobilizados, em luta e fazendo nossa parte para pressionar o governo, denunciando e combatendo qualquer ação que violente aqueles e aquelas que vivem no campo”, conclui.
*Editado por Wesley Lima.