“Vivemos tempos conservadores e se assumir é um tipo de luta”

Por Yago Rodrigues Alvim.

“A gente fica mordido, não fica?
Dente, lábio, teu jeito de olhar
Me lembro do beijo em teu pescoço
Do meu toque grosso, com medo de te transpassar

Peguei até o que era mais normal de nós
E coube tudo na malinha de mão do meu coração

Deixa eu bagunçar você”
Liniker, “Zero”

“Liniker: ‘Sou negro, pobre e gay e tenho potência também’”, era o título de uma das matérias do El País, muitíssimo compartilhada na rede social Facebook, nos últimos meses. Não só a matéria, mas o feed de notícias, muitas vezes, também é enfeitado das canções dx artista de Araraquara, em São Paulo (o x vale, considerando uma posição político-ideológica quanto às questões de gênero alçadas também por Liniker). A blackmusic e soul se encontra facilmente nas batidas das três faixas do EP “Cru”, lançado em 2015. Os versos acima citados, os da canção “Zero”, sem dúvida, são dos mais bonitos escritos no último ano.

Liniker e os Caramelows — sua banda — se preparam para lançar “Remonta”, o primeiro álbum já intitulado, mas ainda sem data prevista. “Para botar o público para dançar e cantar juntos”, como diz de seu projeto musical, Liniker vem a Goiânia pelo Festival Bananada. Com duas apresentações, na quarta-feira e sábado, 11 e 14 de maio, o Bananda conta ainda com a apresentação de mais de 70 artistas, numa programação que tem como palco o Teatro Sesi e Centro Cultural Oscar Niemeyer (CCON) — locais em que Liniker se apresenta. Não dá para perder, não é mesmo? Confira a entrevista.

Primeiramente, e como de costume jornalístico, gostaria de saber um pouco de sua vida. Quando começou o contato com a música e como foi o início desta jornada, até mesmo com a banda Caramelows?

Eu comecei a escrever lá pelos 16 anos. Eram cartas de amor que eu não entregava. Tinha tudo muito internalizado e, entre 2014 e 2015, resolvi transformar isso em música; precisava mostrar isso de algum modo. Os Caramelows apareceram aí. Eu já os conhecia de antes e, então, os procurei com as minhas ideias e eles toparam. Nisso, decidimos gravar o “Cru”. Nós só tínhamos uma sala à disposição e fizemos o que deu. Com o EP pronto, liberamos as faixas sem muitos planos e, do nada, o número de gente ouvindo era cada vez maior. Acordei um dia e a gente já estava lá, bombando no Youtube.

Quais são suas influências? Qual livro tem lido? Que álbum tem ouvido?

Tenho como influência a Etta James, o Itamar Assumpção, a Nina Simone, o Tim Maia e acho que todos os álbuns do Clube do Balanço são influências. Ouço também bastante Tulipa Ruiz e Francisco, el Hombre.

Como percebe as questões de gênero e sexualidade, atualmente? Sua performance (vestimen­tas/figurino) toca nessas questões?

No dia a dia, eu me visto assim. Causa um estranhamento isto de uma artista negra, bicha, tocar vestindo roupas ditas femininas num corpo masculino. As pessoas não entendem muito, mas estão a fim de saber mais. A maioria é um pessoal que não tinha nenhuma referência nisso e acho importante poder reforçar este empoderamento que deve acontecer sim! Vivemos tempos conservadores, com muitos tipos de opressão ao nosso redor. Se assumir nesse sentido acaba sendo um tipo de luta também.

Por fim, como vê o atual cenário da música popular brasileira e a relação dos artistas independentes com às (já não tão novas assim) novas mídias? E o Bananada, animados?

Estamos numa fase muito boa, com muita diversidade de estilos, vozes, propostas, gente de tudo quanto é lado deste país fazendo música e fortalecendo a cena. E espalhados também. Quando a gente lançou os vídeos, vimos que o segundo lugar que mais ouvia a gente era a Polônia. Louco, né? A internet ajuda muito nisso. Você lança o seu trabalho e, uma hora ou outra, seu público aparece em algum lugar. Inclusive, estamos animados para tocar em Goiânia, ainda mais em um festival como o Bananada. Goiânia vai ser bapho!


Fonte: Jornal Opção

 

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